Interceptações telefônicas feitas pelo Gaeco, braço do Ministério Público, mostram que o ex-presidente e atual conselheiro do Tribunal de Contas (TC-PR), Artagão de Mattos Leão, pelo menos desconfiava de problemas na licitação de R$ 36,4 milhões para construir um anexo ao prédio, no ano passado.
A gravação vai na contramão do que afirmou Artagão em entrevista à Gazeta do Povo, ontem, na qual negou ter conhecimento da suposta fraude na concorrência.
Propina teria sido negociada durante jogo da Copa
Animadamente, o ex-coordenador do TC Luiz Bernardo Dias Costa combina de assistir a um jogo da Copa do Mundo com o proprietário da Sial, Edenílso Rossi. O encontro seria na sede da Sial, em junho de 2014.
A conversa, interceptada pelo Ministério Público, na verdade teria como objetivo negociar o pagamento de propina da construtora para servidores do TC, de acordo com os promotores.
“Você não quer ver um pouquinho do jogo da Holanda ali no meu escritório, lá pelas 15 pras duas?”, pergunta Rossi. Costa aceita o convite.
Rossi dá instruções sobre como chegar na empreiteira, que recentemente havia vencido a licitação de R$ 36,4 milhões do TC. E em seguida diz, entre risos: “Tomara que a Holanda vença esse jogo!”.
Na escuta, o então diretor-geral do TC, Ângelo Bizineli, liga para o presidente para avisar que agentes estavam vasculhando a sala dele. Bizineli diz não saber o motivo da revista. “Eu acho que é sobre a licitação do prédio”, responde Artagão.
O então presidente pergunta onde está “LB”, em uma abreviação para Luiz Bernardo Dias Costa, ex-coordenador-geral do tribunal. Bizineli diz que ele ainda não havia voltado do horário de almoço. “Será que não prenderam o Luiz Bernardo?”, pergunta Artagão.
Em seguida, ele pede para que Bizineli ligue para Luiz Bernardo. “Liga pra ele suspender qualquer ação que tiver, qualquer ação imediatamente”, pede.
Em outro momento do telefonema, Artagão diz que a situação com o Gaeco era “uma vergonha” para eles.
Por ter foro privilegiado, Artagão está sendo investigado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). A sindicância, porém, está parada há seis meses.
Propina
A ligação telefônica ocorreu no dia em que Costa era preso em flagrante ao sair da construtora que venceu a licitação, a Sial, com uma mala com R$ 200 mil em dinheiro vivo.
Segundo o MP, a Sial iria pagar mais de R$ 2 milhões a servidores do tribunal em contrapartida para vencer a licitação. Além da mala de R$ 200 mil, também foram encontrados cinco envelopes com valores que somam R$ 59,9 mil na casa de Costa. Para o MP, a empreiteira estaria pagando a propina de modo parcelado, em dinheiro vivo.
Costa, o diretor da Sial, Edenílso Rossi, seu filho Pedro Henrique Rossi e outras três pessoas foram presos na época, em junho do ano passado, mas já colocadaos em liberdade.
Outros indícios
Esta semana, a Gazeta do Povo mostrou outros indícios da suposta fraude levantados pelo MP. Em uma gravação, Pedro Henrique Rossi aparece tentando dissuadir uma outra empresa de continuar na concorrência. Diz que isso poderia “melar o esquema” e que se a empresa insistisse, a retaliação viria “mais cedo ou mais tarde, por parte deles [TC]”.
Escutas anuladas
Em agosto, o Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR) anulou as interceptações telefônicas da operação, sob a argumentação de que as escutas foram autorizadas com base em uma denúncia anônima, e por isso seriam ilegais. O Gaeco recorreu e ainda não houve decisão definitiva sobre a validade das provas.
Na semana passada, o MP enviou denúncia à Justiça com base apenas em outras provas, e não nas interceptações. Mas o TJ decidiu suspender o processo até que seja definido se as escutas são válidas.
Artagão foi procurado pela reportagem hoje, mas não retornou. Os advogados dos outros envolvidos afirmam que não irão se manifestar porque as provas, para eles, são ilegais.