Tema da campanha presidencial, a autonomia do Banco Central prevista em lei e com mandatos fixos para seus dirigentes é compatível com regimes democráticos e institucionalmente mais desenvolvidos. Essa é a visão de Gustavo Franco e Gustavo Loyola, dois ex-presidentes da instituição no governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.
"O Brasil está, sim, maduro para ter uma autoridade monetária [BC] autônoma. Aliás, está até tardando demais", disse Loyola.Para Franco, é preciso difundir a ideia de um BC como instituição de Estado, e não de um ou outro governo.
"O presidente não é dono do BC como não é dono da PF [Polícia Federal, em referência à fala recorrente da presidente Dilma de que ela manda investigar casos de corrupção] e da Petrobras. Não se elege um rei nem um ditador", disse.
O economista afirmou ainda que só com mandato fixo de seus gestores se confere uma real autonomia ao BC --ideia que contraria a posição de presidente e candidata Dilma e defendia pela sua opositora Marina Silva.
Franco reconhece, porém, que essa prerrogativa poderia ter sido adotada durante a implementação do Plano Real (1994). Disse ainda que, quando presidiu o banco, o então presidente Fernando Henrique não tinha também a intenção de promover uma autonomia legal.Segundo ele, havia a "independência operacional" --mesma proposta de Aécio Neves. "Eu trabalhei com um presidente [FHC] que pensava dessa forma. Ele confere independência [para o presidente do BC], mas acho que seria melhor institucionalizar [criando uma lei]."
Franco afirmou ainda que não vê o tema como "polêmico" no Parlamento, uma vez que o sistema já existe para as agências reguladoras --cujos diretores têm mandato fixo e aprovado pelo Senado.
Segundo o economista, o ideal seria que para o presidente da República demitir um dirigente do BC fora de seu mandato também tivesse de pedir autorização aos senadores. "Seria mais demorado, mas [o cargo] não é algo intocável. O presidente sempre tem a sua bancada."Prevista em lei, a autonomia seria uma blindagem a interesses políticos, na avaliação de Loyola. "Deixar o BC para os políticos é como deixar o pires de leite para o gato tomar conta."Franco afirmou ainda que há "uma politização indevida do tema" e diz ainda estranhar que esse assunto "tenha vindo parar" no debate eleitoral. "Ainda mais dizendo que [a autonomia irá tirar comida da mesa do trabalhador. Isso é patético", disse, em referência a um das peças publicitárias da campanha de Dilma.
EconomiaLoyola, hoje sócio da Tendências Consultoria, disse ainda que vê o BC com menos credibilidade atualmente. Um exemplo é que o mercado não crê mais no centro da meta de inflação em 4,5%, mas sim no objetivo que a atual diretoria do órgão persegue: não estourar seu teto, de 6,5%.
Tanto Franco como Loyola consideram que o atual governo lança mão de algumas políticas de crédito e estímulo a determinados setores usadas no governo militar e que não deram certo.
Eles se referem à política industrial de eleger alguns setores prioritários e que usa, entre outros instrumentos, juros subsidiados --como algumas linhas de financiamento do BNDES com juros abaixo da inflação-- e aos repasses de recursos do Tesouro para o banco estatal de fomento. "Se alguém paga menos juros, outros vão pagar mais caro", disse Franco.
Para Loyola, "quanto pior o cenário fiscal [com maior deficit, como agora, e dificuldade do governo de fechar suas contas], menor será a transparência entre a relação do BC, Tesouro e banco públicos [Banco do Brasil, Caixa e BNDES, especialmente, que são os agentes do chamado crédito direcionado, para agricultura, habitação e fomento à economia]".
O papel do BC nos anos 60 e 70, dizem, era muito mais emitir moeda para "irrigar" o sistema financeiro de crédito. Não havia uma preocupação muito clara com a estabilidade de preços. "Isso funcionava porque era uma ditadura e havia alto crescimento econômico, na faixa de 10% e uma inflação na casa dos 20%. Estava sob controle", disse Franco.
Criado por lei apenas no fim de 1964, o Banco Central brasileiro foi um dos últimos a nascer no continente americano, após 20 anos de intensas discussões políticas, que perpassaram governos. Antes, cabia a uma superintendência do Banco do Brasil a emissão, controle da moeda e da política monetária.
Os dois economistas participaram de um evento promovido pela Associação Comercial do Rio de Janeiro.
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