Comissão quer reabrir caso sobre bomba na OAB

A Comissão Estadual da Verdade do Rio quer reabrir a investigação sobre a explosão de uma carta-bomba na sede da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) ocorrida em 1980. O presidente do órgão, Wadih Damous, classificou o inquérito feito sobre o caso como "uma farsa".

"O inquérito, na nossa maneira de ver, foi uma farsa conduzida pelo SNI [Serviço Nacional de Informação] e o DOI-Codi [Destacamento de Operações de Informações do Centro de Operações de Defesa Interna]. É um dos episódios que simbolizam a impunidade daqueles crimes", afirmou Damous.

A carta-bomba matou a secretária da presidência da OAB, Lyda Monteiro, há exatos 33 anos. O episódio foi lembrado hoje em seminário na PUC-Rio. O inquérito à época apontou como responsável pelo caso Ronald Walters, mas ele acabou absolvido por falta de provas. A comissão avalia que ele foi usado como forma de ocultar a participação de agentes da repressão política insatisfeitos com o processo de reabertura em curso na década de 1980. "A investigação só seguiu uma linha, quando qualquer investigação deve considerar várias hipóteses. Havia um setor, abrigados no DOI-Codi e no SNI, que não queria a abertura política. Com certeza eles praticaram os atentados na OAB e no Riocentro", disse Damous.

A comissão ainda pretende levantar mais provas para apontar as falhas na investigação para pedir ao Ministério Público a abertura de um novo inquérito.

De acordo com depoimento do agente da Polícia Federal Luiz Antônio da Silva Dutra dado ao Ministério Público Federal há 14 anos, militares participaram e influíram na condução do inquérito, a fim de estabelecer como linha única de investigação o envolvimento de Walters.

Damous aponta ainda que há indícios de que o mesmo grupo participou dos atentados na OAB e no Riocentro, este em 1981.De acordo com ele, o retrato falado de um dos suspeitos da carta-bomba em 1980 assemelha-se ao rosto de Magno Cantarino Motta, conhecido como agente "Guarani", visto no Riocentro logo após a explosão.

O filho de Lyda, o advogado Luiz Felippe Monteiro Dias, afirma também que parentes da secretária viram o sargento Guilherme Rosário na sepultura da vítima do atentado à OAB poucos meses antes da explosão da bomba no Riocentro. "Não sei o que ele estava fazendo lá. Mas chamou nossa atenção", disse Dias. O filho da secretária atribuiu a fragilidade da investigação a uma "teia de concessões". Entre elas está, disse o advogado, um acordo entre partidos políticos e o governo.

"Partidos políticos fizeram acordos com o governo para deixar de lado o atentado e garantir as eleições de 1982", afirmou Dias.Membro da Comissão Nacional da Verdade, Rosa Cardozo afirmou que uma eventual reabertura do caso pode gerar punição judicial aos autores. Ela disse que o caso não está coberto pela Lei da Anistia, editada em 1979.

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O novo coordenador da Comissão Nacional da Verdade (CNV), o advogado e ex-ministro da Justiça José Carlos Dias, reconheceu nesta terça-feira (27) que é "muito difícil" para o grupo encerrar seus trabalhos até o ano que vem com as respostas sobre as principais violações dos direitos humanos na época da ditadura militar (1964-1985), como identificar os autores dos assassinatos e localizar os restos mortais dos desaparecidos políticos no período. Dias foi escolhido nesta segunda (26) pelos outros quatro conselheiros na CNV como o novo coordenador, cargo que vem sendo ocupado em forma de rodízio entre os conselheiros. A lei que criou a comissão, em novembro de 2011, diz que ela tem "a finalidade de examinar e esclarecer as graves violações de direitos humanos praticadas no período fixado".

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O prazo previsto para a CNV concluir seus trabalhos é maio de 2014, mas deverá ser dilatado para novembro do mesmo ano. Indagado sobre as chances de a CNV apontar, por exemplo, o destino das ossadas dos guerrilheiros do Araguaia e das dezenas de desaparecidos durante a ditadura, além de elucidar casos como o atentado no Riocentro, em 1981, o coordenador admitiu: "É muito difícil. Muito difícil porque se passaram 40 anos. Um número muito grande de agentes da repressão está morrendo. Ainda hoje nós falávamos de uma pessoa que estamos querendo ouvir e está com 90 anos. Isso tudo dificulta".

Dias afirmou, porém, que "muita coisa já foi levantada" por outros grupos de recuperação da história. "O trabalho que a comissão de mortos e desaparecidos realizou é extraordinário e se encontra num livro importantíssimo que é o nosso breviário. Todos os nossos trabalhos nós tomamos como referência esse livro. E o livro feito pelas famílias de mortos e desaparecidos. São dois volumes importantes. A Comissão de Anistia também realizou um trabalho extraordinário. Nós estamos trabalhando em cima disso, não estamos criando uma novidade."

Por outro lado, Dias afirmou que a CNV tem se empenhado em "desenvolver novos campos e estamos conseguindo novas conquistas". Uma das apostas da comissão é um banco de dados formado até aqui por cópias de 584,549 mil documentos produzidos no período e arquivados em diferentes órgãos do Estado, como o Arquivo Nacional de Brasília.

O trabalho é coordenado pela consultora da CNV e cientista política Glenda Mezarobba, em parceria com o professor do IME (Instituto de Matemática e Estatística) da USP (Universidade de São Paulo) Roberto Marcondes Cesar Junior.A esperança da CNV é que o sistema ajude a identificar, na própria massa de documentos que vêm sendo coletados desde o início da comissão, indícios sobre o paradeiro de desaparecidos e principais agentes envolvidos no crime.

José Carlos Dias afirmou que a CNV pretende ouvir nos próximos meses um total de 348 agentes da repressão ou pessoas que de alguma forma colaboraram com a repressão. Alguns deverão ser convidados, outros poderão ser convocados, e sua presença na CNV garantida com apoio de agentes da Polícia Federal. Os membros da CNV mantiveram reunião com a direção-geral da Polícia Federal para pedir apoio nesse sentido.

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Indagado sobre o grau de colaborações dos comandos das Forças (Exército, Marinha e Aeronáutica) na localização e identificação dos agentes militares da repressão, Dias afirmou que o apoio "varia" de caso a caso. "Às vezes sim, às vezes não. Nós estamos mantendo o diálogo. E esse diálogo alcança qual objetivo? Demonstrar que o golpe de 1964 não foi o golpe militar, mas civil e militar, e que portanto a responsabilidade pela ditadura não é só dos militares, mas também da sociedade, dos civis que sustentaram a luta para a derrubada do governo, da democracia. E aí houve participação sim dos civis, de empresários, de várias forças sociais, indiscutivelmente. Portanto o que queremos mostrar e sensibilizar é que os militares de hoje não podem ser responsabilizados por aquilo que foi feito pelos seus antecessores e portanto eles devem colaborar e eu acho que isso vai se conseguindo conquistar a crença de que é a hora de passar a história a limpo. E que portanto não cabe o espírito de corporação de defender aqueles que praticaram as violações dos direitos humanos daquela época", disse Dias.

Areportagem indagou quando os comandos das Forças colaboram e quando não colaboram, mas o coordenador desconversou: "Caso a caso, é difícil, eu não seria honesto de dizer que há uma colaboração total e eu também não seria honesto de dizer que não há colaboração. Está havendo o diálogo, estão colaborando em muitos casos para a elucidação de fatos e temos aqui assessores que estão mantendo esse tipo de trabalho, em contato com altas esferas militares".

O novo coordenador também comentou recentes rusgas entre membros da CNV. Ele disse que não há desavenças, mas "temperamentos diferentes".Sobre eventual revisão da Lei de Anistia, o que é defendido por parte dos conselheiros, Dias disse que é contrário, mas que a comissão tomará uma decisão única, "no momento oportuno". "Não temos que entrar nesse debate, nessa discussão. Temos, isso sim, que reescrever a história e dizer "olha, fatos ocorreram dessa forma'. Não temos que ter como bandeira revogação ou reinterpretação da lei da anistia. Não, é dar um basta para o que aconteceu, reescrever a história e daqui para frente podermos garantir que nós nunca mais teremos necessidade de anistia porque não teremos mais ditadura, é o que se espera."