Votar foi direito feminino adquirido em 1930, mas representatividade política ainda é baixa depois de oito décadas| Foto: Vanderlei Almeida/AFP

Eleição não garante prioridade de governo em agenda feminina

Para os especialistas ouvidos pela Gazeta do Povo, a chegada à Presidência de uma mulher não implicará, necessariamente, mais espaço das mulheres no governo, assim como não garantirá que temas historicamente ligados à população feminina terão prioridade na agenda pública. O fato em si também é relativizado.

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Eleitas e poderosas

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Linha do tempo

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O ano de 2010 será histórico para as mulheres. Além da eleição da primeira mulher presidente do país, a população feminina – e não só ela – também comemora os 80 anos da instituição do voto feminino, aprovado pelo Congresso em novembro de 1930. Naquele ano, elas ainda não puderam votar – o direito só foi exercido em 1933, nas eleições para a Assembleia Cons­tituinte – mas, para especialistas, a data tem forte peso simbólico. "Foi uma conquista importantíssima, de afirmação da cidadania da mulher. Há um salto de qualidade nesse sentido, já que a mulher nem era considerada uma cidadã de fato, e a partir daí, ela ganha esse status. Até então, predominava aquela mentalidade colonial, aquela moral dupla, de que o homem tudo podia, e a mulher, nada", analisa a cientista política Maria Lúcia Victor Barbosa, professora aposentada da Universidade Estadual de Londrina (UEL).

A conquista das brasileiras, no entanto, nada tem a ver com a ideia de que o direito ao voto foi uma benesse dada às mulheres pelo então presidente Getúlio Vargas, recém-chegado ao poder pela Revolução de 30. No Brasil, o movimento sufragista, surgido na Inglaterra em meados do século 19, tinha adeptas fervorosas, que se reuniam em comissões, faziam protestos em frente do Palácio do Catete, no Rio de Janeiro, e até participavam de congressos feministas no exterior. "Não gosto da ideia de que esse foi um direito concedido, outorgado. O movimento de mulheres no país seguiu uma lógica internacional, pressionou por conquistas que já estavam ocorrendo em outros países, como a Nova Zelândia, que instituiu o voto em 1893. Elas conquistaram esse direito", explica o cientista político Bianco Zalmora Garcia, professor de Ética e Política da UEL. "O próprio processo de urbanização influenciou o sufragismo brasileiro, assim como o modernismo, que possuía muitas mulheres progressistas em seus quadros".

Evolução

Ao longo das décadas, o direito, que não era total, foi sendo ampliado. Em 1934, foi assegurado pela Constituição Federal e, em 1946, tornou-se obrigatório. A outra face da participação política, no entanto – o direito a ser votada –, se desenrolou de forma tímida ao longo dos 80 anos seguintes. "Em termos históricos, e levando-se em conta a formação cultural do país, não demoramos muito para eleger uma mulher presidente. Há 80 anos, não éramos consideradas capazes nem de discernir, de eleger nossos representantes, e agora, estamos elegendo uma mulher. No entanto, uma coisa é poder votar, e a outra, muito diferente, é ser votada. Nisso, estamos muito aquém do ideal", afirma a senadora Gleisi Hoff­mann, primeira mulher a ser eleita para o cargo no Paraná.

Para Gleisi, o grande nó da participação política feminina está nos partidos políticos, onde a maior parte dos cargos de direção está nas mãos de homens. "Os partidos são machistas, conservadores, têm um DNA masculino, até mesmo o PT, que é mais avançado nessa área. Há 20 anos, éramos 30% da base, mas não chegávamos a 1% dos cargos de direção, o que fez com que tivéssemos de instituir cotas para as mulheres", recorda. A ex-deputada federal Dra. Clair, hoje no PV, primeira paranaense a ser eleita para a Câmara dos De­­putados (junto com Selma Schons, ambas pelo PT, em 2002), faz uma análise semelhante: "Certamente, temos de comemorar [o direito ao voto], mas a participação política da mulher, que é metade da população brasileira, precisa avançar. A discriminação é muito forte. Veja o exemplo da Câmara: nunca tivemos representatividade na Mesa Diretora".

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