História de terror contada por meninas
Em uma das vilas da CIC, jovens passam a tarde em canchas de areia. Os meninos jogam futebol ou andam de skate. Ao ver três meninas pequenas numa quadra, a reportagem perguntou se elas estavam acompanhadas. Resposta negativa, mas a avó mora do lado, então não há problema, dizem.
À outra pergunta corriqueira "gostam de vir à praça?" a resposta é desconcertante. "Nossa mãe foi morta aqui no matagal. Cortaram a bochecha dela, arrancaram o olho dela." Dizem as meninas de 10, 8 e 5 anos.
A violência também afeta quem mora nos condomínios luxuosos. Segundo Adriana dos Santos Prado, muitas pessoas deixaram de atravessar o bairro para trabalhar nas casas, por falta de segurança. O bairro CIC registrou o maior número de homicídios na cidade entre janeiro e junho 52, de um total de 304.
População
184,2 mil pessoas moram na Regional CIC. Isso a colocaria como o 9º maior município do Paraná. Seu território 61,5 mil quilômetros quadrados, pouca coisa menos que a Regional Boa Vista abriga a Represa do Passaúna, com um parque municipal e lago, a Casa de Custódia de Curitiba, e também um Fórum Judiciário, que será inaugurado nas próximas semanas.
A Cidade Industrial de Curitiba (CIC) é tão famosa e superlativa que acaba incorporando os bairros vizinhos Augusta, Riviera e São Miguel , como se não houvesse divisão entre eles. Mas, na verdade, a Regional CIC é o caso extremo de fragmentação: cada loteamento, cada conjunto habitacional e cada área invadida tem um nome próprio, como se fossem bairros autônomos. Nesta grande colcha de retalhos, todas as riquezas e contradições brasileiras se fazem presentes. Há mansões luxuosas e favelas transbordando em barrancos; há serviços públicos de primeiro mundo e violência típica de um estado de exceção; há indústrias produzindo riqueza e fumaça, empresas que fecham as portas e também áreas verdes que alimentam a alma e o corpo.
Também há histórias, diversas. Andrea da Silva, 34 anos, ri ao assumir que virou empresária há quatro meses, quando abriu um minimercado entre a Vila Sandra e o Atenas, onde mora. Não foi fácil chegar até aí. Ela e o marido saíram do interior do Paraná para a capital em 2004, tentar uma vida melhor. O Bolsa Família ajudava na criação dos dois filhos pequenos. Ela trabalhou na cozinha de uma creche, depois como zeladora em condomínio e eis que ela mudou de lado, virou "patrão". O Bolsa Família foi suspenso há cinco anos. "A renda da família melhorou."
Mas há muito o que fazer nas imediações, diz o casal Adriana dos Santos Prado, 33, e Jardel Martins de Oliveira, 23 anos. "Precisamos de um parque para as crianças, com brinquedos de verdade, e iluminação", diz Oliveira, autônomo. Adriana mostra a rua de saibro inclinada na Moradias Tramontina "já levei um tombo, me machuquei" e também pede mais segurança. "Não é seguro andar aqui", conta.
Seguindo ao longo da rua Ludovico Kaminski onde o Fórum do Poder Judiciário será inaugurado em breve, com projetos para um programa de pacificação social a pavimentação é precária, não há calçadas. Há alguns anos uma centena de casas espera a definição para o que eles chamaram de Vila Vitória uma invasão que já conta com ligações de luz e esgoto, mas que ainda não tem nome nos logradouros. "A CIC é enorme. Precisamos de uma atenção melhor", opina Nelson Henrique de Sousa, 28 anos, comerciante.
Nas Moradias Diadema, Grazieli Damaceno Gonçalves, 26 anos, reclama de empresas desativadas na região. Ela está procurando emprego e, mesmo fazendo cursinho de informática e mecânica básica, ainda não conseguiu uma vaga. Mas gosta do lugar onde mora. "O bairro está crescendo. O ruim é que antes o ponto final do ônibus era aqui, mas agora vem das Moradias Corbélia já lotado."
Uma das coisas boas da região é o Clube da Gente, que faz a alegria do Caiuá com a oferta de atividades físicas. Dulcineia Ferreira Silva, 44 anos, desempregada, está aprendendo a nadar, sem gastar nada.
Alfredo e Miriam Lakoski, que cultivam hortaliças e são feirantes, também sofrem com o crescimento populacional da CIC. "Antes não se ouvia nada. Agora tem som alto no fim de semana, festa", dizem. A proximidade com Araucária tem vantagens e desvantagens: o filho estuda na escola do município vizinho, e tem transporte escolar rural. Mas a pavimentação e a iluminação na região são precárias. Outro problema é o acesso à internet, que ainda não chegou naquelas bandas. Mas a tranquilidade os mantém na área rural. "É qualidade de vida", resume Miriam.
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