Nem saúde, nem educação. Passada a eleição, os nomes mais esperados para compor os governos são os que cuidam do cofre. No plano federal, a indicação mais aguardada foi a do ministro da Fazenda, que será o economista Joaquim Levy. No Paraná, o governador Beto Richa (PSDB) anunciou na semana passada que o secretário da Fazenda a partir de 2015 será Mauro Ricardo Costa, também considerado um especialista em ajuste fiscal.
Costa chega com fama de controlador de gastos: foi secretário das Finanças da prefeitura de São Paulo de 2003 a 2004, na gestão de José Serra; secretário estadual da Fazenda de São Paulo de 2007 a 2010, quando Serra assumiu o governo; novamente secretário das Finanças da capital paulista de 2011 a 2012, na gestão de Gilberto Kassab; e secretário das Finanças de Salvador nos dois últimos anos, na gestão de Antônio Carlos Magalhães Neto (DEM).
Auditor fiscal e com 52 anos de idade, Costa também foi superintendente da Zona Franca de Manaus; presidente da Fundação Nacional de Saúde (Funasa), de 1999 a 2002; e presidente da Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa), de 2003 a 2004, no governo de Aécio Neves (PSDB). Chamado para colocar as contas do Paraná em ordem, ele adianta que as medidas para o aumento de arrecadação não ficarão limitadas ao "pacotão" de reajuste de impostos enviado por Beto Richa à Assembleia na semana passada. "Várias medidas serão adotadas [para cortar gastos]. Não serão apenas essas. Até porque essas não resolvem o problema", diz.
O aumento do ICMS sobre produtos gerou várias críticas na semana passada. Como será isso?
Estamos adequando a tributação ao restante do Brasil. O que existia aqui era algo inadequado em termos de sistema tributário, que é concentrar a arrecadação do ICMS em três setores. Em torno de 55% da arrecadação estava concentrada em energia, telecomunicações e combustíveis. Se houver problema em um setor, afeta a arrecadação e as atribuições do estado em saúde, educação e segurança pública. O modelo não foi replicado em outros estados porque é um modelo inadequado. Em São Paulo temos em torno de um terço da arrecadação nesses setores, um terço na indústria e um terço no comércio. Estamos mantendo os incentivos que já existiam ao setor industrial. Ninguém está mexendo na tributação das micro e pequenas empresas, que representam 80% das empresas instaladas no Paraná, e ninguém está mexendo nos produtos da cesta básica, que estão isentos desde 2005. Quem vai ser afetado são o médio e o grande empresário, de tal maneira que equilibre a tributação daqui com a de outras unidades da federação. Não estamos tributando a mais nem a menos. Estamos tributando da mesma forma.
A Gazeta do Povo publicou que o Paraná foi o estado com o maior aumento da receita corrente líquida nos últimos quatro anos. A situação é assim tão crítica?
Dá para fazer o ajuste. Mas essas primeiras medidas não se esgotam nessas primeiras medidas. Foram apenas encaminhadas nesse momento para atender ao princípio da anterioridade da noventena. Outras medidas serão adotadas tão logo eu assuma, no dia 1.º de janeiro, principalmente para redução de despesas, ajustes orçamentários e eventuais renegociações de dívidas. Várias medidas serão adotadas. Não serão apenas essas. Até porque essas não resolvem o problema.
Onde o estado errou?
Errou no momento em que gastou mais do que devia. Se você faz um orçamento acima das possibilidades de receita, você quebra o estado. E, se faz isso com frequência, agrava-se mais ainda a situação, o estado vai acumulando dívidas ano a ano.
Onde o estado pode cortar custos?
Pode gastar menos com ele próprio, no custeio da máquina, evitando aumentos salariais extraordinários. Tudo isso vai ampliando a receita e criando margens para investimentos. Se você segurar a despesa de pessoal, por exemplo, tem margem para, com o crescimento da receita, fazer mais investimentos. Ter R$ 50 bilhões de orçamento e ter R$ 1 bilhão para investimento é inadequado. Um estado como esse devia ter R$ 5 bilhões. Não faz [investimentos] porque gasta tudo com a máquina.
O governo não pode demitir servidores e vai haver uma pressão por reajustes. Esse corte significa não contratar mais?
Nesse primeiro momento, não dá para contratar. Primeiro porque está no limite prudencial. Hoje o estado gasta mais de 48% da receita com folha [de pagamento]. Está próximo do limite da Lei de Responsabilidade Fiscal, que é de 49%. Está perto do limite que inviabilizará qualquer operação de crédito [obtenção de empréstimos], qualquer transferência do Tesouro [Nacional]. Se cuidarmos desse indicador, com o incremento de receita e segurando um pouco esses aumentos, teremos a possibilidade de fazer investimentos.
Em quanto tempo isso será possível?
Eu acredito que 2015 será um ano de ajuste, tanto na receita quando na despesa, para os frutos serem colhidos a partir de 2016.
Não existe o risco de, ao se aumentar impostos, as pessoas consumirem menos e o estado arrecadar menos?
Existe, mas não nesse caso de passar a alíquota [do ICMS] de 12% para 18%. Até porque essa alíquota ocorre com maior frequência em todas os estados. Mas há casos extremos, em que inclusive estimula o contrabando e o descaminho. A bebida alcoólica, por exemplo: se tributar em 30% ou 40%. compensa o risco de trazer uma mercadoria por descaminho ou contrabando.
A substituição tributária foi muito criticada no estado. Ela é necessária?
Ela é necessária para evitar a sonegação. Como tem poucos produtores e muitos vendedores, você substitui o varejo ou pelo atacadista ou pela indústria, de tal maneira que já cobre o imposto antecipadamente, evitando-se a sonegação no varejo. É o setor que mais sonega no país.
O modelo brasileiro está perto de um esg otamento?
Temos necessidade de ajustar a questão tributária. A Constituição de 1988 permitiu que os estados legislassem sobre o ICMS, e hoje temos 27 legislações. A guerra fiscal fez com que se reduzisse a arrecadação de uma maneira geral. E por vezes você tem o ICMS negativo. Outras medidas na área de tributos federais também precisam ser adotadas. Precisamos de uma reforma tributária. O duro é fazer, porque cada um tem uma reforma na cabeça. Mas os governos têm também muitas fragilidades. É fácil quebrar um governo; o difícil é arrumar. Como você quebra um governo? Basta fazer um orçamento acima das suas possibilidades de gasto.
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