O juiz federal Sergio Moro, que atua nos processos da Operação Lava Jato, disse em decisão que as interceptações de celulares BlackBerry, que ele autorizou, não ferem nenhum tratado internacional porque não havia alvos de fora do país entre os investigados. A Lava Jato apura desvios e pagamento de suborno a diretores da Petrobras e políticos. Os tratados a que o juiz se referiu visam agilizar a troca de informações em investigações criminais.
A resposta de Moro foi dada a um questionamento da defesa do ex-deputado Luiz Argôlo, para quem teria de haver um pedido de cooperação internacional para interceptar um BlackBerry porque o fabricante do aparelho, a RIM, fica no Canadá. Outros réus da Lava Jato, como os diretores da OAS, já haviam apresentado o mesmo tipo de argumento para tentar anular as interceptações, mas não tiveram sucesso.
O juiz afirma que não houve nenhuma ilegalidade com as medidas adotadas em torno desses celulares. “A cooperação jurídica internacional só seria necessária caso se pretendesse, por exemplo, interceptar pessoas residentes no exterior, o que não é o caso”, afirma, em despacho incluído na ação penal de Argôlo nesta quinta (18).
Segundo Moro, a BlackBerry tem escritório no Brasil e a Justiça brasileira pode “ordenar interceptação telemática de troca de mensagens através do BlackBerry Messenger [serviço de mensagens] quando os crimes ocorrem no Brasil e quando os interlocutores são residentes no Brasil”.
Ele diz na decisão que “não tem a menor relevância a questão relativa à forma de implementação da diligência, se os ofícios judiciais ou da autoridade policial foram entregues a X ou Y, se foram selados ou não, se o endereço foi escrito corretamente, com utilização de letra cursiva ou não. Essas são questiúnculas relativas a formalidades”.
O juiz ainda compara o caso do BlackBerry com o Google americano e sua subsidiária brasileira.
Inicialmente, o Google se recusava a atender ordens judiciais brasileiras sob a alegação de que os servidores pelos quais trafegam seus serviços estão fora do Brasil. O STJ (Superior Tribunal de Justiça) determinou que o Google entregasse a investigadores mensagens do seu serviço de e-mail, o Gmail.
A ministra Laurita Vaz, citada por Moro no despacho, mandou o Google entregar as mensagens de brasileiros investigados em abril de 2013 e determinou a aplicação de uma multa diária de R$ 50 mil caso o gigante da internet não cumprisse a decisão. “Não se pode admitir que uma empresa se estabeleça no país, explore o lucrativo serviço de troca de mensagens por meio da internet -o que lhe é absolutamente lícito- mas se esquive de cumprir as leis locais”, disse a ministra do STJ à época.
Moro afirma que é tão flagrante que não houve ilegalidade alguma que nenhuma autoridade canadense reclamou de violação do tratado de cooperação, assinado entre os dois países em 2009.
SEM O MINISTRO
O juiz recusou também o pedido de Argolo de que o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, e o chefe do DRCI (Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional) servissem como testemunhas do ex-parlamentar. O DRCI centraliza os pedidos de cooperação com outros países.
Para Moro, a tentativa de convocar Cardozo e o diretor do DRCI seria para “questionar a validade da interceptação do BlackBerry”, o que já foi considerado legal pelo juiz. “A prova pretendida, com a oitiva [testemunho] dessas duas testemunhas, é, portanto, manifestamente irrelevante, não se justificando a sua produção”.
O juiz aceitou que o deputado Paulo Pereira da Silva (SDD-SP) seja testemunha de Argolo -antes de perder a última eleição, o ex-deputado integrava esse partido.
Argolo é acusado de corrupção, lavagem de dinheiro, formação de quadrilha e peculato (desvio de recursos praticado por servidor público). O ex-deputado baiano é apontado pela Procuradoria como sócio oculto do doleiro Alberto Youssef numa empreiteira.
Conforme a denúncia, o doleiro bancava despesas do então deputado baiano, comprou-lhe bens caros -como um helicóptero e tratores de construção civil -e pagava uma mesada que variava entre R$ 30 a R$ 300 mil por mês, de acordo com o doleiro.
No curso da investigação, segundo a Procuradoria, foram identificados depósitos que totalizaram R$ 378 mil feitos pelo doleiro em contas de parentes, funcionários e empresas indicadas por Argolo.
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