NOVIDADE| Foto: Mauro Campos

Brasília – A luta do governo do Paraná para acabar com a multa mensal de R$ 5 milhões aplicada pela União ao Paraná trouxe à tona uma dívida de pelo menos R$ 400 milhões do estado com o banco Itaú. A história envolve a administração Jaime Lerner (1995–2002), passa pela atual gestão Roberto Requião e coloca em xeque a teoria de que os títulos públicos que originaram a penalidade cobrada pela União são "podres". Ao todo, o estado já negociou 63% dos papéis considerados nulos.

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"É uma dívida que existe, não negamos. Só estudamos a melhor maneira para negociar", afirma a procuradora-geral do Paraná, Jozélia Broliani. Ela é a principal articuladora do governo na disputa judicial e política para acabar com cobrança da multa, uma novela que começou em novembro de 2004, já teve vários desfechos anunciados, mas nenhum concretizado.

Nos últimos 34 meses, a Secre-taria do Tesouro Nacional (STN) reteve R$ 155 milhões (valores atualizados) em repasses mensais da União ao Paraná. A punição é provocada pelo descumprimento do Termo de Compromisso de Compra e Venda de Títulos Públicos entre o Paraná e o Banestado, firmado em 1998.

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Os tais títulos "podres" foram emitidos em meados da década de 90 pelos estados de Alagoas, Pernambuco e Santa Catarina, além dos municípios paulistas de Osasco e Guarulhos. O Banestado os comprou e, no processo de saneamento do banco, antes da privatização, o governo estadual os adquiriu, já que eles eram considerados de difícil negociação. O pagamento dos títulos ao Itaú, comprador do Banestado, deveria ser feito no atual governo, mas Requião não aceita pagar por eles por considerá-los "podres".

Entretanto, do total atualizado de R$ 1,75 bilhão em títulos, 63% já foi negociado pelo estado. A maior parte dessa porcentagem, que chega a aproximadamente R$ 1,1 bilhão, foi recebida em dinheiro pelo Paraná.

Em março de 2000, Pernambuco negociou por intermédio da União e pagou, em valores atuais, R$ 485,6 milhões (27% do total dos títulos) ao Paraná. O dinheiro foi repassado diretamente ao Banestado para amortização da dívida total dos papéis. "Dos títulos de Pernambuco, não devemos nem temos mais nada a receber", explica o diretor-geral da Secretaria Estadual da Fazenda, Nestor Bueno.

Sete meses depois, o Banestado foi comprado pelo Itaú por R$ 1,6 bilhão e o banco privado passou a ser o credor do Termo de Compromisso. Em setembro de 2002, foi a vez de Alagoas acertar as contas com o estado. Segundo diretores do Itaú, os títulos alagoanos valem hoje R$ 652,9 milhões, sendo que aproximadamente R$ 400 milhões (61%) foram repassados há cinco anos ao Paraná. O restante será pago em 2012.

Bueno conta que, pelas contas da secretaria, o Paraná já teria recebido R$ 527 milhões (valores atualizados) de Alagoas. Nas contas do governo, o valor somado aos demais títulos de Santa Catarina, Osasco e Guarulhos, jogam a dívida para R$ 1,05 bilhão, quantia bem próxima ao R$ 1,04 bilhão citado nos números do Itaú.

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Porém, ao contrário do que ocorreu com o dinheiro de Pernambuco, o de Alagoas não foi repassado ao banco. De acordo com o secretário de governo da época, Cid Campêlo Filho, a verba foi empregada para capitalizar a Paranaprevidência, o fundo de previdência dos servidores estaduais. "Usamos o dinheiro para outro fim, não para pagar o Itaú", confirma o braço-direito do então governador Jaime Lerner.

Segundo representantes do Itaú, que falam em nome do banco mas não querem divulgar os nomes, o contrato obrigava o estado a repassar qualquer verba recebida dos títulos para amortização da dívida contraída pelo Termo de Compromisso. A procuradora-geral, porém, nega a obrigatoriedade do repasse. "Seria melhor se o outro governo tivesse feito isso, mas não significa que deixar de dar o dinheiro ao Itaú tenha sido ilegal", diz Jozélia. Apesar de 63% dos títulos terem sido negociados, Jozélia mantém a tese de que os papéis são nulos. Ela segue o discurso de Requião, que foi relator da CPI dos Precatórios no Senado, em 1997.

A CPI foi criada para investigar irregularidades nos títulos públicos emitidos por vários estados e municípios (incluindo Alagoas, Pernambuco, Santa Catarina, Osasco e Guarulhos) e que deveriam ser usados para pagar precatórios (dívidas públicas com pagamento ordenado pela Justiça). De acordo com o que foi apurado pelos senadores, o esquema ilegal envolvia instituições financeiras "comissionadas" e o lucro obtido era enviado ao exterior por doleiros, empresas "fantasmas" e "laranjas".

Requião argumenta que a CPI declarou os títulos nulos, mesmo sem ter poder jurídico para isso. Além disso, o relatório final da comissão, redigido por ele próprio, não apresenta sequer uma linha que explicite essa "nulidade".

Ancorado por essa teoria, o governador briga na Justiça desde 2003 para não pagar pelos títulos. O pagamento, segundo ele, poderia significar ato de "improbidade administrativa".

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Dois anos após a CPI, porém, o Senado regulamentou o refinanciamento dos títulos emitidos depois de dezembro de 1995. Com isso, Alagoas, Pernambuco, Santa Catarina, Osasco e Guarulhos ficaram autorizados a refinanciar suas pendências até 2009, o que já foi feito pelos dois estados do Nordeste e que possibilitou os pagamentos ao Paraná.