Vetos parciais deixam os dois lados insatisfeitos
Apesar do descontentamento de ruralistas e ambientalistas, especialistas destacam os critérios técnicos que pautaram as mudanças
Cronologia
Veja o percurso mais recente do Código Florestal pelo Congresso e pelo Planalto:
2008
13/05: Sem respaldo do presidente Lula, a então ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, pede demissão.
19/05: O novo ministro, Carlos Minc, toma posse; em julho, Lula assina decreto que prevê punição a desmatadores.
2009
13/11: Lula adia a entrada em vigor de decreto que punia com mais rigor os desmatamentos.
2010
6/07: Comissão da Câmara aprova texto do então deputado e relator da reforma, Aldo Rebelo (PCdoB-SP), para o novo Código Florestal que contraria ambientalistas
2011
24/05: Governo é derrotado e Câmara aprova uma anistia aos desmates ocorridos até junho de 2008. Código também restringiu poder da União para decidir quais Áreas de Preservação Permanente (APPs) poderiam ser exploradas economicamente, dando aos estados parte dessa responsabilidade.
06/12: Projeto é aprovado no Senado após um acordo com vários partidos, no qual o governo conseguiu reverter alguns pontos aprovados pela Câmara.
2012
26/04: Governo perde na Câmara por 274 votos a 184, e os ruralistas reduzem a proteção aos ecossistemas.
06/05: Manifestantes em diversas cidades do país vão às ruas pedir veto ao texto do novo Código.
10/05 : Deputados ligados ao agronegócio protocolam na Câmara dos Deputados um projeto de lei para modificar trechos do Código, definindo regras para recuperação das APPs às margens dos rios desmatadas ilegalmente.
19/05: Dilma se reúne com ministros para discutir possíveis vetos ao texto. No mesmo dia, acontecem mais manifestações em Curitiba a favor do veto, lideradas pelo movimento SOS Florestas.
24/05 : Uma petição de 2 milhões de assinaturas pelo veto ao Código, recolhidas virtualmente pela ONG Avaaz, foi entregue ao governo federal.
Artigo
O mote "Veta Tudo" pegou, presidente!
Clóvis Borges, diretor-executivo da SPVS, e Teresa Urban, jornalista e ambientalista.
A presidente da República, Dilma Rousseff, perdeu ontem uma oportunidade única com múltiplos enfoques: de decidir em nome do povo brasileiro, pelo bem do povo; de se apresentar como líder diante de milhões de jovens que começam a descobrir o sentido da política; de dizer basta para o atraso de só produzir para exportar.
Enfim, perdeu a oportunidade única de cumprir a lei sobre a função social da terra e de fazer valer o artigo 225 da Constituição Brasileira.
A mobilização em defesa do Código Florestal Brasileiro, pelo interesse do Brasil, ganhou o país, cobriu de esperança ruas e praças, automóveis e bicicletas, colégios, universidades, Facebook e Twitter. Brilhou no céu de Brasília.
Uma campanha que juntou Amazônia e Pantanal, Pampa e Caatinga, Mata Atlântica e Cerrado, mangues e veredas. Por breves momentos, parecíamos uma nação.
O veto parcial da presidente indica que ela não nos ouviu. Tirou gorduras bem maquiadas para não ficar mal na Rio+20? Logo saberemos. Porém, uma certeza já temos. O povo brasileiro sabe o que quer e precisa ser ouvido. Por plebiscito, referendo e eleição. E é bom não esquecer que, assim como o grito de "Veta Tudo" pegou e a "Dilma", convocada pelos jovens com tanta esperança para proteger o patrimônio natural do país, poderá carregar para sempre a responsabilidade de ter revogado o Código Florestal Brasileiro.
O veto parcial da presidente indica que ela não nos ouviu. Tirou gorduras bem maquiadas para não ficar mal na Rio+20? Logo saberemos. Porém, uma certeza já temos. O povo brasileiro sabe o que quer e precisa ser ouvido. Por plebiscito, referendo e eleição.
Artigo
Código Florestal: Bola na trave
Ágide Meneguette, presidente da Federação da Agricultura do Estado do Paraná (Faep)
Foi aos 45 minutos do segundo tempo, mas quando se esperava um gol do governo, a bola bateu na trave. Depois de 13 anos, quando era aguardado um Código Florestal equilibrado para o país, o governo retrocedeu, principalmente ao desrespeitar a questão das áreas de agricultura consolidadas, algumas há mais de um século. Não importa o tamanho da propriedade e o tempo de uso, todos terão obrigatoriamente de recompor áreas hoje ocupadas pela agricultura. Se não o fizerem em cinco anos, serão impedidos de obter créditos.
A decisão presidencial privilegia as pequenas propriedades de 0 a 4 módulos (72 hectares) fiscais estabelecendo um escalonamento de recuperação de APPs, não podendo ultrapassar de 10 a 20% o tamanho de suas áreas. As demais superiores a 4 módulos, terão que recuperar integralmente as APPs, de 30 a 100 metros em cada margem do rio.
O perfil fundiário do Paraná apresenta 320.000 propriedades de 0 a 1 módulo fiscal (até 18 hectares) ou 474.000 propriedades de 0 até 4 módulos (72 hectares), que ocupam quase 8 milhões de hectares, a maioria com pequenos cursos dágua.
A Federação da Agricultura do Estado do Paraná (Faep) lembra que no Brasil do Código Florestal que sofreu ontem 12 vetos e 32 modificações no seu texto, decididas pela presidente Dilma Rousseff, o campo gera 33% dos empregos e 22% do PIB (R$ 917 bilhões de R$ 4,1 trilhões), onde vivem apenas 16% da população (IBGE, 2010). É essa gente a responsável pelo superávit da balança comercial, o controle da inflação ao colocar fartura boa e barata na mesa dos brasileiros, mas ao mesmo tempo tem sido irresponsavelmente acusada de um cataclisma ambiental no país. Se as medidas anunciadas forem aprovadas pelo Congresso Nacional, a economia do país poderá estar em risco.
Num quadro de crise econômica mundial, o Brasil já sofre seus efeitos. As commodities agrícolas vêm, nos últimos anos, garantindo os saldos comerciais da balança. No Paraná, 73% das exportações são do setor primário. Não só o produtor perde, perde o Brasil, com o risco de o novo Código gerar uma crise no campo e aumentar o êxodo rural.
A Federação da Agricultura do Estado do Paraná (Faep) lembra que no Brasil do Código Florestal que sofreu ontem 12 vetos e 32 modificações no seu texto, decididas pela presidente Dilma Rousseff, o campo gera 33% dos empregos e 22% do PIB.
Demonstrar que não haverá anistia aos desmatadores foi a maior preocupação do governo na entrevista de divulgação do novo texto do Código Florestal, que recebeu da presidente Dilma Rousseff 12 vetos e 32 modificações em relação ao aprovado pela Câmara dos Deputados no final de abril. A principal alteração anunciada diz respeito ao artigo que trata da recuperação das matas ciliares e áreas de preservação permanente (APPs), que estabelece parâmetros que levam em conta o tamanho da propriedade.
Maiores detalhes serão conhecidos na segunda-feira, quando o texto será entregue ao Congresso Nacional, que irá analisar a medida provisória com as alterações propostas pelo governo. Para derrubar um veto, é preciso obter maioria absoluta das duas Casas Senado e Câmara em votação secreta.
A ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, explicou que o resgate de artigos do texto do Senado visa a dar maior proteção ambiental. O principal ponto detalhado pelo governo foi a alteração do artigo 61, que trata da recuperação da mata ciliar nas beiras rios e recuperação das APPs. O texto aprovado pela Câmara dos Deputados, que desagradou a presidente Dilma Rousseff, previa a recuperação da mata ciliar em 15 metros para rios até 10 metros, sem levar em conta o tamanho da propriedade.
No texto apresentado ontem, o governo estabelece faixas proporcionais de recuperação da mata ciliar e das APPs, de acordo com o tamanho da propriedade. A agricultura familiar, que tem propriedades de até 4 módulos fiscais (equivalente a até 20 hectares na maioria dos municípios brasileiros), serão menos exigidas na hora de recompor a área desmatada.
Os proprietários de 2 a 4 módulos, por exemplo, terão de recuperar 15 metros de mata ciliar em rios de mais de 15 metros, mas o total da área de APP deve ser no máximo 20% do imóvel. As propriedades com mais de 4 módulos que tenham rios acima de 20 metros terão que recuperar de 30 a 100 metros de mata ciliar e não existe limite de APP.
Izabella frisou que o limite de até 4 módulos fiscais abrange cerca de 90% das propriedades rurais e 24% da área agrícola do país. O Advogado-Geral da União, Luís Inácio Adams, disse que o governo tem confiança de que a MP com as alterações será aprovada pelo Congresso.
Bom senso
O ministro da Agricultura, Mendes Ribeiro, tentou evitar que as decisões sejam consideradas como pró-ambientalistas ou como pró-ruralistas. "Esse não é código dos ambientalistas, não é o código dos ruralistas, este é o código do bom senso", afirmou Mendes Ribeiro.
A estratégia de veto foi decidida na quinta-feira à noite, após uma exaustiva série de encontros que a presidente vinha fazendo desde sábado com uma equipe de ministros. Nos encontros, cada artigo do código foi discutido, com direito a aulas particulares de especialistas, como o agrônomo Gerd Sparovek, da Esalq-USP, e o ex-ministro Roberto Rodrigues.
Ainda na quinta-feira, o governo federal recebeu uma petição com 1,9 milhão de assinaturas pedindo o veto total ao novo código.
Detalhamento
As diretrizes seguidas pela presidente Dilma Rousseff buscaram preservar os pontos em consenso entre a Câmara e o Senado.
Vetos
Áreas de Preservação Permanente (APPs) - margens de rios e reservatórios, topos de morros, encostas em declive ou matas localizadas em leitos de rios e nascentes.
Projeto da Câmara: reduzia dos atuais 30 para 15 metros de recuperação de mata para propriedades com rios de largura de até 10 metros e deixava a definição do que poderia ser plantado em APPs a cargo dos estados.
Texto do Planalto: voltam as faixas de recuperação propostas pelo Senado até 20% em pequenas propriedades (com até 4 módulos fiscais) e entre 30 e 100 metros em áreas acima de 4 módulos, dependendo do tamanho da propriedade.
Agricultura familiar (regulariza cultivos em APPs de pequenos proprietários ribeirinhos)
Projeto da Câmara: autoriza o desmatamento de APPs para cultivos com pouco impacto ambiental pelos pequenos produtores com Cadastro Ambiental Rural.
Texto do Planalto: acrescentou a chamada "escadinha" um escalonamento das faixas de recuperação de florestas de acordo com o tamanho da propriedade. Os pequenos proprietários, que antes estavam isentos de reflorestamento, também terão que recompor as áreas de APPs de acordo com o tamanho da área.
Crédito ambiental
Projeto da Câmara: liberava o financiamento agrícola para quem desmatou antes de 22 de julho de 2008.
Texto do Planalto: o proprietário que não recuperar a APP desmatada em cinco anos não poderá obter crédito agrícola.
Urbanização
Projeto da Câmara: permitia a urbanização de áreas de restinga e mangue que tinham suas funções ecológicas comprometidas.
Texto do Planalto: mangues não podem ser alterados, pois ficam definidos como APPs.
Composição de mata ciliar
Projeto da Câmara: previa que proprietários que construíram imóveis em APPs deveriam recompor a margem dos rios em 15 metros.
Texto do Planalto: o remanejamento varia de acordo om o tamanho da propriedade. Proprietários de imóveis maiores terão que recompor até 100 metros das margens.
Sem definição
Reserva Legal - parcela de cada propriedade, descontando a APP, que deve ser preservada para garantir a biodiversidade da área
Projeto da Câmara: diminuía de 80% para até 50% o limite da Reserva na Amazônia Legal em alguns estados, que seriam responsáveis pelo tamanho da redução.
Texto do Planalto: não esclareceu as modificações no artigo.
Sancionado
Multa aos desmatadores
Projeto da Câmara: desde que haja reflorestamento, suspende multas aplicadas a quem desmatou sem autorização até 22 de julho de 2008. Cada estado deve estabelecer as faixas de recomposição para suspensão das multas através do Programa de Regularização Ambiental (PRA).
Texto do Planalto: o produtor terá a multa ambiental suspensa se recuperar a APP.
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