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Quando os indícios de corrupção se tornam graves demais para serem varridos para debaixo do tapete, os políticos precisam lançar mão de estratégias para enfrentar a opinião pública e minimizar os danos de um caso potencialmente devastador para suas carreiras. De acordo com o cientista político da Universidade Federal de São Carlos Fernando Azevedo, quase todas essas estratégias acabam sendo a mesma: tentar negar a todo custo algo que, muitas vezes, está comprovado. "O cardápio das estratégias é variado, mas elas se resumem à negação do fato", comenta.

Segundo a coordenadora do Núcleo de Opinião da Universidade Estadual Paulista (Unesp), Célia Retz, a comunicação com o público chega a ser mais importante para os políticos do que a própria agenda. De acordo com ela, em situações de crise, os homens públicos precisam criar um ambiente amistoso com seu eleitor para conseguir ser ouvido. Por isso, várias estratégias passam ou por tentar humanizar sua própria imagem, para facilitar sua conexão com o público, ou por demonizar seus acusadores, para dificultar a conexão do público com quem faz as denúncias.

Uma das principais "vítimas" desse fenômeno é a imprensa. Como os veículos de comunicação amplificam o alcance das denúncias, a estratégia de muitos políticos é acusar veículos e induzir o público a pensar que a mídia o persegue. Por vezes, sobram ataques até ao direito da imprensa se manifestar sobre esses casos. "A liberdade de imprensa é um dos pilares da democracia. A mídia tem de ter autonomia para fazer suas investigações e críticas", frisa o cientista político da Universidade Federal do Paraná Ricardo Oliveira.

O resultado dessas inúmeras estratégias para mascarar desvios acaba sendo devastadora para o universo político. Se atos de corrupção não fazem bem à imagem de um político, as explicações, aliadas à impunidade, acabam afetando a credibilidade de toda a classe. "Cada vez que explode um escândalo desse tipo, a tendência é que a população acredite que todos os políticos são a mesma coisa", afirma Azevedo.

Deslegitimar a imprensa

Uma das formas de defesa mais comuns dos políticos é deslegitimar os veículos de comunicação que denunciaram seus crimes, e se colocar como vítimas de perseguição. Foi o que o vereador João Cláudio Derosso (PSDB) fez ao se defender das acusações de ter cometido irregularidades no comando da Câmara de Vereadores de Curitiba. "De nada adiantam meus esforços de procurar esclarecer, através dos meios de comunicação, a realidade e a verdade dos fatos, se a cada dia me julgam e me condenam", declarou, em discurso à Câmara. "É um comportamento antidemocrático, já que a imprensa apenas cumpre seu papel de tornar públicos esses fatos", comenta o cientista político da UFPR Ricardo Oliveira.

Ficar em silêncio

Quando as acusações se tornam graves e os indícios, difíceis de serem negados, muitos preferem evitar aparecer na imprensa e simplesmente não se manifestar sobre o assunto. Foi a saída encontrada pelo ex-ministro-chefe da Casa Civil Antônio Palocci (PT), ao ser acusado de enriquecimento ilícito. Em vez de se defender, o ex-ministro se manteve calado, e só veio a público explicar seus negócios semanas depois do escândalo eclodir. Não adiantou: logo depois, ele acabou sendo forçado a renunciar. "Para se reportar ao público, o político tem de estar muito bem preparado. Quando a mídia tem elementos que o acusado desconhece, como documentos e gravações, uma eventual contradição pode impactar em sua reputação", comenta a coordenadora do Núcleo de Opinião Unesp, Célia Retz.

Pedir investigação

Acuados por indícios claros de irregularidades, simplesmente negar as acusações pode não ser o suficiente: pedir para que a Justiça abra investigação e dizer que sua vida é um livro aberto pode reverter o jogo para o político acusado. Foi a atitude do então prefeito Beto Richa (PSDB), em 2009, quando vídeos que apontavam irregularidades em sua campanha eleitoral do ano anterior vazaram para a imprensa. "Quero que investiguem minha prestação de contas de campanha, minha vida pessoal e a minha administração da prefeitura. Meus adversários estão querendo desconstruir minha honra e isto não vou permitir", comentou, à época. "Isso é pirotecnia pura. O político diz ‘abra meu sigilo telefônico, fiscal, bancário’, mas se há mal feito, ele não vai usar o seu próprio telefone, nem declarar dinheiro desviado em seu imposto de renda", comenta o cientista político da UFSCar Fernando Azevedo.

Apelar para a família

Uma das formas de despertar a empatia da população é tentar humanizar a própria imagem. Demonstrar amor à família é uma das estratégias possíveis, já que apela para os valores mais íntimos do eleitor. Foi o que fez o senador Alfredo Nascimento (PR), ao se defender de acusações de corrupção no comando do Ministério dos Transportes – incluindo um aumento de 86.000% na renda de seu filho. "Mentira! O meu filho não é ladrão. Eu vou provar, porque tenho toda a documentação. Eu vou buscar a correção dessa injustiça que cometeram com meu filho", bradou. "A comunicação é mais eficiente quando se está em concordância com o interlocutor", comenta Célia Retz. "A consonância é importante porque o público tende a aceitar melhor as explicações". Ao falar de sua família, o político cria esse ambiente amistoso com o eleitor.

Partir para o contra-ataque

O maniqueísmo pode ser uma forma de defesa para um político acuado. Ao ser acusado de alguma irregularidade, uma saída pode ser deslegitimar o acusador e esperar que o público enxergue uma disputa de "bem" e "mal" na situação. Foi a primeira saída escolhida pelo prefeito de Londrina, Barbosa Neto (PDT), para defender sua esposa das acusações de participação em esquema de desvio de dinheiro. "Isso é uma covardia daqueles que estão presos e envolvidos em outros escândalos políticos. Esse cidadão [o acusador, Marcos Ratto], inclusive, tinha de ser processado por falsidade ideológica, pois se faz passar por enfermeiro sem ter curso superior. O sobrenome dele já diz quem é a pessoa", comentou. "Quebrar a credibilidade do oponente é uma técnica antiga do discurso e da argumentação", afirma Célia Retz.

Insinuar interesses políticos

Colocar-se no papel de vítima do grupo político oposto é uma das estratégias mais populares entre pessoas públicas acusadas de irregularidades. Ao mesmo tempo em que se defende, o político aproveita e coloca em questão a credibilidade dos opositores. Foi a estratégia usada pela ex-ministra-chefe da Casa Civil Erenice Guerra quando foi acusada de tráfico de influência; em sua defesa, atribuiu a denúncia a interesses eleitoreiros da oposição. "Não desejo nem para o pior dos meus inimigos que ele venha a passar por uma campanha de desqualificação como a que se desencadeou contra mim e minha família. As paixões eleitorais não podem justificar esse vale-tudo", afirmou, em sua carta de demissão. "Ao se colocar no papel de vítima de uma perseguição, o político aplica uma estratégia de redução de dano", afirma Fernando Azevedo.

Admitir e entregar colaboradores

Quando a situação se torna insustentável e os indícios de irregularidade são incontornáveis, resta ao político tentar "sair por cima". Uma saída é aproveitar a oportunidade para entregar outros políticos corruptos e, assim, tentar, pelo menos, dividir o ônus da humilhação pública. Foi o que fez o então deputado Roberto Jefferson (PTB) em 2005: acuado por denúncias de corrupção, Jefferson revelou ao público o esquema do "mensalão", que envolvia políticos de vários partidos da base governista. "Para a opinião pública, o político aparece como alguém que ajudou a desvendar o crime. Mas é necessário muito cuidado para não ficar marcado como um ‘dedo-duro’", comenta Célia Retz.

Dizer que "todo mundo é assim"

Talvez esse seja o mais grave de todos. Para tentar evitar maiores danos em sua imagem, políticos, muitas vezes, declaram que suas ações, ou a ação de homens públicos a ele ligados, apenas repetem um padrão comum entre todos os políticos. Caso clássico desse tipo de saída foi quando o então presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, diminuiu a importância do escândalo do "mensalão", dizendo que houve "apenas" caixa 2, algo que "todo mundo faz". "Um dos efeitos a longo prazo é a redução da confiança da população na democracia. Quando há grandes escândalos, a população fica mais cética em relação ao próprio regime democrático", explica Fernando Azevedo.

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