Polêmica sobre aborto foi boa para eleitor, diz especialista
Para o cientista político Ricardo Caldas, professor da Universidade de Brasília (UnB), a polêmica sobre o aborto ajudou a esclarecer os valores e o posicionamento dos presidenciáveis Dilma Rousseff (PT) e José Serra (PSDB). Segundo ele, o aborto é "a ponta do iceberg de uma série de discussões sobre valores". "Essa questão foi positiva porque ajudou a definir qual a proposta do Serra e qual é a da Dilma, quem são eles e onde estão", afirma.
Informação ainda é insuficiente
Quando tinha 18 anos, a dona de casa Marta de Oliveira engravidou pela primeira vez, sem planejar. A "surpresa" se repetiria outras vezes, já que achava "meio esquisitos" os métodos contraceptivos e não usava nenhum.
Muita discussão sobre o início da vida, mas quase nenhuma a respeito da família como um todo. Esse é o retrato da disputa presidencial no momento. De um lado, o candidato José Serra (PSDB) tem usado o aborto como arma para atacar a adversária, Dilma Rousseff (PT), por causa de sua opinião contraditória sobre o tema. A petista, com medo de perder eleitores, se comprometeu a não legislar sobre o tema, caso eleita. Em meio a tantas polêmicas, pouco se falou sobre políticas de planejamento familiar, métodos contraceptivos no Sistema Único de Saúde (SUS), licença-maternidade e campanhas preventivas.
Nos planos de governo apresentados até aqui por Dilma e Serra são raras as referências a planejamento familiar. Até existem propostas voltadas para a saúde da mulher, mas faltam informações sobre valores e quantidade de instalações necessárias.
No seu plano de governo, Dilma pretende "promover a saúde da mulher, os direitos sexuais e direitos reprodutivos", sem especificar as ações. "O Estado brasileiro reafirmará o direito das mulheres ao aborto nos casos já estabelecidos pela legislação vigente dentro de um conceito de saúde pública", diz o documento.
No Brasil, o Código Penal prevê detenção de um a três anos para a gestante que provoca aborto. Não são aplicadas penas quando a gestação representa risco à vida da mulher ou quando é decorrente de estupro.
Serra propõe, em seu site, destinar mais recursos para programas de saúde da mulher e criar "Centros de Referência em Cidadania para Mulheres". Também propõe fazer mais campanhas de educação e prevenção, sem especificar os temas.
Com relação à gestante, o tucano pretende criar o programa "Mãe Brasileira", com garantia de "seis consultas e exames pré-natais indispensáveis, orientação para o parto, acompanhamento pós-parto para a mãe e consulta do bebê com o pediatra". Também pretende "criar creches em todo o país", novamente sem especificar a quantidade.
A reportagem enviou perguntas para os candidatos em busca de mais informações, ainda na semana passada, mas não obteve retorno.
Segundo a médica Arícia Giribela, que faz parte da comissão de anticoncepção da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia, mais importante do que se discutir o aborto é prevenir a gravidez indesejada. Ela sugere a oferta de mais e melhores métodos contraceptivos e ações educativas para que a população tome conhecimento sobre eles. "Atuando na prevenção da gravidez, a tendência é que se evite preocupação com o aborto", afirma. "A discussão sobre o aborto deveria ter papel absolutamente secundário."
Arícia também defende a instalação de postos especializados em planejamento familiar. O primeiro passo para isso é garantir o acesso das pessoas aos postos de saúde, diz Leonildo José Monteiro Filho, integrante da coordenação nacional do Movimento Nacional da População de Rua. "Infelizmente para o morador de rua é difícil, porque não tem acesso à unidade de saúde. Não tem acesso e fica vulnerável."
Pós-gestação
Outro desafio é melhorar a condição da mãe após a gestação. A professora de Direito de Família da PUCPR Fernanda Letícia Soares Pinheiro defende a ampliação do horário de funcionamento das creches e da licença-maternidade para seis meses, obrigatoriamente.
A professora também defende uma garantia para que os pais possam levar o filho recém-nascido ao médico, sem que haja desconto de salário. "De 0 a 2 anos, toda criança precisa ir ao pediatra, só que há empresas que não liberam os pais", afirma.
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