Se dois extraterrestres do mesmo planeta caíssem em Curitiba, um no Batel e o segundo na Caximba, e depois de resgatados tivessem a oportunidade de conversar, relatariam mundos incrivelmente diversos. Um deles urbano, rico, movimentado. Outro com paisagens rurais, bem mais pobre, calmo. Provavelmente pensariam não ter estado na mesma cidade.
O hábito muitas vezes naturaliza as enormes diferenças que existem num município. Mas, se por um pequeno instante os curitibanos tentassem enxergar a cidade com olhos de um ET curioso, veriam que dentro de Curitiba há muitas “Curitibas”. Identificá-las e agir para atender as necessidades específicas dessas diferentes “Curitibas” é um dos desafios que o futuro prefeito terá pela frente.
Só para ficar no exemplo acima, o último censo do IBGE, de 2010, revela que a distância entre o Batel e a Caximba é muito maior que os 27 quilômetros que os separam. O bairro nobre é o segundo com mais idosos da cidade (17,2% de sua população tem 65 anos ou mais). A Caximba, por outro lado, é o quinto bairro com mais crianças e adolescentes (28,2% de sua população). Mas o que mais divide os dois bairros é o dinheiro no bolso. Cada morador do Batel tem uma renda média de R$ 4,1 mil mensais – são os curitibanos mais ricos. Na Caximba, estão os mais pobres, com apenas R$ 560 mensais de rendimento médio.
Segregação socioespacial
A geógrafa Rosa Moura, pesquisadora do Observatório das Metrópoles, afirma que Curitiba reproduz, como toda grande cidade brasileira, uma forte segregação socioespacial. Ou seja: quem tem mais renda se estabelece em regiões mais bem estruturadas da cidade. Em geral, para os pobres sobra a periferia, menos atendida pelo poder público. É essa lógica que cria, por exemplo, as gritantes diferenças entre o Batel e a Caximba – e, consequentemente, as demandas diferentes de seus moradores.
Até mesmo a presença maior de crianças e jovens na periferia é explicada pela lógica socioespacial. Segundo Rosa, a população mais pobre do interior chega à cidade, só encontra lugar para ficar nas bordas do município e ali reproduz os indicadores sociais de seus locais de origem: alta taxa de natalidade e índices de mortalidade maiores de adultos. Resultado: muitos jovens e poucos velhos.
Para a geógrafa, na prática só há uma alternativa para reduzir as grandes diferenças que existem dentro das cidades: investir pesado nas periferias. Mas é uma opção política que enfrenta resistência. “Quem tem mais acesso às instâncias governamentais possui mais poder de barganhar melhorias para seu espaço.” Por isso, diz ela, é preciso que o poder público crie mecanismos para ouvir – de verdade – as comunidades mais pobres. E permita que elas participem das decisões governamentais.
Planejamento estratégico
Pós-doutor em doutor em administração municipal e professor do mestrado e doutorado em gestão urbana da PUCPR, Denis Alcides Rezende afirma que a redução das desigualdades dentro de um município só vai ocorrer com um projeto que não se resuma a um mandato de quatro anos. “É preciso um planejamento estratégico de longo prazo, de 20 anos, por exemplo. É o que fazem as cidades mais desenvolvidas em todo o mundo”, diz ele.
Segundo Rezende, o planejamento estratégico necessariamente precisa reunir representantes da sociedade civil para discutir os problemas e estabelecer estratégias e ações necessárias para várias áreas: saúde, segurança, educação, transporte, moradia. “É claro que vai haver jogo de interesses [nessa discussão]”, alerta o professor. “Mas o plano tem de ser feito.”
Rezende destaca que a participação da comunidade é fundamental inclusive para cobrar que o planejamento saia do papel. De acordo com ele, no passado São José dos Pinhais fez um plano desse tipo. Mas uma determinada gestão engavetou a proposta. “Faltou mobilização popular para cobrar da prefeitura a execução do planejamento.”
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