Fachada da Assembleia Legislativa: diários oficiais escondiam servidores fantasmas e parentes de autoridades| Foto: Antonio More/ Gazeta do Povo

MP ainda procura as decisões ocultas

O Ministério Público Estadual (MP) ainda procura documentos referentes aos 400 atos oficiais da Assembleia Legislativa do Paraná que não foram encontrados. Sabe-se da existência deles principalmente porque havia referências na pasta de registro de atos e em fichas funcionais apreendidas pelo MP na diretoria de pessoal do Legislativo.

A nova direção da Assembleia, que tomou posse em fevereiro, informou que está tendo problemas com a desorganização. "Simplesmente alguns documentos não existem. Não conseguimos até o momento comprovar se há algumas ilegalidades em efetivação ou aposentadoria, porque não tivemos como consultar alguns documentos. Arquivos de computador simplesmente foram apagados", declarou o presidente da Assembleia, Valdir Rossoni, na semana passada. Uma perícia nos equipamentos da Casa para verificar se arquivos foram danificados está sendo avaliada.

Além disso, a Assembleia reconheceu formalmente a existência de atos oficiais que nunca vieram a público. Em documento encaminhado ao MP, o Legislativo apresentou uma relação de 158 decisões que jamais foram publicadas nos Diários Oficiais da Casa. Diante de uma solicitação do Ministério Público, que requeria cópias de uma série de atos, acompanhadas da comprovação de publicação, o Legislativo se viu obrigado a reconhecer que alguns documentos jamais foram divulgados.

No documento em que admite os atos secretos, o Legislativo informa que encontrou nos arquivos digitais 45 atos assinados que não foram publicados, e que 90 foram localizados apenas nos computadores – sem assinatura e sem pu­­­blicação. Há ainda 4 atos que fo­­­ram publicados no Diário Oficial, mas que não existem cópias do original. E outros 19 atos simplesmente não podem ser comprovados – não existem originais ou pu­­­blicações. Todos esses documentos são do período entre 2003 e 2009, quando estiveram no co­­­mando da Assembleia os deputados Hermas Brandão e Nereu Moura, como presidente e primeiro-secretário, respectivamente, e depois Nelson Justus e Alexandre Curi.

Símbolo

A nomeação de Jermina Leal, que virou um símbolo das irregularidades mostradas pela série Diários Secretos, ainda é um ato secreto. O nome da agricultora semianalfabeta de Cerro Azul, no Vale do Ribeira, não apareceu nos diários da Assembleia nos últimos anos, nem foi publicado no Diário Oficial do Estado, que em tese deveria republicar (ou publicar pela primeira vez) todos os atos de investidura de funcionários dos últimos cinco anos do Legislativo.

Assim como o caso de Jermina, nomeações e exonerações de pelo menos outros 30 funcionários fantasmas mostrados na série Diários Secretos ainda continuam em sigilo. (KK e KB)

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Saiba como foi a manobra dos atos não publicados no Diário Oficial
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Exatamente um ano após o início da publicação da série de reportagens Diários Secretos, produzida pela Gazeta do Povo e pela RPC TV, ainda não foi possível desvendar todos os segredos escondidos há décadas na Assembleia Le­­gislativa do Paraná. Os Diários Oficiais da Casa vieram à tona, mas pelo menos 400 atos ainda permanecem sigilosos.

A situação é agravada pela desordem nos documentos que foram encontrados no Legislativo desde então e até pelas suspeitas de sumiço deliberado de papéis e arquivos de computador.

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Contudo, muito do que se tentava esconder já foi desvendado. O conteúdo de 1,7 mil atos oficiais, que se tornaram públicos ao longo dos últimos 12 meses, revela a contratação de funcionários fantasmas, de parentes de políticos, de apadrinhados de pessoas influentes e de gente que até então não constava em nenhum documento como servidor da Assembleia.

Em reportagem publicada em março do ano passado, a Gazeta do Povo demonstrou que ao menos 2.178 atos oficiais dos anos de 2006 a 2009 não haviam sido divulgados. Mesmo reunindo todos os Diários Oficiais numerados do período, a equipe de reportagem detectou que a sequência numérica falhava (veja gráfico ao lado). A maioria dos 2 mil atos secretos estava em diários avulsos. Segundo apontou o Ministério Público Estadual, essas edições não numeradas dos Diários Oficiais foram conscientemente idealizadas para tentar legitimar atos oficiais sem, contudo, torná-los efetivamente públicos.

A Gazeta do Povo e a RPC TV conseguiram ter acesso a 14 edições de diários avulsos que traziam movimentação de funcionários. Mas a apreensão de documentos na Assembleia – promovida pelo Ministério Público com autorização judicial, em maio de 2010 – revelou que mais 18 diários avulsos com nomeações e demissões foram fabricados no mesmo período de três anos. Aproximadamente 1,7 mil dos 2.178 atos considerados secretos estavam nessas edições não numeradas, não arquivadas e inacessíveis para consulta do público. Essa prática permitia à Assembleia ocultar decisões administrativas que não queria que se tornassem públicas.

Um exemplo de que os diários avulsos eram usados conscientemente para esconder atos oficiais (e para conseguir provar que medidas foram tomadas, caso houvesse questionamento) é que duas edições não numeradas foram fabricadas logo após a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que proibiu a contratação de parentes de políticos em todo o país, em agosto de 2009. Os dois diários trazem o nome de 18 familiares de deputados que perderam os cargos em função da súmula antinepotismo do STF. Tais exonerações eram tidas como atos secretos e não chegaram ao conhecimento público até que os diários avulsos foram apreendidos na gráfica da Assembleia. Ou seja, o Legislativo procurou esconder da sociedade a prática de nepotismo na Casa.

Entre as decisões oficiais até então escondidas estão muitas contratações de funcionários que nunca efetivamente trabalharam. A grande maioria dos 48 fantasmas mostrados na série Diários Secretos teve a nomeação publicada em edições avulsas que não foram encontradas pela reportagem. Era por meio principalmente de fantasmas que, segundo o MP, uma quadrilha instalada na As­­­sembleia conseguiu desviar pelo menos R$ 100 milhões dos cofres públicos por meio do pagamento de salários a quem não trabalhava.

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As contratações de apadrinhados de juízes, desembargadores, promotores e conselheiros do Tribunal de Contas também estavam no lote de atos secretos publicados em diários avulsos inacessíveis à sociedade.