Se você fosse prefeito, o que faria? Nestas páginas, dez sugestões resumem as propostas recolhidas junto a centenas de curitibanos e de especialistas. Em comum, todos têm o desejo por uma cidade da qual se possa de fato participar
Por Rosana Félix e José Carlos Fernandes
04/10/2008 às 21:48
Dr. Fábio de bike- o arquiteto e urbanista Fábio Duarte, coordenador do mestrado de Gestão Urbana da PUCPR, é um símbolo da Curitiba descontente com a são-paulização da cidade. Faz pesquisas sobre poluição provocada por carros, gerou grupos de discussão universitária e mostra que é possível dar uma reviravolta na cidade: ele enfrenta o trânsito caótico do Prado Velho sobre duas rodas com mochila nas costas sem deixar de ser doutor. (Foto: Priscila Forone/Gazeta do Povo)
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Quem quer pão?- Seis a cinco. Esse é o placar dos bairros mais pobres de Curitiba versus os mais ricos. Em meia dúzia deles, a renda familiar média não chega a R$ 1 mil. Nos cinco top de linha, os rendimentos médios vão de R$ 6 mil a quase R$ 9 mil. Entre os que pouco têm, muitos recorrem aos pães que são distribuídos toda terça-feira na Igreja do Bom Jesus. São 13 mil pães para cerca de mil pessoas, distribuídos por 50 senhoras da Pia União de Santo Antônio.
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Bola murcha -As crianças e adolescentes do Bolsão Dr. Ulysses, área de habitação irregular no Pinheirinho, só têm a rua para jogar bola e brincar. Não há equipamentos de lazer na região. Para usar uma quadra, a criançada precisa andar pelo menos 20 quarteirões. A situação se repete em outros bairros: faltam espaços públicos e canchas. São 90 praças na cidade, 30 delas com estrutura para prática esportiva. Mas a maioria não consegue atrair o interesse da comunidade.
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Feira com Darolt- o doutor em Meio Ambiente Moacir Darolt, do Instituto Ambiental do Paraná (IAP), faz parte de uma corrente subterrânea em Curitiba a dos consumidores e incentivadores de produtos orgânicos. O grupo reúne cerca de 600 participantes e é pró-ativo: produz cartilhas e excursões às comunidades da RMC que praticam agricultura familiar. Podem ser poucos fazem parte da elite dos 0,3% da população que consome alimentos sem agrotóximo , mas são formadores de opinião. A turma de Darolt tem aumentado a cultura alimentar na capital.
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Pelas mãos de Sueli- Sueli Maria Borges tem 57 anos, é professora aposentada e faz trabalho de escuta na Casa do Servo Sofredor, bairro do Pinheirinho, e na Chácara dos Meninos de 4 Pinheiros, em Mandirituba. Por longas horas, ela senta para ouvir histórias dos dependentes químicos. A terapia, de efeito comprovado, é um serviço voluntário. Curitiba, contudo, ainda deve atenção às casas de recuperação mantidas por igrejas e ONGs. A Casa do Servo uma referência no assunto jamais foi visitada por um secretário de Saúde.
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A casa de Daniel- No mês de julho, Daniel Dias Mota, de 21 anos, a mulher e a filha, saíram de um vale miserável na Vila Terra Santa, no Tatuquara, para um conjunto habitacional vizinho, o Laguna. O jovem faz parte do grupo de 25 mil curitibanos beneficiados pelo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Desafio de agora em diante é o acompanhamento das famílias reassentadas. E não se render ao efeito cosmético do projeto: a cidade tem outros 175 mil sem-teto na fila de espera.
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Na beira do rio- Levantamento da Cohab do ano passado mostra que 13 mil famílias vivem às margens de rios em Curitiba. Essa gente toda convive com a sujeira: os dejetos de pelo menos 37 mil residências são jogados diretamente nos rios da cidade. O índice de atendimento da rede de esgoto da Sanepar na cidade é de 88,62%. Os moradores do Jardim Santos Andrade, com suas casas do ladinho do Rio Barigüi, sabem dos problemas que isso pode causar. As crianças evitam o contato com a água do rio e fogem dos grandes ratos que circulam por ali, que podem transmitir doenças.
Nos últimos quatro meses, a reportagem da Gazeta do Povo circulou por Curitiba e por alguns pontos da região metropolitana para saber se a população estava satisfeita com a cidade em que vive. O objetivo era bolar diagnósticos, que servissem de debate para o período eleitoral. Para tanto, foi preciso circular cerca de 500 quilômetros, quase que unicamente dentro da capital.
O resultado da expedição Curitiba adentro é que de cada viagem se voltava para a redação não só com pilhas de depoimentos, de idéias e de dados a checar, mas também com propostas. A população não só quer participar como tem o que dizer.
O mesmo se diga das fontes especializadas. A reportagem registrou 96 entrevistas com autoridades em assuntos tão diversos quanto alimentação e transporte coletivo. Raro um que não aproveitasse a deixa para mandar um recado aos gestores públicos.
O resultado dessas duas escutas a dos populares e das autoridades no assunto rendeu as dez propostas apresentadas nesta reportagem. Nenhuma delas é extraordinária. São simples, factíveis, urgentes como o buraco da rua.
É o caso do aumento de programas culturais, de lazer e de emprego para adolescentes com mais de 14 anos, quase sempre órfãos da rede de proteção. É o caso também das casas especializadas em atendimento a dependentes químicos, condenadas à invisibilidade numa cidade que ainda lida muito mal com o problema da drogadição.
Entre idas e vindas a lugares tão diferentes quanto o Jardim Social e a Vila Icaraí a mais pobre e violenta do Bolsão Audi-União a reportagem procurou ainda um outro elemento: exemplos positivos. Sem eles, diagnósticos e propostas corriam o risco de se tornar mulas-mancas.
Pois exemplos não faltaram. No Batel, o engenheiro Paulo Nascimento criou um conselho de moradores, rompendo com o silêncio dos habitantes de zonas nobres. Na Terra Santa, a líder comunitária Rosa Siqueira criou uma espécie de cooperativa de mulheres pintoras de casas populares.
Quando a série Retratos de Curitiba já estava chegando ao fim, soube-se que o supergraduado arquiteto Fábio Duarte, da PUCPR enfrenta o trânsito de Curitiba de bicicleta. Verdade seja dita: Fábio é uma raridade. Difícil encontrar as classes médias nos ônibus e nas ruas, empenhando seu quinhão para melhorar a cidade. Particularmente no trânsito com folga o tema mais explosivo da campanha municipal de 2008.
Tomara em 2012, o arquiteto não esteja sozinho nas ruas. É isso ou 1,5 milhão de carros.
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