O governo interino de Michel Temer (PMDB) começou há cerca de 20 dias e já enfrenta uma crise que assombrou a gestão de Dilma Rousseff (PT): suspeitas de irregularidades envolvendo integrantes do primeiro escalão. Em uma semana, dois ministros já se afastaram o governo Temer. Ambos foram pegos em gravações feitas pelo ex-presidente da Transpetro Sergio Machado, novo delator da Lava Jato.
No governo Dilma, foram sete ministros afastados nos nove meses iniciais do primeiro mandato.Todos caíram por suspeitas de corrupção. No caso da petista, a faxina foi usada a seu favor. Dilma conseguiu colocar a culpa nas indicações dos partidos da base e ganhar popularidade com as demissões. Por outro lado, acabou tendo ainda mais dificuldades com os partidos da base no Congresso devido às demissões.
Temer agora enfrenta desafio parecido. Precisa dar uma resposta à opinião pública, mas tem de evitar um enfrentamento com os partidos. Nesse caso, com o próprio PMDB. Primeiro a ser afastado, o senador e agora ministro licenciado do Planejamento, Romero Jucá (PMDB-RR) é um dos nomes fortes do partido. O segundo a deixar o cargo, o ex-ministro da Transparência, Fabiano Silveira, é apadrinhado do senador Renan Calheiros (PMDB-AL).
Troca de ministros
Nos dois casos, ataques a Lava Jato foram o motivo do afastamento do cargos. Nas gravações feitas Machado, Jucá afirma que a troca de comando no Governo Federal “estancaria a Lava Jato”. “Tem que mudar o governo pra poder estancar essa sangria”, disse.
Na última segunda-feira (23), Jucá pediu licença do Ministério do Planejamento por causa da repercussão das gravações. O ministro-chefe da Casa Civil Eliseu Padilha, porém, defendeu o peemedebista e disse que o governo perde com a decisão do senador de pedir licença do cargo.
O caso mais recente foi o de Fabiano Silveira, que deixou o cargo nesta segunda-feira (30). Nas gravações, Silveira criticava a Lava Jato e orientava investigados enquanto tinha um cargo de conselheiro do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), órgão que fiscaliza o poder Judiciário. Ele foi gravado por Machado na casa do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB). No áudio, Silveira diz que “os caras” da Procuradoria-Geral da República estão “perdidos” e dá dicas para Renan enfrentar as investigações.
O episódio envolvendo Silveira causou grande repercussão. Servidores do Ministério levaram vassouras água e sabão e “higienizaram” o prédio e até o gabinete do ministro pedindo sua saída. Líderes da Câmara e do Senado, inclusive da base aliada, também pediram a saída de Silveira do cargo. A ONG Transparência Internacional cobrou a exoneração. Michel Temer, porém, disse ter confiança no ministro e não quis demiti-lo.
Para o cientista políticos do Instituto Ibmec Marcio Coimbra, a saída encontrada por Temer para resolver a questão foi inteligente. “Em qualquer governo é melhor exonerar a pedido do que demitir, até pelo movimento político”, analisa. Coimbra ressalta o fato de os pedidos de demissão terem ocorrido em menos de 24 horas depois do escândalo. “Isso está calcado no movimento político do Temer. Mostra que ele não tem o perfil autoritário da Dilma”, afirma.
Para o cientista político da UFPR Fabrício Tomio, Temer perdeu a oportunidade de se mostrar contrário a qualquer tentativa de barrar a Lava Jato, mas o vice-presidente está entre dois constrangimentos que precisa balancear. “Primeiro ele precisa manter a base de apoio no Congresso que ‘o elegeu’. A outra questão é que ele também depende de algum grau de apoio popular”, analisa. “Ao sinalizar para um lado ele está perdendo o apoio em outro”, lembra o cientista.
Faxina de Dilma
No início do primeiro mandato, a presidente afastada Dilma Rousseff demitiu sete ministros envolvidos em suspeita de corrupção. O episódio, que seria negativo em qualquer governo, foi transformado em algo que aumentou a popularidade da presidente. Nascia a “faxina” da Esplanada.
“Em 2011, quando a presidente Dilma demitiu ou fez trocas no ministério isso até aumentou a popularidade dela”, lembra Tomio. A atitude de Dilma, porém, acabou custando caro para a petista. “A médio prazo isso acabou deteriorando a relação dela com a base no Congresso”, ressalta o cientista político.
Para Coimbra, as situações são muito diferentes. “Não vejo nenhuma relação com a faxina da Dilma, que pareceu uma coisa autoritária, para parecer que ela estava limpando o governo, quando na verdade ela trocava seis por meia dúzia”, opina o cientista político.
Para ele, Temer tem se saído melhor em relação à troca de ministros. “Ele tem a habilidade de manobrar melhor nessas áreas sem criar inimigos no parlamento, sem criar inimigos dentro do governo, sem criar cisma”, afirma.
Em 2011, Dilma culpou as indicações da base aliada pela corrupção e conseguiu se distanciar do centro das denúncias. Já o presidente em exercício Michel Temer não pode usar o mesmo argumento, já que os dois ex-ministros eram indicações do PMDB, partido que o próprio Temer presidiu até pouco tempo. “Certamente [a proximidade com Jucá] não contribui para a sustentação e para que o presidente consiga algum tipo de estabilidade”, analisa Tomio.
Lava Jato incomoda ambos os governos
A presidente Dilma Rousseff (PT) foi afastada do cargo depois do Senado aprovar em primeira votação a continuidade do processo de impeachment da petista. O presidente em exercício Michel Temer (PMDB) assumiu o cargo com a promessa de tirar o Brasil da crise, mas parece estar longe de cumprir a tarefa.
Se por um lado o motivo “oficial” do impeachment de Dilma são as pedaladas fiscais, de outro, o pano de fundo são as denúncias de corrupção que pesam contra o governo do PT. O ex-senador Delcídio Amaral, ex-líder do governo no Senado, abordou a questão na primeira entrevista concedida depois de ter o mandato cassado pelos colegas. “Se você olhar o impeachment, o que é o impeachment? É pedalada? Isso aí é um dos motivos. O pano de fundo é a Lava Jato”, concluiu o ex-senador, que se tornou delator da operação.
Até agora, o governo Temer não escapou imune à Lava Jato. Já no primeiro dia de governo interino surgiu a primeira polêmica, quando o presidente em exercício nomeou sete ministros investigados na operação de combate à corrupção na Petrobras. No caso de Dilma, o ápice da crise política ocorreu quando ela tentou nomear o ex-presidente Lula para a Casa Civil, em um ato que foi interpretado como uma tentativa de garantir ao ex-presidente prerrogativa de foro para tirar as investigações de Lula na Lava Jato da primeira instância, onde são comandadas pelo juiz federal Sergio Moro.
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