A movimentação em torno do impeachment relegou as disputas municipais de 1992 ao segundo plano. Naquele ano, o Brasil foi às urnas, mas também pediu a cassação de Fernando Collor de Mello. Os escândalos envolvendo o primeiro presidente eleito pelo povo em quase 30 anos deram mais motivos para a sociedade duvidar dos políticos em geral. Mas o prefeito de Curitiba na época, Jaime Lerner, não tinha com o que se preocupar. Como arquiteto e urbanista, assinou obras e projetos que fizeram a cidade como a conhecemos hoje. E, com um discurso técnico, ambientalista e sustentável que agradou ao eleitorado, fez com facilidade seu sucessor, Rafael Greca.
VÍDEO: Confira o depoimento do jornalista José Wille sobre as disputas eleitorais
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Ao mesmo tempo em que as campanhas municipais se desenrolavam, o país aguardava a devolução do dinheiro confiscado da poupança e acompanhava assombrado os esquemas de PC Farias tesoureiro da campanha de Collor. Longe desse caos, Lerner arquitetava várias criações, e fazia questão de divulgá-las, o que ajudou a criar o mito de Curitiba como "cidade modelo". Um dos projetos que ele assinou e que perdura até hoje é o "Lixo que não é lixo", lançado em 1989.
Nos anos seguintes foram abertas as portas da Pedreira Paulo Leminski (90), do Jardim Botânico (91) e da Ópera de Arame (92). Também completará 20 anos em 2012 o expresso biarticulado. Para os oposicionistas e alguns estudiosos, o prefeito priorizava as obras de cartão-postal e não proporcionava serviços de qualidade para quem precisava.
Mas as urnas mostraram que o eleitorado estava com Lerner e apoiaria quem ele indicasse. O deputado estadual Rafael Greca, companheiro do PDT, iniciou a disputa em segundo lugar nas pesquisas de intenção de voto, mas logo ultrapassou Maurício Fruet (PMDB). O peemedebista já havia perdido a eleição para prefeito em 1988, porém contava com o apoio do então governador, Roberto Requião.
Também estavam no páreo Luciano Pizzato (PFL), Dr. Rosinha (PT), Tony Garcia (PRN), Márcia Pradi (PSB) e Jonatas Pirkiel (PSDB). Sem unidade, a oposição não conseguiu reunir os votos necessários para a realização do segundo turno, que iria ocorrer pela primeira vez em municípios com mais de 200 mil eleitores. Greca conquistou 52% dos votos e liquidou a disputa em 3 de outubro.
Um dia antes, Itamar Franco assumira interinamente a Presidência da República. O Congresso votou o impeachment de Collor em uma sessão histórica no dia 29 de setembro, transmitida ao vivo em um comício de Maurício Fruet na Boca Maldita.
Todos estavam contra Collor, inclusive Tony Garcia, que era do mesmo partido do presidente, o PRN. Apesar dos discursos, sua candidatura foi minguando: em junho, aparecia em terceiro lugar na intenção de votos; terminou em quinto, com 3,8% dos votos válidos. Fruet ficou em segundo (23,1%), Pizzatto em terceiro (12,3%) e Dr. Rosinha em quarto (6,5%).
O resultado foi uma grande vitória de Lerner, que estava pavimentando seu futuro político. Mas essa disputa foi marcada pela decepção. As abstenções e os votos em branco e nulo foram a opção de 28,7% do eleitorado em 1992, muito mais do que em 1985 (20,6%) e em 1988 (22,2%). Em 1996, o índice caiu (22,3%). O impeachment de Collor e a descrença geral com os políticos deixaram sua marca.
Invasões e o "carma" de Requião
No início deste ano, a operação policial de reintegração de posse da Comunidade Pinheirinho, em São José dos Campos (SP), ganhou contornos eleitorais, com a oposição criticando o governo de São Paulo pela ação considerada truculenta. Curitiba também já vivenciou a sua "operação Pinheirinho", justamente no meio da campanha eleitoral de 1992, acirrando os ânimos dos candidatos.
Empresários da Cidade Industrial de Curitiba (CIC) alertaram para o risco de invasões no bairro no início de setembro. A Caixa Econômica Federal tinha de reduzir custos e por isso boa parte dos contratos com as Cohabs seria suspensa. Mas, segundo os empresários, interesses políticos teriam motivado grupos de sem-teto a invadir áreas industriais. Para eles, o então governador Roberto Requião (PMDB) estava sendo omisso ao não providenciar policiamento.
Uma das áreas invadidas era o Conjunto Pinheirinho, na CIC. Cerca de 500 pessoas ocuparam o local, e a Guarda Municipal foi acionada. O episódio foi bastante explorado pelos principais candidatos, Rafael Greca e Maurício Fruet, com trocas mútuas de acusações.
Não era só por meio de imagens que o PMDB tentava desestabilizar a candidatura de Greca. Muitas críticas eram verbalizadas por Requião. Tanto que, logo após ser eleito, Greca afirmou que o "sr. Governador será respeitado", e conclamou o peemedebista a ser parceiro da prefeitura. "O Requião é importante para nós. Ele é nosso carma negativo. Nós temos com ele a mesma relação que as mãos do padeiro têm com a massa e o fermento. Quanto mais ele amassa, mais nós crescemos", declarou Greca, que hoje está no PMDB e é aliado do agora senador Roberto Requião.
Memória das eleições curitibanas | 9:06
José Wille, jornalista, relembra os principais fatos que marcaram as eleições, a importância da televisão e dos debates.