Especialistas divergem sobre peso do caso Cesare Battisti
A concessão de refúgio por parte do Brasil ao italiano Cesare Battisti, em 2010, pode ser um fantasma a assombrar o eventual processo de extradição do ex-diretor do Banco do Brasil (BB) Henrique Pizzolato, preso ontem.
Professora de Direito do Mackenzie e autora do livro "Direito Internacional para o Século XXI", Carla Noura Teixeira afirma que é difícil dimensionar a influência do fator Battisti no caso Pizzolato, porque também devem ser avaliados os interesses italianos sobre o Brasil e suas relações comerciais. "No Direito Internacional, as relações diplomáticas contam muito, assim como a fragilidade que ocorre com uma retaliação econômica. Agora, Pizzolato quer usar a mesma alegação de Battisti, de ter sido vítima de um julgamento político."
Especializado em Direito Internacional, o advogado Jorge Nemr diz não acreditar que "a Itália use o caso Battisti como troco". "Até porque a decisão jurídica brasileira, do Supremo Tribunal Federal (STF), foi favorável à extradição do italiano. Quem deu refúgio a ele foi o governo", disse Nemr.
Os dois especialistas explicaram que, mesmo que o caso Battisti venha à tona, não há possibilidade de reabrir o processo de extradição do italiano no Brasil. "Não existe isso. Não é uma troca de prisioneiros em tempos de guerra", disse Nemr.
Agência O Globo
Tratados
Deputada ítalo-brasileira diz que vai interceder por extradição
Renata Bueno, ex-vereadora de Curitiba pelo PPS e atual deputada ítalo-brasileira no Parlamento italiano, disse ontem que vai defender a extradição de Henrique Pizzolato, condenado no processo do mensalão. Ela já havia protocolado pedido de extradição no Ministério da Justiça brasileiro, mas explica que isso dependia da ação da polícia italiana. "Agora, posso colaborar ativamente no sentido de obter a extradição. Com os contatos e o trânsito que temos, é possível explicar às autoridades a relevância desse caso específico para o Brasil", diz.
Para ela, a maior dificuldade na extradição será pelo fato de o Brasil não extraditar brasileiros natos que cometem crimes em outros países. Brasil e Itália não têm acordo de extradição e devem atuar levando em conta a reciprocidade de tratamento. Como Pizzolato tem cidadania italiana, ela acha que é possível que o país tutele o foragido. "Teremos de esperar a justiça italiana analisar a situação, que por ora é indefinida", aponta a deputada.
Taiana Bubniak
Foragido desde novembro de 2013, o paranaense Henrique Pizzolato, ex-diretor do Banco do Brasil condenado pelo mensalão, foi preso ontem em Maranello, a 322 Km de Roma, portando um passaporte em nome de Celso, irmão morto há 35 anos. Segundo a Polícia Federal (PF), Pizzolato começou a falsificar a documentação que lhe garantiu a fuga em novembro de 2007, três meses depois de ter virado réu no Supremo Tribunal Federal (STF). Ele foi condenado a 12 anos e sete meses de prisão pelos crimes de corrupção passiva, peculato e lavagem de dinheiro.
MAPA: Veja onde Pizzolato foi preso
A PF e a polícia italiana informaram que o ex-diretor do Banco do Brasil não foi preso por uso de documento falso, mas a pedido do Brasil para fins de extradição. Pizzolato, contudo, também vai responder por uso de documento falso na Itália.
A prisão de Pizzolato reacende o debate sobre a extradição envolvendo o Brasil e a Itália. O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, afirmou ontem que o governo brasileiro pedirá à Itália a extradição de Pizzolato. No entanto, ministros do Supremo Tribunal Federal avaliam que a medida será "inócua".
Decano na corte, o ministro Celso de Mello afirmou que eventual pedido para extraditá-lo é "juridicamente inviável" já que Pizzolato possui cidadania italiana e as leis locais proíbem a extradição de cidadãos nacionais. Outros dois ministros do STF, ouvidos, concordam que não há possibilidade de extradição.
Uma alternativa é o governo brasileiro pedir que a Itália abra um processo contra Pizzolato para que ele seja julgado no país europeu pelos crimes praticados no mensalão. A Procuradoria-Geral da República, porém, divulgou nota afirmando que pedirá a extradição por considerar que existem brechas legais. Segundo a nota, no tratado de extradição assinado por Brasil e Itália, consta que o Estado não está "obrigado" a entregar um cidadão nacional. Por isso, na visão do Ministério Público, se tiver interesse, o governo italiano pode entregar Pizzolato.
Trajetória
Pizzolato deixou o Brasil em 11 de setembro de 2013, mais de dois meses antes de o STF expedir o pedido de prisão contra ele. Segundo a PF, foi a partir de Dionísio Cerqueira (SC) que o ex-diretor do BB deixou o Brasil. Ele percorreu 1.300 quilômetros por terra até chegar a Buenos Aires. Na noite de 12 de setembro, pegou um voo para Barcelona.
A PF não sabe se ele entrou na Itália por céu ou terra. No dia 14 de setembro, Henrique Pizzolato já estava na Itália, onde comunicou à polícia que seus documentos (em nome de Henrique) haviam sido furtados na Espanha. "Não havia nenhum registro de entrada de Henrique Pizzolato em nenhum lugar do mundo. Faltava essa peça para fechar o quebra-cabeça", explicou ontem o delegado Luiz Cravo Dórea, coordenador-geral de cooperação internacional da PF.
Acidente
Segundo Dórea, foi a partir de uma informação da Itália que o mistério foi desfeito. A Itália avisou o Brasil que, em 2013, Celso Pizzolato requisitou a mudança de status para cidadão residente na Itália. A PF foi atrás de Celso, quando descobriu que ele havia morrido em um acidente de carro no Paraná. Registros da entrada e saída de Pizzolato na Argentina foram cruzados com as impressões digitais dele e do irmão. Concluiu-se, então, que o fugitivo estava na Itália com a documentação de Celso.
"A gente fica triste", diz ex-vereador que homenageou o amigo
Luiz Carlos da Cruz, corespondente, com agências
O ex-vereador de Toledo Aldeni Gomes de Araújo, que atualmente é comerciante em Palotina, no Oeste do Paraná, disse que ficou triste com a prisão de Henrique Pizzolato porque foram amigos por muitos anos. "A gente fica triste por conhecer a pessoa e saber quem era Pizzolato", diz. Segundo ele, na década de 1990, quando conviveu com Pizzolato, ele era uma pessoa de boa índole e um excelente líder político. "Foi um grande companheiro, a gente apostava na seriedade política dele", afirma.
Em 1994, quando era vereador, Araújo apresentou um projeto de lei que concedeu a Pizzolato o título de cidadão honorário de Toledo. Ele critica os atuais vereadores da cidade que no ano passado votaram, em primeiro turno, a cassação da honraria. "Se na época ele foi digno de merecer o título por que tirar agora?".
Araújo diz que ainda não tem certeza sobre as acusações contra o amigo. "O ser humano com o passar do tempo pode melhorar ou piorar. Se houve desvio de conduta tem que ser punido", avalia.
Críticas
Já uma tia de Pizzolato foi mais crítica ao falar do sobrinho. "Não queria que sujassem principalmente o nome do meu pai, porque ele foi um herói de guerra. Mas sujaram", disse Lídia Pizzolato de Rossi, 72 anos. "Ele [Henrique] jogou o nome da família na lama", completou a tia que vive no município catarinense de Concórdia.