Em apenas 45 dias – metade do que costumava durar em anos anteriores –, a campanha pela prefeitura de Curitiba deu o que falar. A disputa pela vaga de prefeito teve mais aventura, drama e acusações que muito roteiro de longa-metragem hollywoodiano. Campana clandestina em área rural, artefatos históricos desaparecidos, guerra de cortes e edições de vídeo, candidatura cancelada às vésperas da votação e outros “causos” esquentaram o primeiro turno.
Por conta da mini-reforma eleitoral aprovada pela Câmara dos Deputados sob a presidência do hoje cassado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), ficaram proibidas as doações de empresas, o teto de gastos é mais baixo, está vetada a publicidade paga na internet e se restringiu o uso de materiais de divulgação – os outrora onipresentes cavaletes, por exemplo, desapareceram.
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Ainda que tudo isso – mais a coincidência com a Olimpíada e o processo de impeachment de Dilma Rousseff (PT) – tenha deixado a eleição meio que escondida do eleitor, as campanha teve conflitos de sobra.
O Tribunal Regional Eleitoral (TRE-PR) registrou, do início da campanha até o último dia 20, a abertura de 1.375 processos. Na conta, estão incluídos os 1.180 pedidos de registros de candidatura, mas também representações, ações cautelares, pedidos de providências e petições. Após o final das eleições ainda serão incluídas no total as prestações de contas das 1.146 candidaturas deferidas a prefeito e vereador.
Para comparação, em 2012 foram 2.146 processos durante os 118 dias de campanha do primeiro e segundo turno. Estão inclusos nesse total as análises de comitês financeiros e prestações de contas das candidaturas, que juntas representaram cerca de 40% dos processos.
Confira alguns casos que agitaram o primeiro turno da disputa pela prefeitura de Curitiba.
“Cheiro de pobre”
Rafael Greca aparecera com 45% das intenções de voto na segunda pesquisa do Ibope. Sua eleição no primeiro turno passou a ser dada como possibilidade real. Mas, o próprio candidato acabou por reduzir as chances de que isso aconteça.
“Nunca cuidei dos pobres, não sou São Francisco de Assis. Até porque a primeira vez que tentei carregar um pobre pra dentro do meu carro eu vomitei por causa do cheiro”, disse Greca, em sabatina promovida pelo jornal “Bem Paraná” e pela PUC-PR (Pontifícia Universidade Católica do Paraná). A frase foi dita durante comentário sobre o trabalho de acolhimento realizado por instituições de caridade, e Greca relatava uma experiência de sua juventude.
Caiu como uma bomba. A frase correu o país, foi assunto nas redes sociais, de comentaristas políticos e humoristas. Greca desculpou-se. “Não tive a capacidade de explicar a dificuldade que vivi ao tentar realizar o trabalho de resgate social na minha juventude. Peço que me perdoem pela falta de clareza do discurso. Não me interpretem mal.”
Em seguida, ele – e outros candidatos – foram exibidos por suas campanhas, na televisão, abraçando mendigos. O impacto da frase de Greca será conhecido, de fato, quando forem abertas as urnas, neste domingo. Mas é certo que ela já foi incorporada ao anedotário da política nacional.
Os caçadores das obras perdidas
Fotos publicadas em redes sociais por Rafael Greca (PMN) de sua chácara em Piraquara, região metropolitana de Curitiba, detonaram um debate em torno do sumiço de artefatos que pertenciam ao acervo municipal da Casa Klemtz, no Fazendinha.
A prefeitura afirma que 12 dos 29 bens históricos da casa, comprada pelo município em 1995, na gestão de Greca – prefeito entre 1993 e 96 –, são considerados desaparecidos pela prefeitura após um levantamento feito em 2001 e atualizado em 2013.
E o que as fotos têm a ver com isso? Segundo laudo pericial entregue pelo presidente da Fundação Cultural de Curitiba (FCC), Marcos Cordiolli, à imprensa, elas mostram que há semelhanças entre três artefatos que estão na chácara de Greca com parte do patrimônio sumido: dois lavatórios e uma cristaleira.
Chamado para depor no último dia 27 de outubro em uma sindicância aberta pela prefeitura para apurar o desaparecimento das peças da Casa Klemtz, Greca enviou o advogado, que afirmou que o candidato permitirá a entrada das autoridades para averiguações. Só o fará, contudo, após as eleições.
Dois perdidos numa estrada
Entre uma cena e outra do caso da Casa Klemtz, a detenção de dois guardas municipais de Curitiba numa estrada de Piraquara ganhou os holofotes. Ela ocorreu logo após surgir a história do sumiço dos artefatos. Tratava-se de servidores licenciados, detidos pela Polícia Civil, por supostamente estarem monitorando a chácara de Greca.
Alegando o contrário, os guardas afirmam que estavam em Piraquara para visitar a sede campestre da Associação de Servidores Públicos de Curitiba, com a pretensão de alugar o espaço para uma festa particular.
Coincidência maior é que os guardas eram voluntários da campanha do candidato à reeleição, Gustavo Fruet (PDT), e um dos carros utilizados pelos servidores também estava locado em nome da campanha do pedetista. Em nota, a campanha afirma que os guardas agiram sem o conhecimento da coordenação.
Auto-doação acima do patrimônio declarado
Com exceção de Maria Victoria (PP), a auto-doação é algo que os demais prefeituráveis têm em comum. Proporcionalmente ao total de receitas declaradas até o momento ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), quem mais fez doação para a própria campanha foi o empresário Ademar Pereira (Pros), responsável por 98% dos R$ 158 mil arrecadados.
Os que doaram as menores quantias em termos proporcionais, com menos de 0,5% das receitas, foram o candidato à reeleição, Gustavo Fruet (PDT), com R$ 40 mil dos R$ 969 mil arrecadados, e Xênia Mello (Psol), com R$ 1 mil dos R$ 23 mil de receitas.
Em valores absolutos, Rafael Greca (PMN) foi quem mais fez auto-doação, sendo responsável por 38% das receitas de campanha, com doação de R$ 600 mil dos R$ 1,5 milhão arrecadado. O que chamou a atenção é que o valor doado ultrapassa em R$ 23 mil o total de patrimônio declarado ao TSE na candidatura, de R$ 573 mil.
O massacre do Centro Cívico entra em cena
A campanha de Rafael Greca botou na televisão peça de propaganda em que sugeriu que o prefeito Gustavo Fruet se escondeu no subsolo da prefeitura em 29 de abril de 2015, quando um protesto de professores contra medidas do governo Beto Richa (PSDB) foi reprimido violentamente pela Polícia Militar (PM), deixando um saldo de mais de duas centenas de feridos, no episódio que ficou conhecido como “Batalha do Centro Cívico”.
O time do pedetista reagiu. “O que a propaganda de Rafael Greca não diz é que uma enfermaria foi improvisada no subsolo da prefeitura para atender os professores que foram vitimas da violência praticada naquele dia. O prefeito Gustavo Fruet estava lá”, afirmou, em vídeo de campanha.
Questionado a respeito, em sabatina na Gazeta do Povo , Greca, embora sem admitir que tenha havido manipulação, desculpou-se. “Não acompanhei isso porque estou na rua, não edito programa eleitoral. Não dá tempo. Se aconteceu, me desculpem, mas a minha visão é que eu fui para o meio da praça e o prefeito ficou na prefeitura. Você diz que ele ficou socorrendo feridos. Bendito seja. Eu teria impedido (que houvesse) os feridos”, disse.
“Contas reprovadas” deram direito de resposta a Greca
Rafael Greca obteve na Justiça Eleitoral direito de resposta para rebater a acusação de que suas contas como prefeito, entre 1993 e 96, foram reprovadas no Tribunal de Contas do Estado (TC-PR). A informação havia sido veiculada em uma peça de propaganda eleitoral de televisão da campanha do candidato a prefeito Gustavo Fruet (PDT), no dia 16 de setembro.
Ficha técnica da segunda pesquisa Ibope
*A pesquisa foi contratada pela Sociedade Rádio Emissora Paranaense S.A e foi realizada entre os dias 15 e 18 de setembro com 805 eleitores. A margem de erro da pesquisa estimulada é de 3 pontos percentuais para mais ou para menos. O nível de confiança é de 95%. A pesquisa está registrada no Tribunal Regional Eleitoral do Paraná (TRE-PR) sob o protocolo Nº PR-01610/2016.
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