A proposta de emenda constitucional do governador Roberto Requião (PMDB) não proíbe o nepotismo cruzado entre poderes. Essa é a primeira conclusão da comissão especial de cinco deputados estaduais criada durante a semana para analisar a proposta do governo que proíbe a contratação de parentes até 2.º grau no serviço público do Paraná. O presidente da comissão, Durval Amaral (PFL), diz que o principal argumento do governo usado para derrubar a emenda do deputado Tadeu Veneri (PT) é "um engodo". Amaral, que também é presidente da Comissão de Constituição e Justiça (PFL), defende que, mesmo assim, não há impedimento legal para votar a proposta.
A comissão tem a tarefa de decidir se vota ou não a emenda que proíbe o nepotismo. Se optar pelo arquivamento, vai assumir o ônus?
A preocupação existe, mas não podemos agir na comissão com motivação política. Se o entendimento for pelo arquivamento, a sociedade paranaense já sabe quem são os agentes políticos que defendem a prática e esse ônus não recairá sobre a comissão. A população já está fazendo a leitura de que existem duas correntes no Paraná: uma contra o nepotismo e outra minoritária que defende a contratação de parentes no serviço público.
O argumento dos governistas é de que não são favoráveis ao nepotismo, mas querem a votação da emenda do governador, que seria mais abrangente por impedir o nepotismo cruzado entre poderes. O texto tem maior alcance?
Eu ouvi muito o governo falar em nepotismo cruzado e não encontrei na proposta do governo nada que impeça a prática, exceto uma tentativa de proibir deputados estaduais e vereadores de serem nomeados secretários de estado, secretários municipais e conselheiros do Tribunal de Contas do Estado. Isso está longe de ser nepotismo cruzado. Em relação a esse assunto específico, a proposta cita apenas na exposição de motivos feita pelo governador que a emenda "visa também a evitar a burla das disposições, mediante investidura recíproca entre os Poderes do estado, municípios e das instituições do Ministério Público e Tribunal de Contas do Estado, pela indicação dos agentes públicos daquelas pessoas com laços de parentesco". Ou seja, a emenda do governo não proíbe o nepotismo cruzado.
Mas essa proibição foi o argumento usado pelo governo para derrubar a emenda do Legislativo. O que houve então?
Ou o governo se esqueceu de colocar na sua proposta ou tenta confundir a opinião pública porque, em lei, vale o que está escrito. Se queria proibir o nepotismo cruzado, a emenda teria que impedir o próprio governador de nomear parentes em outros poderes, assim como os promotores, juízes, desembargadores, conselheiros, prefeitos, enfim, todos os agentes públicos. Em nenhum momento, porém, a proposta do governo proíbe o nepotismo cruzado do Poder Judiciário para o Executivo e vice-versa, do Executivo para a Assembléia, do Tribunal de Contas para o Judiciário e assim por diante. Essa proposta calcada em cima do nepotismo cruzado é um grande engodo. A nomeação de secretários, inclusive, é prerrogativa só do governador e é de livre escolha. Além disso, o governador Requião jamais se sujeitaria à pressão da Assembléia para nomear um deputado ou parente de deputado. Então, para que uma lei?
Sua conclusão é de que a emenda do governador não tem o alcance divulgado?
Esse argumento caiu por terra no dia em que o próprio governo tratou de divulgar que seria impossível votar novamente a proibição do nepotismo porque seria inconstitucional. O governo agiu de forma deliberada para derrubar a emenda do deputado Tadeu Veneri e acredito que alguns parlamentares que votaram contra possam ter sido induzidos a erro.
Como presidente da comissão, o senhor defende que a emenda seja votada mesmo diante desse impasse jurídico?
Minha opinião é pessoal e minoritária. O artigo 60 do parágrafo 5.° da Constituição estabelece que não será admitida nova proposta sobre o mesmo tema de emenda constitucional rejeitada no mesmo ano. Ocorre que a emenda de autoria do governador foi apresentada antes da derrubada da emenda do deputado Tadeu Veneri. Como a proposta chegou à Assembléia antes, não se trata de uma nova proposta, apesar do teor semelhante a que já tramitava. Em tese, pode ser discutida e votada. Esse é o entendimento também da procuradoria jurídica da Casa. O mesmo não ocorre em relação à proposta dos deputados do PMDB sobre o mesmo tema, porque foi apresentada após a rejeição da emenda do Legislativo. Essa sim seria uma nova proposta sobre a mesma matéria já rejeitada. Apesar de ter sido apresentada no mesmo dia da derrubada da emenda, não havia sido publicada e, portanto, não estava tramitando oficialmente.
A comissão acredita que vai ser possível esclarecer essas dúvidas contratando um advogado especialista em Constituição?
Temos que contratar um constitucionalista para respaldar o encaminhamento dado pela comissão especial. Até porque se cometermos qualquer irregularidade corremos o risco de ter que suspender a tramitação se a matéria for alvo de mandado judicial.
Esse parecer estará pronto quando?
Temos um entendimento com Hermas (Brandão) de contratarmos esse parecer na terça-feira. Para isso, já providenciamos todas as emendas e subemendas, o processo legislativo, os registros das votações e o mandato de segurança impetrado no dia da votação pelo Rafael Greca (PMDB) e pelo governo para suspender a sessão. Todo esse material será encaminhado ao constitucionalista.
Dependendo do parecer, a comissão poder decidir não votar a emenda?
Com certeza, o parecer vai ter uma influência muito grande. É claro que a comissão é soberana para decidir, mas o que não podemos fazer é agir com emoção nem motivação política. A comissão vai se portar tecnicamente, até porque no plenário, durante a votação, já ficou clara a posição dos parlamentares em relação ao nepotismo. Não podemos agora criar uma falsa expectativa na sociedade. Se a matéria for legal nós podemos votar, se for ilegal não adianta levar à discussão porque se a prática for proibida por lei e não tiver respaldo jurídico vai ser derrubada na Justiça. Nesse caso, a votação serviria tão somente para que alguns, que são favoráveis à prática do nepotismo, ficassem em posição cômoda porque poderiam mudar o voto e reverter o desgaste político que sofreram ao derrubar a emenda. Não podemos ter a preocupação de crucificar nenhum parlamentar nem agentes de governo que defendem o nepotismo, muito menos, tentar salvá-los perante a opinião publica por se tratar de ano eleitoral. É uma decisão difícil.
O texto original do governo vai sofrer muitas modificações?
Os deputados apresentaram várias emendas. Nós, da bancada da oposição, defendemos que a lei comece a vigorar imediatamente e não só em 2007, como propõe o governo. Além disso, estende a proibição da contratação de parentes para a administração indireta estadual e municipal. A mensagem do governo só vale para a administração direta e não abrange autarquias e empresas de economia mista. A bancada do PMDB transformou sua proposta de acabar com o nepotismo em emenda. Existe ainda outra sugestão ampliando a proibição para parentes até terceiro grau, o que alcançaria sobrinhos de entes públicos. A proposta do governo é destinada a familiares até segundo grau. Vamos fazer uma análise e discutir o que incorporar no substitutivo geral.
Existe um prazo para concluir esse substitutivo?
Não, a comissão não pode atropelar a tramitação. Vou sugerir ao presidente, inclusive, que o prazo para os trabalhos, que geralmente gira em torno de 20 dias, comece a correr só após o parecer sobre a constitucionalidade da emenda.
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