Nossa opinião
Pressão e diálogo
As manifestações populares em favor de investigações eficazes na Assembleia Legislativa são importantes para que se mostre a inexistência de apatia por parte da sociedade. A derrubada de um portão da Assembleia, porém, ativou um sinal de alerta, pois, poderia ter sido o início de um conflito físico entre manifestantes, seguranças e autoridades policiais. Mas não foi. E nem deverá ser, caso o movimento "Caça-fantasmas" não queira perder sua legitimidade. Até porque, num Estado Democrático de Direito, a política é a substituta da força.
Manifestantes afirmam que os portões estavam fechados como forma de impedi-los a entrar na Assembleia. A direção da Casa afirma que o portão derrubado sempre esteve fechado. Não cabe aqui apontar quem tem razão. O comportamento de ambos deve se pautar pelo espírito democrático. A Casa do Povo deve permanecer aberta para as manifestações. E, como contrapartida, as manifestações devem ser pacíficas. A democracia se realiza por meio de pressões, negociações e diálogo.
Em um novo discurso no plenário da Assembleia Legislativa ontem, o deputado estadual Jocelito Canto (PTB) voltou a falar sobre o uso de caixa 2 nas campanhas políticas. Na terça-feira, Canto comentava a demissão dos 1,9 mil funcionários comissionados da Assembleia, anunciada no dia anterior, e decidiu abordar a arrecadação de dinheiro para campanha. "Quem é que não tem caixa 2? Vamos ser sinceros", perguntou, em discurso na tribuna do plenário. Nenhum deputado contestou.
Canto foi cobrado por eleitores pelas declarações dadas na Assembleia. Pelo Twitter, o deputado comparou a prática a comprar produtos sem nota fiscal e disse que "a grande maioria das pessoas tem um caixa 2. Quem nunca comprou algo sem nota? E do Paraguai, você nunca comprou nada? Caixa 2 do dia a dia", disse o deputado.
Ontem, o deputado voltou a tocar no assunto em plenário. Amenizou alguns pontos da polêmica, declarando, por exemplo, que a maioria (e não mais todos) os políticos faz caixa 2, mas esquentou ainda mais outros aspectos da discussão. Disse que o caixa 2 é normal na vida pública e que todos veem mas não conseguem provar o crime. "Está presente em todas as eleições", afirmou.
"O caixa 2 é invisível. Ganha eleição. É mais forte que os recursos oficiais recebidos. Quem é que paga essas equipes de 50 pessoas que viajam pelo estado?", indagou. Em entrevista à imprensa, garantiu que não tem caixa 2, mas disse que já recebeu "doações". Para Canto, que defendeu a permanência de Nelson Justus na presidência da Assembleia, somente o afastamento dos 54 deputados seria uma forma justa de penalizar todos os responsáveis pelos escândalos.
Polêmica
Nos bastidores, os parlamentares se diziam surpresos com a atitude de Canto e também preocupados com a repercussão que as declarações poderiam ter. A reação mais visível foi do deputado estadual Reni Pereira (PSB). Ele afirmou que há pessoas pegando carona nas denúncias envolvendo a Assembleia numa tentativa de se promover. "Ninguém aqui é mais ou menos deputado que ninguém. Quem fala, que prove o que está falando. Todos temos as nossas diferenças, inclusive na maneira de fazer política. Fazer insinuações é fácil. Eu renuncio ao meu mandato se alguém provar que fui incriminado", declarou.
Para o deputado Tadeu Veneri (PT), Canto fala com conhecimento de causa. Para o petista, uma forma de identificar o caixa 2 seria o comparativo entre campanhas eleitorais. As mais vistosas, certamente, teriam mais recursos. Veneri também comentou o segundo assunto mais falado pelos deputados ontem: a manifestação. Para ele, os protestos vindos do engajamento social são essenciais porque a sociedade não pode ficar ao lado do que está acontecendo na Assembleia. E sobre os eventuais exageros, o parlamentar destacou que em cenários como o de ontem, geralmente a situação foge de controle. "E temos coisas muitíssimo mais graves aqui dentro do que a derrubada de um portão", disse.
Veja todas as denúncias feitas pelo jornal Gazeta do Povo e pela RPCTV sobre os Diários Secretos da Assembleia Legislativa.