Entrevista
"Não abdicamos das nossas prerrogativas"
Gilberto Giacóia, procurador-geral de Justiça do Paraná.
Qual a sua análise a respeito de 2013 para o MP?
Enfrentamos grandes desafios. Veio com muita força nesse último ano a tentativa de reduzir o poder de investigação do MP. O posicionamento do MP é sempre muito claro: não abdicamos das nossas prerrogativas. No plano estadual, o governador deu um olhar atencioso. Havia uma defasagem, o porcentual orçamentário do Judiciário passou de 9% para 9,5% e o MP não acompanhou. O Judiciário instalou comarcas e varas, e cada uma precisa de um promotor. O atual governo acabou corrigindo em 0,1% ao ano, o que atenuou o problema.
A sociedade rejeitou a PEC 37 (que retirava o poder de investigação do MP). Ainda há clima para iniciativas como essa?
Não tenho dúvida que, se a sociedade não tivesse saído às ruas e incorporado à sua pauta a derrubada da PEC 37, ela teria sido aprovada. Estabelecemos um marco divisório. A ação penal 470 (processo do mensalão) representa uma quebra de paradigma, uma ruptura desse caldo cultural da impunidade no Brasil.
A estrutura do MP está preparada para esse novo momento?
Temos um projeto ousado, oferecer apoio técnico tático operacional diferenciado para o combate a uma criminalidade não convencional: grandes fraudes, crimes financeiros e tributários, crime organizado. Para isso melhoramos nossos quadros, ampliou-se o número de promotores e de servidores. Também tivemos um ganho material, com investimento em tecnologia da informação. Criamos áreas específicas de habitação e urbanismo, um centro de apoio operacional para o tema da mobilidade. Estamos investindo em um novo modelo de Ministério Público criminal, começando por Curitiba. Outra grande área que mereceu destaque em 2013 foi o patrimônio público. Nunca se cobrou tanta transparência e tanta defesa do patrimônio público como agora. E estamos em um processo de gradativa eliminação do papel, do físico. Racionalizar a administração é um caminho sem volta.
O MP tem sido severo em relação aos ocupantes de cargos comissionados em câmaras de vereadores do interior. Como ficam a Câmara de Curitiba e a Assembleia Legislativa?
Acompanhamos todo o processo de saneamento da Assembleia. Limitamos o número de agentes políticos, procuramos estabelecer parâmetros, como local pré-estabelecido para o cumprimento da função, horário, relatório de atividades. Esta equação não é resultado da sua criatividade, mas de interpretação das leis e da jurisprudência dos tribunais superiores. Acho que a Câmara de Curitiba está ajustada às exigências.
Análise
"Quem fiscaliza o fiscal?", questiona professor
O especialista em Direito Constitucional Egon Bockmann Moreira avalia que ações contra as gratificações incorporadas aos salários de servidores do Poder Judiciário e do Ministério Público teriam chance de prosperar. O problema, diz ele, é saber quem apresentaria as ações e quem as julgaria. "A grande figura [da ação] seria o Ministério Público. Esse é o grande problema: quem fiscaliza o fiscal?", questiona o professor do Departamento de Direito Público da Universidade Federal do Paraná (UFPR).
Para Moreira, o pagamento de gratificações contraria a Constituição Federal. "O regime salarial estabelecido pela Constituição, e depois pela emenda 19, de 1998, visava justamente a impedir a criação desses penduricalhos", afirma. "Ocorre que o aumento de salário depende de lei, observado o teto dos ministros do Supremo, e esse aumento traz um efeito cascata. A técnica que vem se desenvolvendo no Brasil há décadas é inventar esses acréscimos decorrentes de algumas peculiaridades da função, como o auxílio-livro, por exemplo."
O professor questiona a forma como os benefícios são concedidos. "Esses órgãos se autorregulam e instituem vantagens. O Executivo e Legislativo não querem entrar em choque. O presidente do CNJ, por exemplo, é o presidente do Supremo. Não tem quem discipline o CNJ", diz. Moreira ainda questiona a paridade entre membros do Judiciário e do Ministério Público. "Não sei se existe uma paridade de direito positivo. Me parece que essa paridade é um dado, é criada, é resultado de interpretação."
Na ponta do lápis
Gastos do MP-PR com a folha de pagamento:
2010: R$ 337.679.112,73
2011: R$ 444.563.903,59
2012: R$ 450.350.924,04
2013: R$ 499.960.292,34
Fonte: Portal da Transparência do governo do Paraná.
Em meio a um processo de aumento de gastos com pessoal, o Ministério Público do Paraná (MP) irá buscar a incorporação de novas gratificações aos salários de seus servidores efetivos e ocupantes de cargos comissionados, caso elas sejam aprovadas para o Poder Judiciário. A informação é do procurador-geral de Justiça, Gilberto Giacóia. Para ele, apesar de o MP ser um órgão fiscalizador, os benefícios funcionam como uma espécie de reposição diante do acúmulo de perdas salariais.
Nos últimos quatro anos, os gastos do MP com pessoal cresceram 23,5% (em valores corrigidos com base no Índice de Preços ao Consumidor Amplo, o IPCA). Em 2010, o órgão destinou R$ 337,7 milhões à folha de pagamento. No ano passado, foram R$ 500 milhões.
Dois benefícios aprovados no ano passado, o auxílio-saúde e as gratificações por assiduidade e produtividade, causarão um impacto aproximado de R$ 12,2 milhões por ano nas contas do MP. O auxílio-saúde gerou polêmica, já que os deputados estaduais aprovaram o projeto sem estender o benefício aos ocupantes de cargos comissionados, mas voltaram atrás e acabaram garantindo o pagamento.
A próxima gratificação que pode ser incorporada aos salários é o auxílio-moradia. O projeto do Tribunal de Justiça do Paraná (TJ) que institui o benefício foi encaminhado à Assembleia Legislativa em 2013 e os deputados começarão a discutir o tema em fevereiro deste ano. Caso venha a ser aprovado, existe a chance de o benefício ser estendido ao MP.
Outra gratificação, o auxílio-alimentação, foi incorporada aos salários do MP em 2012. Na época, a previsão era que o gasto anual chegasse a R$ 9 milhões. Além disso, o reajuste de 4,9% no salário dos ministros do STF, aprovado no dia 1.º, aumentará automaticamente os vencimentos de promotores e procuradores neste ano.
Questionamentos
O artigo 39 da Constituição Federal determina que servidores públicos, ministros e secretários "serão remunerados exclusivamente por subsídio fixado em parcela única, vedado o acréscimo de qualquer gratificação, adicional, abono, prêmio, verba de representação ou outra espécie remuneratória". Decisões do Supremo Tribunal Federal (STF), do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), no entanto, têm deixado a porta aberta para os tribunais instituírem gratificações.
"Não acho que as gratificações sejam inconstitucionais da forma como o Supremo ou o STJ as praticam", avalia Giacóia. "Não fugindo da natureza a que se destina o benefício, acho que não há uma vedação constitucional tão explícita." Para o procurador-geral, os benefícios têm ajudado a corrigir distorções salariais históricas. "Havia uma política de não aumentar as remunerações porque isso gera um efeito cascata. A solução encontrada foi de forma indireta. Não trabalhamos muito com essa questão, se é certo ou errado, mas sim se é justo defender uma categoria funcional, um status constitucional que a magistratura já havia se concedido."
Giacóia não acredita, entretanto, que o auxílio-moradia seja incorporado. "A lei já prevê o benefício para casos de difícil provimento. Acho que a magistratura quer ter a possibilidade de implantar caso isso seja definido como uma verba legal. Mas não vejo que isso tenha o imediatismo como o que se está dando."
Crítica
Procurador atribui rodízio no Gaeco à "visão míope" do governo
O procurador-geral de Justiça do Paraná, Gilberto Giacóia, disse temer pelo futuro do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) após a instituição de um rodízio de policiais militares no órgão. A troca foi determinada em setembro do ano passado pelo secretário estadual da Segurança Pública, Cid Vasques. Para Giacóia, o rodízio prejudica as investigações, já que a atividade demanda treinamento específico. Além disso, a relação de confiança com os promotores ficaria prejudicada.
"Não se pode impor a uma célula tão importante uma sistemática que gere insegurança para quem está trabalhando", avalia o procuradorgeral. "Os promotores que estão vinculados a esse tipo de atividade correm riscos, como poderão trabalhar senão em um regime de absoluta confiança, segurança e preparo? O combate ao crime organizado requer muito mais do que uma mera recomendação administrativa."
Questionamentos
Giacóia atribui a decisão do governo do estado a uma "visão míope". "Qual é o ganho social de gerar essa situação em uma equipe com um interesse público relevante?", questiona. "Demora-se anos para compor uma equipe. Temos investigações em curso, em Guarapuava são duas ou três com possibilidade de serem prejudicadas. O policial fica pensando que vai sair no mês que vem, que vai ficar lá no máximo um ano. Isso quebra toda a possibilidade de êxito de uma célula importante. Sinceramente, não consigo compreender."
Segundo a Secretaria de Estado da Segurança Pública (Sesp), o rodízio de policiais militares é um processo natural que tem sido implantado desde setembro. Há meses, de acordo com a Sesp, policiais têm saído de unidades do Gaeco para dar lugar a outros.
Giacóia contestou ainda a declaração do governador Beto Richa segundo a qual a decisão do Conselho do Ministério Público, de não liberar Cid Vasques para o cargo de secretário (ele é promotor de Justiça), foi uma "decisão política". "Não sei o que ele quis dizer por política. Mas ele sabe, não tem nada a ver com o governador ou com o governo. A questão é com o secretário. A questão é a postura funcional do secretário."
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