Dilma Rousseff completa um mês na Presidência bem mais econômica que seu tutor, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, nas aparições e declarações públicas. Contudo, a discrição adotada por ela, e cobrada dos ministros, ainda deixa muitas dúvidas sobre a linha política da presidente e de seu governo.
No primeiro mês no poder, Dilma enfrentou insatisfações políticas do PMDB e de outros aliados, além de uma queda-de-braço com as centrais sindicais a respeito do valor do salário mínimo, atiçada principalmente por aliados. Tratou de apagar incêndios e deixou para depois o que não dava para ser resolvido imediatamente.
Especialistas, aliados e até adversários elogiam o "estilo Dilma", bem mais discreto que seu antecessor, mas também apontam necessidade de mudanças na condução das alianças políticas.
A relação da presidente com sua ampla base de apoio no Congresso sofreu os primeiros arranhões, e o maior partido da coalizão, o PMDB, pressionou Dilma contra a substituição de seus indicados no segundo escalão.
A petista teve que suspender as nomeações até que os congressistas voltassem aos trabalhos na abertura do Congresso, com os presidentes das Casas eleitos.
O líder do PMDB na Câmara, Henrique Alves (PMDB-RN), foi um dos que verbalizou o descontentamento dos peemedebistas com o tratamento que recebiam do governo. Ele chegou a, veladamente, indicar dificuldades para aprovação do valor salário mínimo proposto pelo Executivo, então de 540 reais, caso o partido não fosse melhor atendido.
Agora, ao falar sobre o primeiro mês de Dilma ele transforma o que eram críticas em elogios. "Ela tem agido com discrição, determinação e personalidade. Não tem deixado nenhum assunto de lado. Tem assumido todas as responsabilidades inerentes ao cargo", disse o peemedebista.
Mas o líder do DEM no Senado, José Agripino Maia (DEM-RN), viu falta de habilidade política da presidente ao lidar com os aliados.
"Politicamente, ela trombou seguidas vezes com o principal partido aliado, o PMDB. E a relação ficou comprometida. Ela não soube estabelecer o diálogo com o principal aliado. E isso vai ter desdobramentos", argumentou.
A base aliada será um problema para Dilma no governo, na avaliação do líder do PSDB no Senado, Álvaro Dias (PSDB-PR). "Ela vai ter dificuldade para combinar uma gestão eficiente com tantas indicações políticas incompetentes e ineficazes", disse.
O cientista político, David Fleischer, da Universidade de Brasília (UnB), no entanto, considera que, apesar da pressão, Dilma agiu bem com o PMDB e não deixou a tensão aumentar.
"Ela foi esperta com o PMDB e evitou aquilo que aconteceu na época do Severino", analisou, lembrando quando Lula perdeu o controle da base aliada, e o deputado Severino Cavalcanti (PP-PE) chegou ao comando da Câmara.
"Cobra mais, fala menos de política"
O perfil mais discreto também se aplica à gestão dos ministérios. Ao contrário de Lula, que preferia reunir todos os ministros para ouvir de cada um opiniões sobre os rumos que o governo e quais deveriam ser as prioridades, ela avisou na primeira reunião ministerial que raramente reuniria novamente toda a equipe.
Dilma dividiu o governo em quatro grandes áreas e nomeou um coordenador para cada uma delas. A ministra do Planejamento, Miriam Belchior, ficou responsável por Infraestrutura e PAC. Guido Mantega, da Fazenda, vai coordenar as ações de Desenvolvimento Econômico. Tereza Campello, do Desenvolvimento Social, será gerente das ações Erradicação da Miséria. E o ministro Gilberto Carvalho, da Secretaria-Geral, assumiu o comando das iniciativas do Direito à Cidadania.
Dilma cobrará desses "gerentes" resultados e com eles se reunirá mais frequentemente.
Para o ministro do Trabalho e Emprego, Carlos Lupi, que trabalhou com Lula e se manteve no cargo, a substituição da reunião ministerial por reuniões setoriais é um avanço. "Ela percebeu que era impossível realizar uma reunião com 37 ministros. Eram intermináveis e sem resultado", comentou.
Também diferente do antecessor, que em quase todas as reuniões mantinha algum assessor na sala, Dilma prefere que apenas os ministros chamados permaneçam no gabinete e, por vezes, os orienta a não fazer comentários à imprensa.
"As reuniões com ela são mais objetivas. Ela cobra mais números, fala menos de política. A conversa tem mais resultado", disse Lupi.
O estilo discreto, quase silencioso, de Dilma se confirma na comparação das agendas dela e de Lula, considerando as primeiras semanas dos dois no poder.
Diferenças
Nos primeiros 30 dias de seu primeiro mandato, Lula discursou sete vezes, viajou a três países, lançou um programa de governo, o Fome Zero, fez uma reunião ministerial no segundo dia de governo e viajou pelo país três vezes. Quando completou uma semana no cargo, o ex-metalúrgico levou 30 ministros para conhecer comunidades pobres no Piauí e em Pernambuco.
Dilma completa o período com uma viagem internacional, à Argentina, quatro breves deslocamentos pelo país, um deles sem planejamento prévio, após a forte chuva que atingiu a região serrana do Rio de Janeiro e desabrigou milhares de famílias e deixou mais de 800 mortos. A presidente discursou em apenas duas oportunidades, em cerimônias em homenagem ao ex-vice-presidente José Alencar e a vítimas do Holocausto. Em ambas, sem tocar em temas relacionados ao governo.
A reação da presidente em relação à primeira catástrofe de seu mandato, no entanto, foi mais rápida do que o antecessor costumava ter.
Lula preferia esperar as dores das tragédias naturais assentarem para visitar ou sobrevoar o lugar atingido. Isso levava dias. A presidente não deu esse tempo. Logo no dia seguinte à enxurrada viajou para o Rio, levou os ministros, vestiu galochas e o colete da Defesa Civil para ver de perto o estrago das águas.
Para Fleischer, Dilma não quer ser como Lula, que falava demais e, às vezes, cometia gafes e erros políticos com as declarações públicas exageradas.
"Dilma está propositalmente aparecendo menos para aos poucos ir se distanciando do Lula", avalia. "A Dilma está começando e não quer cometer erros."
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