Reconhecida como um marco nas finanças públicas do Brasil, a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) se mostrou eficiente para reduzir dívidas de estados e municípios e gastos com pessoal de alguns entes da Federação. Um balanço das contas públicas em seus 15 anos de vigência mostra, no entanto, que, embora a maioria dos governantes defenda a austeridade fiscal, na prática não seguem seu principal mandamento: gastar só o que arrecadam. Entre 2000, quando a lei entrou em vigor, e 2014, os indicadores apontam para a piora nas contas públicas. A situação mais grave é no governo federal. Os gastos neste caso cresceram, no período, o equivalente a 4,2 pontos percentuais do Produto Interno Bruto (PIB), enquanto a receita líquida, descontadas as transferências a estados e municípios, aumentou 2,2 pontos percentuais.

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O resultado primário do setor público (que engloba também estados e municípios), um indicador importante da saúde das contas por ser a economia usada para pagar os juros da dívida, regrediu nesse mesmo período 3,8 pontos percentuais do PIB. Saiu de um superávit de 3,2 pontos do PIB em 2000 para um déficit de 0,6 ponto em 2014. A piora nos indicadores fiscais é observada, a partir de 2005, em todas as esferas de governo. No caso do governo federal, o superávit primário correspondia a 1,7 ponto do PIB em 2000, chegou a 2,6 pontos em 2005 e, a partir daí, só decresceu, culminando num déficit equivalente a 0,4 ponto do PIB em 2014.

Os gastos crescentes do governo federal foram sustentados, nos últimos anos, por um forte aumento da arrecadação de impostos, mas, com a economia em desaceleração, as receitas encolheram, e o resultado das contas públicas foi fortemente afetado. A ausência do princípio de gastar apenas o que se arrecada ficou também evidenciada pelas diversas tentativas de flexibilizar a lei para gastar ainda mais. Para o economista José Roberto Afonso, pesquisador do IBRE/FGV e professor do Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP), considerado um dos pais da LRF, é preciso, pelo contrário, endurecê-la:

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— Nos últimos anos, o Brasil pecou ao criar receitas por mágica, ao postergar, omitir e até usar terceiros para pagar gastos públicos, ao não computar tudo na dívida ou a dela abater o que não cabe. É com uma lei mais dura que evitaremos que a porta seja arrombada de novo. Não basta substituir quem a arrombou.

Nesses 15 anos, essa tentativa de flexibilização não foi iniciativa exclusiva do governo federal, já que muitas manobras foram feitas por estados e municípios. Entretanto, as manobras do Tesouro para driblar a LRF ganharam notoriedade, sobretudo com a recente decisão do Tribunal de Contas da União, que concluiu que as “pedaladas fiscais” — atraso nos repasses a bancos públicos para melhorar as contas artificialmente — feriram a lei.

Ameaça

A presidente da Associação Nacional dos Auditores de Controle Externo dos Tribunais de Contas do Brasil, Lucieni Pereira, aponta o que considera a nova ameaça à LRF: o projeto que propõe a exclusão das áreas de Saúde e Educação dos limites de pessoal previstos na lei, o que deixaria esses setores sem controle de gastos. O projeto tramita no Congresso.

— O que se viu nos últimos dez anos foi um verdadeiro ataque a pontos que são estruturantes da gestão fiscal, como as condicionantes para que estados e municípios recebam as transferências voluntárias (recursos do governo federal) e também as vedações para evitar o endividamento — afirma Lucieni Pereira. — A lei proibe que um ente da federação financie o outro ou use os bancos que controla para fazer alavancagem fiscal com fins eleitorais.

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