Pouco mais de dois anos e meio após ser demitida da Casa Civil em meio a denúncias de tráfico de influência, a ex-ministra Erenice Guerra tem defendido interesses de grandes multinacionais que buscam conquistar negócios junto ao governo federal, inclusive em obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). O escritório Guerra Advogados, do qual ela é sócia, está representando empresas do setor de energia. Erenice era consultora jurídica do Ministério de Minas e Energia quando a presidente Dilma Rousseff era titular da pasta.
Ex-braço-direito de Dilma, de quem foi secretária-executiva na Casa Civil no governo Lula, Erenice assumiu o comando da pasta quando a petista saiu para disputar a Presidência em 2010. Com essa experiência na administração pública e uma rede de contatos no governo federal, Erenice foi contratada pela multinacional Isolux Corsán, com sede na Espanha. Ela atua, por exemplo, em processo administrativo na Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) para rever as condições da concessão de trecho de linhas de transmissão de Tucuruí, sob controle da empresa espanhola.
A Isolux afirmou que contratou o Guerra Advogados e outros dois escritórios de advocacia de Brasília "com atuação administrativa junto à Aneel, para a discussão e o encontro de soluções em relação ao reequilíbrio econômico-financeiro do contrato de concessão de linhas de transmissão Linhão de Tucuruí".
Na França, está o controlador de outro megaempreendimento do setor elétrico com a participação de Erenice, segundo fontes credenciadas do setor. A ex-ministra atua na disputa de bilhões de reais entre as usinas de Jirau e Santo Antônio pela alteração do nível do Rio Madeira, duas obras do PAC. Ela prestaria consultoria para a Energia Sustentável do Brasil (ESBR), que administra Jirau. A ESBR, que é controlada em 60% de suas ações pela francesa GDF Suez, disse que não se pronuncia sobre o tema da reportagem.
Segundo políticos que atuam na área de energia, Erenice também está intermediando a negociação para venda de ativos da Petrobras na Argentina. E trabalhando para o grupo argentino Indalo, que fez uma oferta de compra. Procurado, o grupo Indalo não se manifestou. Já a Petrobras disse, em um primeiro momento, que não comentaria o assunto. Duas horas e meia depois, informou desconhecer qualquer ligação de Erenice com o grupo Indalo e esse tema.
Erenice não retornou as ligações da reportagem. Nenhuma das empresas citadas negou relação com ela ou com o escritório dela quando procuradas.
DenúnciasPessoas ligadas à ex-ministra teriam cobrado para facilitar empréstimos
Em meio a denúncias de tráfico de influência, o então presidente Lula demitiu Erenice Guerra da Casa Civil, em setembro de 2010, temendo que o escândalo afetasse a candidatura Dilma. O estopim foi a acusação de em empresário de que Israel Guerra, filho da ministra, teria cobrado R$ 450 milhões para ajudá-lo a liberar um empréstimo no BNDES. E que o ex-diretor dos Correios, Marco Antonio de Oliveira, ligado a Erenice, pedira ao empresário doação de R$ 5 milhões para cobrir despesas de campanhas petistas. Todos negaram as acusações. No governo, Erenice ainda empregou parentes, como o irmão e o filho. Em 2012, a Justiça Federal arquivou inquérito contra ela e seus parentes. Já a CGU encontrou irregularidades em contratos firmados entre órgãos do governo e organizações ligadas a parentes dela.