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Afirmar que jovens não gostam de política virou senso comum. Todo mundo diz, sem pudores, com ares de cientista. E de tanto falar, está quase virando uma verdade. Para a cientista social Ana Luísa Fayet Sallas, da UFPR, a máxima não merece ser garganteada com tanta ênfase. Pois é conservadora. E ela fala de cadeira. No fim dos anos 90, em pesquisa feita em parceria com a Unesco, a pesquisadora investigou o comportamento de 900 jovens curitibanos de 14 a 20 anos, eleitores em potencial, e descobriu uma outra verdade, não tão fácil de ver, embora embaixo das barbas. Jovem gosta de política sim, mas não necessariamente de política partidária.

A pesquisa comandada por Ana Luísa – intitulada "Os jovens de Curitiba: esperança e desencantos – 1998 – 2000" – ainda serve de referencial. Além de números a granel, fala muito do sentimento juvenil que se prolongou nos anos 2000 – povoado de Katrinas ao Norte e mensalões ao Sul. Cerca de 40% dos entrevistados, por exemplo, diziam receber dos professores o incentivo necessário para se informar em revistas e noticiários e participar do debate político. E 92% – um número esmagador – viam na escola a função de formar o cidadão crítico. A escola permanece em alta. E os políticos em baixa. Na ocasião, entre diversas instituições, os partidos receberam a pior nota – 3,0 – contra 9,2 para a família, 7,7 para a educação e 5,9 para a mídia.

Em miúdos, a pesquisa retratou a geração que ficou com sentimento de culpa por não ser assim, tão politizada. Ou que foi culpada por isso. Antes dela, houve os caras-pintadas, moçada alegre e faceira que derrubou o presidente Collor e inaugurou o último mito de contestação juvenil depois da geração 70. Qualquer comparação era mera sacanagem: o jovem do fim dos 90 ficou com a faixa e a coroa de acomodado, sem o direito de defesa. "Tentou-se em vão repetir a mobilização dos caras-pintadas. Houve convocação, mas sem resposta", comenta a pesquisadora. "Mas o que os jovens abandonaram foram as formas tradicionais de fazer política. O engajamento não se dá via partido."

Ana Luísa Fayed Sallas lembra que as ONGs e outras formas alternativas ganharam fôlego ao longo dos anos 90 – formando a nova face política da juventude. Outra característica da geração fim-de-século é a capacidade de mobilização para grande causas – independemente de legendas. A eleição de Lula traduz essa soma de forças para mudar alguma coisa. Muitos jovens o apoiaram. O mesmo se diga do Referendo do Desarmamento, que vem por aí, com a rapaziada abraçando a causa e acenando uma espécie de resgate. "Não tem como ser diferente. O jovem é o único agente social que se permite agir como fonte de transformação. Ele não tem passado nem futuro. Isso não quer dizer que vai estar necessariamente à esquerda", pontua.

Para a pesquisadora, a posição de recuo tende a ser reforçada com os acontecimentos dos últimos cem dias. Motivos não faltam – afinal, passou um furacão por cima do partido que representava uma esperança, até para teens individualistas registrados em cartório ou avessos à proposta do Partido dos Trabalhadores. "A partir de agora, há um longo trabalho a ser feito. Fala-se em reivenção do PT. Resta saber se isso vai se realizar." O processo de desencanto com a política permanece.

Vale lembrar que o jovem dos anos 2000 está polarizado pela necessidade de entrar no mercado de trabalho, em especial o jovem mais pobre e vulnerável. O futuro, para esses, é uma incógnita, até porque se depara com adultos também em estágio de desalento. E é olhando para os adultos que o jovem constrói sua identidade. Uma pesquisa a propósito poderia levantar como esse cidadão à margem do sistema vê os partidos e a política. Diria algo sobre eles. E muito sobre os outros.

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