
Embora não haja consenso sobre como o Brasil vai amanhecer neste domingo, após os atos contra o governo marcados para vários estados neste domingo, uma coisa é certa: as respostas que a presidente Dilma Rousseff dará às ruas terão que ser mais rápidas e efetivas. Isso, dizem analistas, por conta das crises política e econômica, que se agravaram em comparação a março, quando Dilma foi alvo de protestos em todo o país.
Se nos últimos dias o governo vem tentando, no campo político, driblar os impactos da atuação do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB) — que não deve ser o alvo preferencial dos líderes do protesto de hoje —, agora o Planalto terá que apresentar uma definição mais clara, principalmente, sobre a condução da economia.
— Se o governo tomar atitudes desastradas, como fez na manifestação de março, e mostrar distanciamento da realidade, os movimentos tendem a se radicalizar ainda mais, e isso pode piorar a crise — diz Roberto Romano, professor de Ética e Filosofia da Unicamp, para quem o governo vai precisar agir com prudência; caso contrário, avalia, qualquer esforço poderá ir por água abaixo.
O professor da Fundação Instituto de Pesquisas Contábeis, Atuariais e Financeiras Silvio Paixão acredita que não há risco de os protestos provocarem instabilidade institucional. Para ele, porém, uma grande mobilização poderá fazer o governo mudar sua postura e alterar a política econômica, uma das principais reivindicações que deverão pautar os atos de hoje.
— Não estou vendo alguma coisa que possa abalar a República. E não vejo, a curto prazo, algo que possa mudar a perspectiva de investidores internacionais sobre a situação brasileira. Hoje, o que o Brasil precisa é de equilíbrio nas contas públicas. E, dependendo do que acontecer neste domingo, o governo terá de mudar sua postura política de enfrentamento de questões como essa — afirma Paixão.
Há quem tenha visão mais pessimista e aposte que os protestos vão piorar a imagem do Brasil no exterior, seja qual for a resposta de Dilma.
— Não sei se a classe política vai ouvir a voz das ruas, porque ela é surda, mas a classe econômica já ouviu. E, provavelmente, uma das consequências das manifestações será agências de risco rebaixarem ainda mais a nota do Brasil — diz o cientista político da Universidade de Brasília (UnB) David Flescher.
Protestos têm racha nos movimentos da base
O ato de hoje tem ainda um ingrediente que pode prejudicar o plano da presidente Dilma de mostrar unidade em torno de seu governo. Os protestos escancaram um racha nos movimentos de sua base. A Força Sindical, por exemplo, não apoia oficialmente a mobilização. Enquanto o presidente da entidade, Miguel Torres, não participará, a ala liderada pelo deputado Paulo Pereira da Silva, o Paulinho da Força (SD), deve comparecer em peso.
O próprio PT não consegue ser hegemônico na hora de pensar em ir para as ruas. Na semana passada, o partido rachou enquanto organizava um protesto para o dia 20 em reação ao ato de hoje. Não assinou o manifesto argumentando que não seria a favor de críticas à economia, assunto que vai ser levado para o ato do próximo dia 20 por entidades historicamente ligadas ao PT e “contra o golpe”.
Guilherme Boulos, um dos coordenadores nacionais do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), que participará do protesto do dia 20, admite a insatisfação com o governo e diz que a mobilização de hoje está sendo capitaneada por setores que são contra o governo do PT.
— A insatisfação é real. Agora, entre ter insatisfação e querer fazer movimento para derrubar o governo, há um passo largo. Entre ter insatisfação com o governo e embarcar na onda do PSDB, do Michel Temer ou do Eduardo Cunha, há outro passo ainda mais largo. O povo da periferia está vacinado — diz Boulos.
Segundo especialistas, o governo enfrenta o protesto de hoje menos frágil. Quanto a eventual processo de impeachment de Dilma, por exemplo, na última quinta-feira o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) suspendeu uma das ações movidas pelo PSDB para cassar o mandato de Dilma, por suspeita de irregularidade nas contas da campanha de 2014.
Às vésperas, governo faz pauta positiva
A adesão nas redes sociais ao protesto de hoje tem se mostrado menor. Os perfis dos movimentos Brasil Livre, Vem Pra Rua e Revoltados Online — organizadores dos atos — registravam na última sexta-feira cerca de 250 cidades mobilizadas. Em março, às vésperas de protesto naquele mês, eram mais de 400.
A adoção na última semana de uma pauta positiva para o governo, com a chamada Agenda Brasil, também pode funcionar como um alívio no momento em que o Planalto sofre uma nova pressão popular.
Para o cientista político da PUC-Rio Ricardo Ismael, a estratégia de Dilma pode servir a curto prazo, mas não como resposta definitiva na atual circunstância:
— O governo vai continuar trabalhando para que o TCU não rejeite suas contas e apostando nessa mobilização com o Renan Calheiros e com o PMDB. Além disso, vai tentar passar algumas medidas da Agenda Brasil no Congresso e aprovar outras que ajudem a aumentar a arrecadação. É uma jogada a curto prazo, para respirar, mas não vai resolver o problema. É preciso também construir novas bases no governo para acabar com esse quadro de tensão e incertezas.
O minério brasileiro que atraiu investimentos dos chineses e de Elon Musk
Desmonte da Lava Jato no STF favorece anulação de denúncia contra Bolsonaro
Fugiu da aula? Ao contrário do que disse Moraes, Brasil não foi colônia até 1822
Sem tempo e sem popularidade, governo Lula foca em ações visando as eleições de 2026
Deixe sua opinião