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Prós e contras

Saiba as vantagens e desvantagens do modelo de financiamento público exclusivo de campanha:

Prós

• Empresas não poderão doar para campanhas para receber vantagens futuras em troca.

• Poder econômico seria menos influente nas eleições.

• As campanhas ficariam mais baratas e mais simples.

Contras

• Ajudaria a afastar a população dos partidos políticos, e vice-versa.

• Sistema partidário ficaria "congelado", pois a verba seria necessariamente concentrada nos grandes partidos.

• Toda a campanha seria bancada exclusivamente com dinheiro vindo de impostos.

• Restrições a doações poderiam estimular ainda mais a prática de caixa dois.

• Só é compatível com o sistema de votação proporcional por lista fechada.

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Dos quatro temas principais da reforma política, o financiamento público exclusivo de campanha deve ser o mais espinhoso. Pela proposta, nenhuma campanha eleitoral poderá receber qualquer dinheiro privado, nem mesmo do próprio candidato. A ideia é reduzir o poder de grandes financiadores de campanha e sua relação, por vezes promíscua, com os políticos das mais diversas esferas. Entretanto, o projeto encontra bastante resistência, seja no meio político, seja em outros segmentos da sociedade. Para muitos, o projeto é antidemocrático e dificulta a participação de agentes políticos legítimos no processo eleitoral. Além disso, há um aumento sensível no custo das eleições para o contribuinte, sendo que a contrapartida não é necessariamente positiva.

Para debater o tema, a Gazeta do Povo entrevistou Jovita Rosa, diretora do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE) e defensora do projeto, e Emerson Cervi, professor de ciência política na UFPR e crítico da ideia.

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"As campanhas, hoje, já são financiadas com dinheiro público"

Wenderson Araújo/ABr

Jovita Rosa, diretora do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE)

O MCCE defende o financiamento público de campanha. Por quê?

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O financiamento, hoje, já é público. A partir do momento que uma empresa faz "doações" para um determinado político, ela quer esse recurso de volta. Geralmente, ela recebe muito mais do que doou. Temos que deixar claro para o eleitor que, depois que a empresa doa para o candidato, ela passa a ter muitos benefícios durante a gestão. Na verdade, ela faz investimentos. Esse dinheiro é desviado da saúde, da educação, do saneamento básico, tudo para compensar o recurso que o candidato recebeu da empresa. Propomos, então, financiamento público exclusivo para a campanha eleitoral, com transparência.

Há quem acredite que isso aumentaria os casos de caixa dois...

...de forma alguma. A partir do momento que a gente possa acompanhar o valor que cada candidato recebe, podemos acompanhar seu gasto. Se ele estiver gastando a mais, será caracterizado o caixa dois. A gente vai poder baixar o valor das campanhas, que hoje é superdimensionado, abrir oportunidades para pessoas com vocação para a vida pública. Com transparência e controle social, gradativamente o caixa dois vai deixar de ser usado.

Como a senhora vê as doações de pessoas físicas? Elas são, na sua opinião, tão problemáticas quanto as doações de empresas?

Assim como existe o voto de cabresto, existem doações de cabresto. Há muitos candidatos que recebem doações de seus próprios funcionários, por exemplo. Há o milionário, cheio da grana, com centenas de funcionários, que força seus empregados a contribuir com a campanha. A gente quer evitar todo tipo de manobra do poder econômico em cima das eleições.

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As campanhas custam caro. Não seria um valor muito alto a ser pago pelo contribuinte?

Caro está agora. As empreiteiras "doam" e dividem as licitações, com superfaturamento, obra inacabada, etc. No caso da saúde pública, os planos de saúde financiam os candidatos e vemos o SUS sendo privatizado. Isso não tem preço, estamos pagando com nossa vida. O financiamento público de campanha virá com transparência e poderemos acompanhar o destino de cada centavo.

Rodolfo Buhrer/Arquivo/GP

"Se isso passar, vai ser um crime contra a democracia brasileira"

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Emerson Cervi, professor de Ciência Política da UFPR

Por que o financiamento público exclusivo não é uma opção para a democracia brasileira?

O financiamento público exclusivo é, por natureza, antidemocrático. Não existem países democráticos que proíbam a sociedade de financiar suas campanhas eleitorais. Nos anos 70, alguns estados americanos tentaram esse modelo. Os principais efeitos negativos foram dois: primeiro, o afastamento dos partidos políticos em relação à sociedade. Os partidos pararam de recorrer à sociedade porque sua sobrevivência dependia de quantos postos eles ocupavam no estado. No caso brasileiro, isso seria absolutamente negativo. O segundo foi o congelamento do sistema partidário. Partidos grandes continuam grandes e os pequenos não conseguem crescer. Se tivéssemos financiamento público de campanha nos anos 80, estaríamos elegendo presidentes ou do PMDB ou do PDS. O PT e o PSDB jamais teriam chegado onde chegaram. Se isso passar, vai ser um crime absurdo contra a democracia brasileira.

Há uma crítica de que grandes doadores investem em campanhas para obter vantagens do Estado. O financiamento público exclusivo seria uma forma de resolver esse problema?

O problema, hoje, é que o limite é proporcional à renda – e 10% da renda do Eike Batista, por exemplo, equivale ao PIB de cidades inteiras. Resolveríamos esse problema se a legislação limitasse o volume de recursos dos doadores privados, ao invés de proibir que as pessoas doassem. Nós temos duas alternativas: uma é impedir que atores políticos legítimos doem porque o banco ou a empreiteira não podem doar tanto. Outra opção, mais simples: permitimos a doação de maneira limitada.

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O modelo de financiamento público seria adequado com o sistema eleitoral atual, por lista aberta?

Não faz o menor sentido aprovar o financiamento público exclusivo e manter a lista aberta. Também não faz sentido fechar a lista e deixar possibilidade de reeleição indefinida. Olha o Frankenstein que estamos criando: querem que as lideranças partidárias tenham acesso direto ao dinheiro público e que ninguém tenha acesso à sociedade para crescer. Querem que fechemos as listas e que só os presidentes dos partidos decidam os candidatos.