Protestos em quatro cidades
Entidades estudantis promovem na manhã de hoje protestos em Curitiba, Guarapuava, Londrina e Maringá contra as denúncias de contratações de funcionários fantasmas na Assembleia paranaense. O movimento Caça-Fantasmas espera reunir cerca de 2 mil pessoas nas quatro cidades.
O rombo nos cofres da Assembleia Legislativa do Paraná (AL) pode ultrapassar R$ 100 milhões. A estimativa é do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), braço do Ministério Público Estadual (MP) que investiga as denúncias de desvio de dinheiro feitas na série de reportagens "Diários Secretos", da Gazeta do Povo e da RPCTV. A estimativa foi feita com base no montante comprovadamente já desviado (cerca de R$ 26 milhões) e em indícios levantados nas investigações que ainda estão curso.
Os promotores do Gaeco apresentaram ontem uma segunda denúncia oficial à Justiça sobre o esquema de corrupção no Legislativo. Treze pessoas foram acusadas de desviar R$ 13,2 milhões (valor não corrigido) da Assembleia entre eles o ex-funcionário comissionado da Casa Daor Afonso Marins de Oliveira e nove parentes dele. Todos recebiam salário pago pela Assembleia, mas nunca deram expediente no Legislativo. Daor Oliveira está foragido da Justiça.
Os promotores denunciaram ainda três ex-diretores da Casa que estão presos: Abib Miguel (diretor-geral), José Ary Nassiff (administrativo) e Cláudio Marques da Silva (de pessoal). Bibinho, como o ex-diretor-geral é conhecido, e Daor Oliveira foram denunciados por cometer 894 vezes o crime de desvio de dinheiro público (peculato). O mesmo crime teria sido praticado 382 vezes por Nassiff e Marques da Silva uma vez para cada salário depositado na conta bancária de um fantasma ou laranja do esquema.
Além do desvio de verba pública, os quatro foram denunciados por formação de quadrilha, falsidade ideológica e lavagem de dinheiro. Se forem condenados, podem pegar, cada um, pena de prisão de 66 a 342 anos a legislação brasileira, porém, só permite que uma pessoa fique na cadeia 30 anos no máximo.
Esfera judicial
A juíza Ângela Regina Ramina de Lucca, da 9.ª Vara Criminal de Curitiba, deve se manifestar nos próximos dias se aceita ou não a denúncia do MP. A magistrada recebeu no início deste mês outra denúncia do Gaeco envolvendo os três ex-diretores, o funcionário da Assembleia João Leal de Mattos e sete familiares dele todos fantasmas. Esse núcleo da família Mattos foi denunciado por desviar R$ 13 milhões (não corrigidos).
Nesta primeira denúncia, Bibinho foi acusado de cometer 1.182 vezes o crime de peculato. Somando as duas denúncias, o MP já comprovou que foram desviados R$ 26 milhões (valor não corrigido). Abib Miguel, de acordo com o MP, cometeu o crime de peculato 2.076 vezes. Se a condenação for máxima, Bibinho pode ser sentenciado a 636 anos de prisão.
A denúncia apresentada ontem pelo MP relata que a organização criminosa chefiada por Bibinho agia desde pelo menos 1994 para desviar dinheiro das contas dos fantasmas e laranjas para uma fazenda de sua propriedade. A investigação identificou transferências de pelo menos R$ 115 mil dinheiro que saiu da Assembleia para a propriedade do ex-diretor.
Dentro da quadrilha, Abib Miguel era a pessoa com poder de contratação e demissão de servidores. Todos esses atos, porém, eram assinados pelo presidente e pelo primeiro secretário da Casa. As denúncias recaem sobre as gestões do atual presidente Nelson Justus (DEM) e dos ex-presidentes da Casa Hermas Brandão (PSDB), Caíto Quintana (PMDB), Aníbal Khury (PFL, já falecido) e Orlando Pessuti (PMDB). Nenhum deles, porém, foi denunciado pelo MP.
No esquema, Nassiff era quem viabilizava meios para que os funcionários fantasmas escolhidos fizessem parte do quadro de pessoal da Assembleia, enquanto que Marques Silva colocava os servidores fantasmas na folha de pagamento da Casa possibilitando o pagamento de salários. Um detalhe curioso da denúncia é que o MP comprovou que, por quatro vezes, a Assembleia contratou oficialmente servidores após eles já estarem recebendo do Legislativo o que caracteriza crime de falsidade ideológica.
Com a garantia da contratação e pagamento de salários, Abib Miguel passou a nomear amigos, parentes e até empregados em cargo comissionado na Assembleia.
É o caso do corretor de imóveis Daor Oliveira, que conhece Bibinho há mais de 30 anos. Os promotores relatam na denúncia que Oliveira oferecia emprego aos parentes e solicitava os documentos pessoais para efetivar a contratação e a abertura de contas. Quando os parentes cobravam o emprego na Assembleia que Oliveira havia prometido, a quadrilha passava a pagar a eles de R$ 300 a R$ 800 para mantê-los quietos.
Os dois filhos de Daor Oliveira, Maurren e Marlon Oliveira, eram quem auxiliavam no contato com os parentes em troca de dinheiro. O casal de filhos de Daor Oliveira foi denunciado por formação de quadrilha e desvio de dinheiro ele teria desviado recursos do Legislativo 115 vezes e ela, 59.
Dez familiares de Oliveira (veja quadro) foram contratados. Pelas contas bancárias deles a Assembleia depositou R$ 13 milhões. Mas esse rombo envolvendo a família Oliveira pode ser ainda maior. O promotor Denílson Soares de Almeida explicou que há provas de que a Assembleia pagou mais de um salário para alguns desses familiares. "Há casos em que esses servidores tinham mais de uma conta. Ou então, usavam o nome de solteiro e de casado para receber em duplicidade", disse.
O garçom Pierre Gbur e o irmão Alessandro sobrinhos de Daor em depoimento declararam ter recebido dinheiro das mãos de Abib Miguel dentro do gabinete da diretoria-geral. Em 2006, eles teriam percebido o uso da conta bancária e passaram a receber dinheiro em troca do silêncio: R$ 300 para Alessandro e R$ 600 para Pierre. Mas, segundo o MP, pelas contas bancárias deles foram movimentados R$ 2,2 milhões.
Outro lado
O presidente da Assembleia, Nelson Justus (DEM), não quis comentar a denúncia do MP. A diretoria de comunicação da Casa informou que as irregularidades estão sendo apuradas por uma sindicância interna do Legislativo.
O advogado Alessandro Silvério, que defende Bibinho, disse que não comentaria a denúncia. Rogério Botelho, advogado de Nassiff, não retornou as ligações da reportagem. E a advogada de Cláudio Marques, Mariel Muraro, não foi encontrada. A reportagem ainda tentou contato com Daor Oliveira, mas o celular dele estava desligado.
Veja todas as denúncias feitas pelo jornal Gazeta do Povo e pela RPCTV sobre os Diários Secretos da Assembleia Legislativa.
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