O caminhoneiro Cristiano Scheffer se envolveu em um acidente causado por um carro de passeio: falta de sinalização e más condições da estrada são problemas comuns| Foto: Albari Rosa/ Gazeta do Povo

Industrialização ainda é caminho para desenvolvimento

O gaúcho David Natal Ambrósio, 65 anos, chegou a Chopinzinho em 1973 ao lado da mulher, Vilma, e com uma gaita debaixo do braço, com a qual até hoje toca músicas tradicionalistas do Rio Grande do Sul. Veio para ganhar a vida na agricultura, mas há 40 anos não imaginava que o leite seria sua principal fonte de renda. Segundo ele, cuidar do leite "era ocupação da mulher, que tirava um pouco apenas para o café".

Leia a matéria completa

CARREGANDO :)

Eram 22h45 quando o caminhoneiro Cristiano Scheffer, 29 anos, chegava às proximidades de Palmas, depois de sair de Clevelândia em direção a São Paulo pela PR-280 com 14 toneladas de compensado. O caminhão dele estava no meio de outros dois veículos de carga quando o motorista de um carro, que vinha no sentido contrário, perdeu o controle, bateu de raspão no primeiro caminhão do comboio e acertou em cheio a frente do Ford Cargo dirigido por Cristiano. O impacto foi tão forte que o eixo do caminhão quebrou, o pneu saiu da roda direita, o caminhão foi ao mato e o motorista do carro morreu na hora.

Foi o segundo acidente na vida do jovem caminhoneiro, o primeiro em serviço. "Pensei em tudo, passou tudo na cabeça. Eu fiquei com um pouco de medo, de trauma", contou dois dias depois do acidente, ao comentar que, agora, estava sem trabalhar e não tinha ideia de quando voltaria a dirigir. O patrão de Cristiano, Juliano Peruzzo, estimou em até R$ 20 mil por mês o prejuízo por perder o trabalho do caminhão. Mas os dois agradeciam por contar somente os prejuízos materiais – diferentemente da família do motorista do carro. "Eu só esfolei o joelho", diz Cristiano. "Ele escapou por milagre. Você precisa ver onde o caminhão entrou. Por sorte, ele não tombou", enfatiza Juliano.

Publicidade

Esse tipo de acidente virou rotina no noticiário das rádios e jornais da Região Sudoeste do estado. As três principais rodovias regionais – BR-373 (entre Pato Branco e a BR-277, em Guarapuava), PR-180 (entre Francisco Beltrão e a BR-277, em Cascavel) e a BR-280 (que corta todo o Sudoeste de Barracão a Palmas) – têm pistas estreitas, problemas de sinalização e faltam terceiras pistas em trechos de subida. Isso sem contar as péssimas condições do asfalto em alguns trechos. "Se tivesse mais uma faixa pode ser que o Juliano pudesse desviar do carro", acredita Cristiano. Como não há, a colisão entrou para as estatísticas da Polícia Rodoviária Estadual (PRE). Do início do ano até a metade do agosto, a PRE contabilizou 64 mortes e 774 feridos em 904 acidentes no Sudoeste do estado.

A estrutura rodoviária da região é hoje o principal empecilho para o desenvolvimento local, que teve uma das mais recentes ocupações regionais do Paraná, entre as décadas de 1940 e 1970 do século passado. Apesar disso, os municípios conseguiram um bom padrão de qualidade de vida para boa parte da população. O desenvolvimento foi baseado na agricultura, principalmente em pequenos agricultores – cerca de 97% das propriedades têm até 100 hectares.

Com esse perfil, a região é uma das principais bacias leiteiras do Paraná e uma das maiores produtoras de soja. Na safra 2009/2010, foram colhidas 1,5 milhão de toneladas de soja e 1,2 milhão de toneladas de milho – 11% e 19%, respectivamente, de toda a produção estadual desses grãos. É bastante quando se considera que o Sudoeste tem menos de 9% da área do estado e um relevo acidentado, o que dificulta a prática da agricultura mecanizada, como é o caso da soja.

Nos últimos anos a região conseguiu criar alternativas de agroindustrialização em alguns setores, mas ainda longe do ideal (veja na página seguinte), como no caso da própria produção leiteira. O município de Dois Vizinhos concentra parte do processamento dos produtos agrícolas produzidos ali. Há também polos comerciais e educacionais – Francisco Beltrão e Pato Branco. Outro destaque é a indústria têxtil em Ampére.

"De modo geral, nota-se relativo equilíbrio nessa mesorregião. A maioria dos municípios ocupa posições intermediárias no ranking estadual do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), ressaltando-se que, dos 23 municípios do Paraná com IDH acima da média estadual, seis encontram-se no Sudoeste, com destaque para Pato Branco, que ocupa a terceira posição", registra um estudo regional do Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social (Ipardes).

Publicidade

Isolamento

Apesar desse perfil, as condições das estradas acabam isolando o Sudoeste. O transporte é um fator complicador para o desenvolvimento da região. "Há má conservação, pistas estreitas e sem acostamento. Tem lugares que, se dois bitrens se cruzarem, é perigoso bater", afirma Luiz Carlos Peretti, coordenador das Associações Comerciais, Indus­triais e Agrícolas do Sudoeste do Paraná (Cacicopar).

A situação é tão complicada que em todas as regiões a cobrança de pedágio é hostilizada. O prefeito de Francisco Beltrão, Wilmar Reichembach, no entanto, até admite a presença da iniciativa privada na administração das rodovias. "Nossa estrutura é muito defasada. As vias são estreitas e não tem segunda pista. É um gargalo. Em outras regiões, pelo menos tem o pedágio."

A falta de manutenção e obras estruturais para adaptar as rodovias às características econômicas do Sudoeste acaba por encarecer a produção local. Juliano Peruzzo estima gastar cerca de R$ 1,2 mil por mês na manutenção de cada um dos dois caminhões que possui. Mais da metade desse valor, segundo ele, em decorrência das condições das estradas, o que se reflete no preço do frete. "Quebra suporte de cabine e molejo, sem contar o desgaste de freio e pneu."

Meio ambiente e saúde

Publicidade

Outro desafio para o Sudoeste é melhorar o atendimento de saúde. Segundo o prefeito de Pato Branco, Roberto Viganó, faltam médicos nas duas cidades que são referência no atendimento público e privado da região, Pato Branco e Francisco Beltrão. "Temos uma falta muito grande de médicos. Temos um hospital regional e um polo regional de medicina em Pato Branco, mas falta um curso de medicina."

A região também precisa melhorar a relação entre a exploração agrícola e a produção de energia com o meio ambiente. Segundo o Ipardes, apenas 6% da cobertura florestal original ainda se mantém de pé. "As grandes usinas hidrelétricas da região – Salto Caxias, Santo Santiago e Salto Osório – se por um lado potencializam recursos cruciais a economia, por outro agudizam a situação de fragilidade ambiental que ocorre no rio Iguaçu provocada pelas modificações nos ambientes hídricos impostas pelos represamentos, expondo ao risco de extinção global as inúmeras espécies endêmicas de peixe presentes nesta porção do rio", informa o estudo do Ipardes.