Dois dos pontos propostos requentam ideias de Lula
André Gonçalves, correspondente
O pacto proposto pela presidente Dilma Rousseff para a reforma política e a sugestão de um projeto para transformar corrupção dolosa em crime hediondo reaproveitam ideias que já foram apresentadas pelo ex-presidente Lula. Na campanha pela reeleição, em 2006, o petista disse em entrevista ao SBT que, caso houvesse uma reivindicação da sociedade, encaminharia ao Congresso Nacional a proposta de uma Constituinte exclusiva. A proposição não foi formalizada, mas Lula voltou a defender a tese em março passado, durante seminário em São Paulo.
"Se o Congresso não aprovar a reforma, teríamos de ter uma Constituinte só para isso", disse Lula, há três meses. Também declarou que não acreditava na votação do projeto de reforma política relatado pelo deputado federal Henrique Fontana (PT-RS), que deveria ser apreciado na semana seguinte. O prognóstico se concretizou e o texto continua engavetado até hoje.
"Estamos falando de uma proposta de reforma que é do PT, que não tem conexão com o que a sociedade quer", afirma o deputado paranaense Sandro Alex, da Mobilização Democrática (MD). O parlamentar fez parte da comissão especial da Câmara aberta em 2011 para discutir a reforma política. O relatório de Fontana, que não chegou a ser votado pela comissão, foi transferido em dezembro direto para o plenário.
A medida prática de Lula em relação à reforma política ocorreu no começo de 2009, quando ele enviou uma proposta "fatiada" em cinco projetos de lei e uma proposta de emenda à Constituição à Câmara dos Deputados. De todas as propostas, a única que prosperou, mas indiretamente, foi a proibição de candidatura de fichas sujas, com a aprovação da Lei da Ficha Limpa, em 2010, via projeto de iniciativa popular.
Hediondo
Em 2009, Lula apresentou o projeto de lei (PL 6616/2009) que tornava hediondos os crimes de peculato (apropriação de verba ou bens públicos), concussão (quando o agente público usa o cargo para exigir vantagens) e corrupção passiva e ativa. A proposta foi lançada no Dia Mundial de Combate à Corrupção (9 de dezembro). Segundo Lula, a ideia era atenuar a sensação de impunidade que atinge o cidadão brasileiro. Atualmente, o projeto tramita em conjunto com o PL 3.760/2004, do deputado Wilson Santos (PSDB-MT), pronto para ser votado em plenário desde 2011.
Vinte e quatro horas após sugerir uma Assembleia Constituinte específica para votar a reforma política, em reunião com 27 governadores e os 26 prefeitos das capitais, a presidente Dilma Rousseff foi obrigada a recuar. Sem apoio do vice Michel Temer e criticada até mesmo por integrantes de sua base aliada, Dilma decidiu enviar ao Congresso apenas uma mensagem propondo a convocação de um plebiscito, em 45 dias, com pontos específicos sobre como deve ser feita a reforma política, mas sem recorrer ao expediente da Constituinte.
A mudança na proposta da presidente veio depois de encontro com o vice, Michel Temer (PMDB-SP), e foi anunciada à noite pelo ministro Aloizio Mercadante (Educação). Antes, Dilma esteve com os presidentes do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN). "A convergência possível foi em relação ao plebiscito", afirmou Mercadante, citando a proposta apresentada à presidente por Michel Temer, com a qual os presidentes do Senado e da Câmara teriam fechado consenso.
Entre os itens que devem ser submetidos ao crivo da consulta popular estão o financiamento público de campanha e o voto em lista. Depois de a população opinar, o Congresso seria obrigado a votar lei implementando as decisões. Na noite de ontem, ao receber em seu gabinete os presidentes da Câmara e do Senado, Dilma afirmou que o importante, para o governo, é que a reforma política seja votada até outubro.
O Planalto quer que as novas medidas possam valer já para as eleições de 2014, quando Dilma deve concorrer a um segundo mandato. Mercadante disse que o governo vai consultar a presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Carmen Lúcia, para definir qual o prazo limite para a realização do plebiscito. Nos próximos dias, a presidente vai chamar líderes governistas e da oposição para definir o formato do plebiscito, como também quais as perguntas a serem feitas.
O plano do Planalto é já no início de agosto fazer a campanha publicitária esclarecendo a população sobre o tema. O plebiscito ocorreria até o fim do mesmo mês, o que daria tempo para o Congresso votar a lei até 3 de outubro.
Polêmica
Na prática, a presidente deixou de lado a ideia da Constituinte exclusiva porque as reações contrárias não tardaram no Congresso desde que ela tocou no assunto com governadores e prefeitos. Nos bastidores, deputados e senadores se queixaram de não terem sido ouvidos por Dilma antes do lançamento da proposta.
Oficialmente, a justificativa dada foi a polêmica jurídica gerada pela ideia de convocar Constituinte específica e a falta de tempo para que o processo fosse finalizado antes de outubro. "Não temos tempo hábil para realizar uma Constituinte", afirmou Mercadante, que tem atuado como articulador político do Planalto.
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