A mais acirrada eleição presidencial desde 1989 chega ao fim neste domingo tendo a candidata do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e do sentimento dominante no país de continuidade, favorita para vencer o pleito.

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Lula, personagem central da eleição, não teve sucesso em fazer com que Dilma Rousseff (PT) fosse eleita no primeiro turno, algo que nem ele conseguiu em suas duas vitórias, mas depois do baque inicial pela necessidade do "returno", a candidatura governista ganhou fôlego, recuperou energia e deve confirmar nas urnas o resultado que a maioria dos analistas vinha prevendo há meses.

No sábado Datafolha, Ibope, Vox Populi e Sensus divulgaram pesquisas. A menor vantagem de Dilma sobre Serra é de 10 pontos percentuais.

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As pesquisas, aliás, foram um capítulo à parte nesta eleição. Discussões metodológicas, alfinetadas entre diretores dos institutos, ataques dos tucanos fizeram parte de um cenário no qual as sondagens apontaram durante a maior parte do tempo o favoritismo de Dilma, para ver na última hora a eleição ir para o segundo turno. Tentam recuperar domingo parte do prestígio perdido com esses embates.

E se Dilma chegou a estar "virtualmente" eleita algumas semanas antes do primeiro turno e teve que amargar uma forte decepção no último dia 3, José Serra (PSDB) chegou a acreditar que poderia virar o jogo quando, na primeira semana de campanha do segundo turno, viu diminuir a vantagem da petista nas sondagens eleitorais e agora conta com um milagre.

Milagre que, se houver neste feriadão prolongado, não deveria surpreender de todo.

Afinal, a campanha começou discutindo a necessidade de um ajuste fiscal no governo, passou pelas denúncias de quebra de sigilos fiscais de pessoas ligadas a Serra, foi para o escândalo que levou à queda de Erenice Guerra da Casa Civil, pulou, com gosto, para o debate sobre o aborto e terminou com a "interferência", como definiu um jornal, do papa Bento 16.

A questão religiosa penetrou no subterrâneo da campanha presidencial nos dias que antecederam o primeiro turno, por meio da Internet e de sermões de bispos católicos e pastores evangélicos contra o PT e Dilma, devido a declarações anteriores dela a favor da descriminalização do aborto.

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E veio à tona logo após o dia 3, quando finalmente ela reagiu para recuperar votos perdidos, movimento que a levou a assinar um documento comprometendo-se a não propor alterações na legislação do aborto e outros temas relacionados à família e à adoração religiosa se for eleita.

Se nos primeiros tempos do PT, setores da Igreja Católica apoiavam seus candidatos, esta eleição viu as alas mais conservadoras no Brasil falando mais alto, o que acabou culminando no discurso do papa esta semana a bispos do Nordeste.

Bento 16 não citou partidos ou candidatos, mas disse que "quando os projetos políticos contemplam, aberta ou veladamente, a descriminalização do aborto ou da eutanásia, o ideal democrático... é atraiçoado." No mesmo dia, em Minas, Serra aparecia beijando uma imagem de Nossa Senhora da Abadia.

"O Brasil é um país maciçamente religioso e grande parte da intelectualidade e dos políticos de esquerda não estava disposta a levar isso em conta", explicou o filósofo Luiz Felipe Pondé à Reuters.

Mas apesar do peso que a questão religiosa teve na campanha, pesquisas indicaram que ela influenciou apenas um pequeno número de eleitores.

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ONDA VERDE

Beneficiada pela polêmica religiosa e pelo descontentamento com mais um escândalo de corrupção, a candidata do PV à Presidência, Marina Silva, conseguiu quase 20 milhões de votos no dia 3, acabou forçando a realização do segundo turno e se tornou a grande noiva a ser conquistada na nova etapa da corrida presidencial.

Nas manchetes dos jornais quase todos os primeiros dias da campanha do segundo turno, a difícil decisão de anunciar neutralidade e conduzir seu partido na mesma direção impediu um papel de destaque duradouro na disputa.

Coerente com seu discurso eleitoral, de críticas e elogios balanceados aos governo Fernando Henrique Cardoso e Lula, de quem foi ministra do Meio Ambiente, Marina preferiu pensar a longo prazo, de olho em 2014, a ter alguma vantagem política, ou de cargos, agora.

De resto, como dizem sempre os analistas, o destinatário dos votos não é dono deles. Não havia nenhuma garantia que se tivesse optado por PT ou PSDB, Marina conseguiria uma alta taxa de transferência.

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Nem mesmo Lula conseguiu plenamente isso com Dilma, já que suas taxas de popularidade e aprovação de governo, em torno de 80 por cento, estão muito acima dos votos que a petista obterá nas urnas.

MUITA DISCUSSÃO, POUCO CONTEÚDO

Na era da informação, a Internet não se restringiu a fazer barulho apenas sobre aborto e religião. Foram incontáveis os emails que bombardeavam as caixas de entrada a favor ou contra deste ou daquele candidato.

Mas a esmagadora maioria, apócrifos sem ligação direta, ou aparente, com as campanhas oficiais, seguiram mais pela baixaria pura ou teorias conspiratórias absurdas em lugar de ser instrumentos para uma discussão programática. Mesmo caminho de blogs e sites de pouca, ou nenhuma, credibilidade.

Teve de tudo, inclusive imagens do que seria uma certidão de nascimento da mineira Dilma da Bulgária, terra natal de seu pai, para mostrar que ela não seria brasileira.

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Mas essa não foi a única novidade. Parafraseando o presidente Lula, nunca antes na história deste país uma campanha teve tantos debates entre os presidenciáveis na TV. Foram dez.

E aqueles que esperavam que a maior experiência de Serra nesse campo --já que disputara inúmeras eleições para o Congresso, prefeitura, governo estadual e mesmo Presidência-- poderia ser determinante na disputa, as regras extremamente engessadas impediram que um candidato vencesse claramente qualquer um dos confrontos.

Muita comunicação na Internet e muitos debates não significaram, porém, muita discussão de propostas ou, mais ainda, um debate sério sobre projetos estratégicos para o país. Se Dilma falou insistentemente, por exemplo, nas 6.000 creches que pretende construir, Serra prometeu um salário mínimo de 600 reais no ano que vem.

Nem mesmo programas de governo os dois candidatos que chegam às urnas agora tiveram a preocupação de apresentar com a devida antecedência.

Dilma divulgou um texto genérico com 13 "compromissos programáticos" na última segunda-feira. E Serra apresentou seus programa consolidado apenas na sexta-feira, ainda que com o mérito de ser muito mais detalhado que o da petista.

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Por isso tudo, não serão poucas as perguntas e dúvidas que o vencedor deste domingo terá de esclarecer nos próximos meses. Afinal, se falar e prometer qualquer coisa é suficiente para ser eleito, a tarefa de governar o país é um pouco mais complexa.