Belágua, no interior do Maranhão, cabe em todos os clichês: é uma das cidades mais pobres do Brasil, num dos mais atrasados Estados nordestinos, com mais da metade de sua população dependente do Bolsa Família.

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O município do semiárido maranhense, pela segunda eleição consecutiva, foi o que proporcionalmente deu mais votos para Dilma Rousseff (PT). Domingo (26), a presidente reeleita recebeu quase 94% dos votos válidos -o tucano Aécio Neves ficou com 6%. No primeiro turno, a petista obteve 92%, mesmo índice alcançado na eleição de 2010.

A 280 km da capital São Luís, Belágua tem 7.191 habitantes e o quarto pior IDH (índice de desenvolvimento humano) do Estado, mas saiu, nos últimos anos, do patamar mais baixo de classificação social (pobreza extrema) para, agora, ser considerada uma cidade na linha da pobreza.

A leve melhora se deve às políticas sociais e de distribuição de renda implementadas nos últimos 12 anos pelos governos do PT, pilares da quase unanimidade de "dona Dilma", como os moradores de Belágua se referem a ela.

O Bolsa Família beneficia 65% da população e é a segunda fonte de receita ao lado de uma cota repassada pelo FPM (Fundo de Participação dos Municípios). Não há empresas: ou se trabalha na roça ou para a prefeitura.

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As casas de barro e a vida precária com escassez de serviços como água e saúde ainda são as mesmas do Estado retratado por Glauber Rocha no documentário "Maranhão 66", que o cineasta filmou quando o então deputado José Sarney tornou-se governador, naquele ano, prometendo um novo futuro.

"Faltar, aqui falta muita coisa, não sei nem por onde começar a falar", dizia o aposentado Acelino de Araújo, 84, que saiu da roça para votar na "dona Dilma".

Somente 3% da população tem saneamento básico, segundo a prefeitura. Além da escassez de água, o acesso ao município é ruim, o que compromete ainda mais o atendimento médico à população.

Programas sociais

No povoado de Pequizeiro, o casal Patrício, 70, e Naíldes dos Santos (que diz não lembrar a idade) recorre como a maioria dos moradores ao rio da cidade para abastecer reservatórios e tomar banhos.

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O casal vive numa casa de tijolos de barro, construída por ele há dez anos. "Voto na dona Dilma porque agora tenho crédito, posso comprar comida fiada", afirma Naíldes, que produz no quintal carvão e farinha. Há outros motivos: a eletricidade chegou ao povoado com o programa Luz para Todos e ela tem na família (filha e netos) beneficiários do Bolsa Família.

Novas ruas também surgiram em Belágua por causa do Minha Casa, Minha Vida, outra bandeira eleitoral de Dilma. "A casa foi entregue, só que sem água", se resigna o pedreiro Ivanaldo Silva, 35, morador de uma delas.Um dos reflexos do Bolsa Família na cidade foi reativar a produção artesanal de farinha de mandioca, importante para a subsistência local.

Neste domingo, com urnas ainda abertas, Naíldes dos Santos comentava sobre o futuro de Belágua, que segundo ela não sobreviveria sem o assistencialismo federal.

"Surgiram histórias de que se ele [Aécio] ganhar, os programas iriam acabar. Mas é mentira, ele mesmo disse na televisão que era mentira. Se cortarem toda a ajuda, Belágua acaba".

Alto da Boa Vista (MT)

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Um Cristo Redentor de 12 metros de altura, entre escombros de alvenaria e madeira à beira da estrada, é o símbolo do ressentimento que levou Alto Boa Vista, no nordeste do Mato Grosso, a se tornar o município mais aecista do Brasil.

"Agora vai ser mais votos para o Aécio", apostava o prefeito da cidade, Leuzipe Gonçalves (PMDB), antes da votação de domingo. No primeiro turno, o tucano teve 83% ou 1.851 dos 2.110 votos válidos, recorde nacional. Aécio teve agora 1.758 votos.

Como vários outros moradores da cidade, Gonçalves tinha terras nas proximidades da estátua do Cristo, distrito conhecido como Posto da Mata, criado dentro da terra xavante Marãiwatsédé, de 165 mil habitantes, homologada em 1998.

Por ordem da Justiça, os não índios foram retirados em 2012, em operação coordenada por forças federais, daí o ressentimento contra Dilma. Fazendas imensas, de gado e de soja, mas também pequenas propriedades, duas escolas e pequenos comércios foram destruídos para evitar reocupação.

Só os pequenos posseiros tiveram direito a se candidatar a ressarcimento -os grandes, disse a decisão, ocuparam de má-fé a área para inviabilizar a demarcação.

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Do Posto da Mata sobraram apenas o Cristo e uma fábrica beneficiadora de grãos.

"Quero minha terra, o que plantei, botei cerca. Não quero indenização", dizia José Inácio, 75, que ao lado da mulher, Divina, 72, ao explicar porque participou, em plena véspera eleitoral, de reunião para discutir como reaver na Justiça os 100 hectares da família na terra indígena.

Quem coordenava o encontro era o advogado Luis Alfredo Abreu, irmão da senadora reeleita Kátia Abreu (PMDB), aliada de Dilma. Luis Alfredo, que indicava, sem citar nomes, que Aecio Neves seria o melhor para o interesse dos posseiros, festejava decisão do Supremo Tribunal Federal que reverteu a demarcação de uma terra indígena no Mato Grosso do Sul. O aplicado lá -os índios não estavam na área em 88, data da Constituição- valeria para os xavantes, retirados de Marãiwatsédé durante a ditadura (1964-1985).

"É muito difícil que a gente perca no Supremo. A jurisprudência está virando a nosso favor", disse Luis Alfredo, num indicativo de que o novo mandato de Dilma provavelmente terá de lidar com recrudescimento de conflitos agrários-indígenas, especialmente nesta zona, considerada a grande aposta soja no Mato Grosso.

Do mesmo lado

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No domingo, a chuva que caiu de manhãzinha formou barro avermelhado nas ruas de terra da cidade e na entrada da casa de madeira onde vivem Osmar e Lurdes e quatro de seus cinco filhos.

Ali também o conflito da terra xavante, onde vivem cerca de 1.000 indígenas, se fazia sentir. "Foi uma covardia grande", se queixava Osmar, 48, sobre a retirada da terra xavante. Recebedor do Bolsa Família (R$ 317 por mês) e eleitor de Lula e Dilma no passado, votou em Aécio.

Na noite de domingo, a frustração de Osmar e Lurdes era a mesma do vereador conhecido como "Nivaldo do Posto da Mata". "Apostei R$ 10 mil no Aécio. Mas não é só isso que eu perco. Com ela, eu perco a vida", disse ele.O vereador é um dos implicados no inquérito do Ministério Público que acusa políticos e produtores de tentar sabotar a desocupação da terra xavante, o que ele nega.

A denúncia formal sobre o caso deve ocorrer nas próximas semanas.

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