Descentralização
A desigualdade regional do Paraná é uma grande ferida aberta que precisa receber um tratamento intensivo do próximo governador. A riqueza está concentrada na região metropolitana de Curitiba, que em 2007 foi responsável por 45,8% do Produto Interno Bruto (PIB) do Paraná, apesar de abrigar apenas 34,5% da população. Das outras nove mesorregiões do estado, seis têm participação inferior a 5% no PIB. Esse desnível interno é o pior da Região Sul.
Em Santa Catarina, das seis mesorregiões, apenas uma tem desempenho tão negativo; no Rio Grande do Sul, apesar da polarização em Porto Alegre, a maioria dos agrupamentos tem participação razoável no PIB estadual. Os dados são do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) (veja detalhes no infográfico).
Até o início da década de 70, a distribuição de renda no Paraná era bem mais equilibrada. Mas a crise da cafeicultura, a consolidação da Cidade Industrial de Curitiba e a instalação da Refinaria Getúlio Vargas na região metropolitana de Curitiba contribuíram para surgir a ferida da desigualdade. Há 40 anos, apenas duas mesorregiões tinham menos que 5% do PIB estadual Centro Ocidental e Sudoeste. Em 1980, mais duas mesorregiões se juntaram a esse grupo (Centro Sul e Sudeste) e, em 1996, outras duas (Noroeste e Norte Pioneiro). Atualmente, além da região metropolitana de Curitiba que engloba também o litoral , têm participação mais significativa no PIB apenas as mesorregiões Centro Oriental (Campos Gerais), Oeste (Cascavel-Toledo-Foz do Iguaçu) e Norte Central (Londrina-Maringá).
O Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), utilizando dados do Censo de 2000, também mostra muitas cicatrizes na população paranaense. "Um grande número de municípios apareceu com desempenho abaixo da média nacional", destaca o professor Fabio Doria Scatolin, do Departamento de Economia da Universidade Federal do Paraná (UFPR). Outros dados mais recentes comprovam esse baixo desempenho. Segundo o Índice Firjan de Desenvolvimento Municipal (IFDM), da Federação das Indústrias do Rio de Janeiro, 346 municípios do Paraná (86,7% do total) ficaram abaixo da média brasileira em 2006. O levantamento leva em conta a situação de emprego e renda, educação e saúde da população.
Os especialistas alertam que as desigualdades vão continuar existindo, pois a competitividade das empresas é proporcionada pela concentração espacial, que permite ganhos de escala. "Mas o poder público precisa agir, para evitar maiores fluxos populacionais em direção aos grandes centros, que acabam inchando e criando bolsões de pobreza e violência", alerta o economista Jandir Ferrera de Lima, professor e pesquisador de Desenvolvimento Regional na Unioeste.
No papel, os principais candidatos ao Palácio Iguaçu, Beto Richa (PSDB) e Osmar Dias (PDT), mostram uma grande preocupação com as desigualdades regionais. O tucano propõe a consolidação das regiões de desenvolvimento, consolidando "um contínuo esforço de sinergia entre governo do estado, prefeituras, empresas e o terceiro setor". O pedetista destacou as discrepâncias sociais e econômicas como um dos principais desafios do Paraná e baseou seu plano de governo no combate a esse problema. Ambos elencam ações em várias áreas saúde, educação, segurança, geração de emprego e renda. Veja, em seguida, algumas medidas prioritárias, de acordo com especialistas ouvidos pela Gazeta do Povo:
Por uma nova política de desenvolvimento
"Urge a criação de um plano de Estado, e não apenas de governo, para diminuir as disparidades econômicas e sociais das regiões paranaenses", afirma o economista Jandir Ferrera de Lima, da Unioeste. Segundo ele, é fundamental que o próximo governador tenha vontade política de implementar algumas mudanças, o que não ocorreu durante os últimos três governos estaduais. "Até os anos 90, o Badep [Banco de Desenvolvimento do Paraná] teve um papel fundamental. Depois disso foi criado o Anel de Integração, com a ideia de fortalecer o interior. Mas só as grandes cidades foram beneficiadas", observa.
Lima sugere a adoção de um modelo que vem funcionando no Rio Grande do Sul, por meio dos conselhos regionais de desenvolvimento. "Eles têm uma grande participação da sociedade civil organizada, assim como das forças políticas de cada região, que fazem a interlocução com o governo estadual. No Paraná, as instâncias que conversam mais com o governador são as associações de municípios, as quais não têm representatividade tão ampla. É preciso a participação de lideranças empresariais e da população nas negociações", explica.
O pesquisador da Unioeste também defende que o Fundo de Desenvolvimento Urbano (FDU) mude de foco. "O fundo faz muita política de urbanização e pouca coisa no desenvolvimento da região. É preciso vontade política para mudar isso, criando um novo marco regulatório de investimento no Paraná", diz Lima. O economista Gilmar Mendes Lourenço, coordenador do curso de Economia da FAE, faz coro e diz que falta uma política pública de desenvolvimento regional. "Ela precisa ser feita com base no diagnóstico socioeconômico do estado, o qual deve ser discutido com os agentes de cada região."
Alimentar as vocações regionais
O apoio aos Arranjos Produtivos Locais (APLs) também é apontado pelos especialistas como um mecanismo viável para o Executivo estadual reduzir as disparidades regionais. Esses agrupamentos normalmente nascem da iniciativa de um empreendedor, que difunde uma ideia ou técnica para uma comunidade, que acaba a desenvolvendo.
O Paraná tem quase 20 APLs formalmente reconhecidos, e aproximadamente outros 80 com potencial. "Até agora, as políticas públicas agiram para reforçar regiões que já tinham grande desenvolvimento. É válido, mas o poder público poderia buscar financiamentos em organismos internacionais, como o Banco Mundial e o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) para apoiar os APLs embrionários", avalia Fabio Doria Scatolin, da UFPR.
Inovar e pesquisar
Segundo os especialistas, os arranjos são um instrumento muito eficaz para difundir a inovação tecnológica, que é o pano de fundo do desenvolvimento econômico. "Os APLs são um elemento interessante para catalisar o potencial da região na direção de alguma vantagem competitiva ou comparativa, de alguma atividade econômica que melhore a renda da comunidade", diz Fabio Doria Scatolin.
De acordo com Gilmar Lourenço, da FAE, o governo estadual tem de incentivar as universidades estaduais a fazerem pesquisas e parcerias com a iniciativa privada no interior. "Temos um grande potencial de geração de conhecimento e tecnologia. As instituições estaduais não podem ser vistas como unidades de gasto de recurso, mas sim como polos de desenvolvimento."
Geração de renda no campo
"O Executivo precisa incentivar atividades com maior potencial de interiorização e que geram oportunidades de emprego, como a pequena produção agrícola diversificada", sugere Gilmar Lourenço. Ele ressalta que o mais importante é agregar valor ao produto ainda na propriedade, ou pelo menos no interior do estado, e uma atividade a ser explorada seria a fruticultura.
O agronegócio também precisa de espaço. "A vantagem é que no Paraná o setor é dominado pelas cooperativas, que atuam de forma espalhada, o que facilita a identificação de oportunidades. Elas dominam a oferta de matéria- prima agroindustrial e já tem uma capacidade expressiva de industrializar. O governo pode explorar essa estrutura, dando incentivos para a iniciativa privada, para intensificar a interiorização do estado", acrescenta o professor da FAE. Ele também ressalta que uma das maneiras mais fáceis de gerar emprego é investir em obras de infraestrutura, que também são fundamentais para possibilitar o crescimento do Paraná.
A semente da educação
A qualidade do ensino é fundamental para o crescimento econômico. Isso foi comprovado pela professora Augusta Pelinski, do Departamento de Economia da UEPG, em sua tese de doutorado, apresentada no ano passado. Ela analisou a qualidade do capital humano nas microrregiões paranaenses entre 1999 e 2006, relacionando-o a com o PIB per capita de cada localidade. "O governador precisa se ater à qualidade na formação das pessoas. Não se trata de quantidade de anos passados na escola, mas de indicadores qualitativos, como a remuneração dos professores e o número de alunos em sala de aula", observa.
A professora e pesquisadora Rosângela Pontili, da Faculdade Estadual de Ciências e Letras de Campo Mourão (Fecilcam), também analisou a relação entre educação e renda nas mesorregiões do Paraná. "Aquelas com pior renda também são as que têm o menor nível de escolaridade média. O comprometimento com a redução das disparidades regionais deve ocorrer em conjunto com políticas públicas que visem a melhoria das condições educacionais da população." Para ela, é preciso garantir educação pública e de qualidade em todos os níveis.
O próximo passo da transferência de renda
Na oposição ou na situação, virou mantra dos candidatos a afirmação de que os benefícios sociais serão mantidos e ampliados. Segundo os professores ouvidos pela Gazeta do Povo, isso é mesmo necessário, mas o mais importante é ir além: dar condições para que a população não necessite mais da ajuda pública. Além disso, os programas sociais ajudam a reduzir a desigualdade de renda, e não a regional.
No Paraná, tanto Beto Richa como Osmar Dias, os dois principais candidatos ao governo, se comprometeram em manter e ampliar programas que tiveram destaque durante a gestão de Roberto Requião (PMDB): Luz Fraterna, Tarifa Social da Água, Leite das Crianças e regime tributário com isenção para micro e pequenas empresas. O Bolsa Família, do governo federal, também é promessa tanto de Dilma Rousseff (PT) como de José Serra (PSDB).
Rosângela Pontili, da Fecilcam, diz que as ações de transferência de renda são muito importantes. "Em pesquisa realizada junto a pessoas beneficiadas pelo programa bolsa família, do município de Corumbataí do Sul [Centro Ocidental], pude comprovar que a renda obtida a partir deste programa tem impacto positivo sobre o consumo das famílias. Este aumento de consumo traz uma nova dinâmica ao comércio local e pode conduzir a um ciclo virtuoso de crescimento econômico. Mas ela ressalta que os programas de transferência do governo levam em conta a situação de pobreza dos beneficiados, independentemente da região em que estes residem.
"A transferência de renda ajuda muito na manutenção da família e na segurança alimentar. Mas é preciso começar a discutir: em qual momento essas pessoas vão deixar os programas sociais", avalia o professor da Unioeste, Jandir Ferrera de Lima.
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