Fernando Haddad: prefeito de São Paulo diz que cidade ficaria ingovernável se tivesse de pagar as dívidas de uma única vez| Foto: Antônio Cruz/ABr

Dinheiro

Devedores e credores concordam que solução é financeira e não jurídica

Em lados opostos na disputa, gestores públicos e advogados de credores concordam em um único ponto: seja qual for a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o futuro dos precatórios, a solução para o calote não é jurídica, mas financeira.

"A solução não virá do tribunal. É uma questão financeira", afirma o advogado Flávio Brando, ex-presidente da Comissão de Precatórios da OAB. "A solução passa por sanear as finanças municipais. Reduzir renúncias fiscais que beneficiam grandes empresas, enxugar folha de pessoal, acabar com o efeito cascata dos salários. Mas isso só será feito sob pressão popular", diz o presidente da Confederação Nacional dos Municípios (CNM), Paulo Ziulkoski.

O presidente da CNM diz ainda que nenhuma prefeitura pode zerar o estoque de imediato: "Além do passivo, surgem novos precatórios a cada dia. Os municípios estão inviabilizados financeiramente." Mas é rebatido por Brando: "O discurso de que estado ou prefeitura vai quebrar é o mesmo que eu ouvia no passado quando diziam que a dívida externa do Brasil era impagável". Para o atual presidente da Comissão Nacional de Precatórios da OAB, Marco Antônio Innocenti, acabar com a dívida é questão de vontade política. "Temos consciência de que é inviável o pagamento imediato, mas consideramos cinco anos um prazo razoável", diz Innocenti.

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Prefeitura de Curitiba tem débito de R$ 132,5 milhões, diz estudo

Guilherme Voitch

A prefeitura de Curitiba não vive uma situação tão dramática quanto outras capitais em relação aos pagamento de precatórios. De acordo com estudo da Associação Transparência Municipal (ATM), publicado neste ano e feito a partir de consulta aos Tribunais de Justiça (TJs) estaduais, a capital paranaense deve R$ 132,5 milhões em precatórios – cerca de 2,6% da sua receita. Na média, as cidades brasileiras com população entre 1 milhão e 5 milhões de habitantes têm 5,8% do seu orçamento comprometido com esse tipo de dívida.

Procurada, a prefeitura de Curitiba informou que, para este ano, serão pagos R$ 49,6 milhões em precatórios. Desse total, R$ 13 milhões correspondem a 85 processos que tiveram seus valores parcelados. A prefeitura não havia informado até o fechamento desta edição a totalidade das dívidas do município.

Já o governo do Paraná deve cerca de R$ 4 bilhões em precatórios.

Paulo Ziulkoski:

Três anos depois de o Con­­­gresso aprovar novas regras para o pagamento de precatórios com a promessa de reduzir a dívida bilionária de estados e municípios, os débitos judiciais de governos estaduais e prefeituras não pararam de crescer e a lista de prefeituras devedoras já é maior do que em 2009. Naquele ano, 13 capitais deviam R$ 13,3 bilhões. No fim de 2012, o somatório estava em R$ 19,4 bilhões – um aumento de 46% – e o número de inadimplentes subiu para 15. Precatórios são títulos de dívidas governamentais já reconhecidas em definitivo pela Justiça. Podem ser por desapropriações, créditos tributários, indenizações e salários.

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O Conselho Nacional de Justiça estimou em R$ 94 bilhões a dívida de precatórios de estados e municípios em 2012 – 37% são das prefeituras, não só de capitais. A União não tem débitos atrasados.

Nas capitais, São Paulo, Salvador, Belo Horizonte, Cuiabá e Fortaleza têm as maiores dívidas. Somente a prefeitura paulistana é responsável por 91% do total dos precatórios municipais (R$ 17,7 bilhões). A prefeitura do Rio de Janeiro tem um dos menores débitos (R$ 25 milhões).

Volta ao debate

Os números, levantados nos Relatórios de Gestão Fiscal (balanços entregues pelas prefeituras ao Ministério da Fazenda), mostram o tamanho do problema. Enquanto a dívida de precatórios cresceu 46% desde 2009, a arrecadação subiu apenas 20%. Nos balanços de 2012, não havia registro de dívida em 11 capitais, mas não é garantia de que não exista. "Nem todos registram como deveriam as informações", diz o pesquisador José Roberto Afonso, do Instituto Brasileiro de Economia da FGV.

A questão dos precatórios voltou ao debate depois de uma decisão do STF em março. O Supremo declarou inconstitucional as regras de pagamento de precatórios aprovadas pelo Congresso em dezembro de 2009, que deu prazo de 15 anos para a dívida ser liquidada; fixou um porcentual do orçamento (de 1% a 2%) para esses pagamentos; e permitiu leilões para os governos pagarem precatórios com deságio.

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Segundo o STF, porém, precatórios precisam ser pagos agora conforme o artigo 100 da Constituição – num prazo de 18 meses após a sentença e em ordem cronológica. Depois de uma gritaria de prefeituras e estados, o ministro do STF Luiz Fux prometeu levar o caso novamente ao plenário para definir os termos do cumprimento da decisão.

Maior devedor de precatórios entre as prefeituras, o município de São Paulo pressiona para que o STF limite a 3% do orçamento os gastos com os títulos de dívidas judiciais – hoje, a cidade destina 2,5% (R$ 700 milhões) anuais para quitar os débito. Neste mês, o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, disse que a cidade ficaria "ingovernável" se tivesse que pagar de uma só vez a dívida. Há prefeituras que defendem que a decisão seja aplicada apenas para novos precatórios.