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Veja o contraste entre extensão e ocupação da RMC |
Veja o contraste entre extensão e ocupação da RMC| Foto:
  • Saiba porque os limites da RMC não são geográficos, mas monetários e culturais
  • Veja quais as diferenças apontadas por moradores entre bairros da RMC

O Terminal Guadalupe, no Centro da cidade, é uma espécie de zona franca da região metropolitana de Curitiba, a RMC. Por ali, passam diariamente 80 mil pessoas, vindas de 14 municípios diferentes. O local, claro, é perfeito para avaliar a "temperatura" da população. Foi o que fez a reportagem da Gazeta do Povo. Para surpresa geral, em conversa com 20 usuários (leia quadro nesta página), nenhum disse sonhar com o dia em que a capital e suas vizinhas mais próximas vão se transformar numa grande massa urbana – o que são favas contadas.

A contar pela pequena amostragem, as preocupações são mais corriqueiras. Ao responder à pergunta "o que Curitiba poderia dividir com os municípios de onde quase 200 mil trabalhadores vêm todos os dias" as respostas foram feijão-com-arroz: providenciar mais ônibus. E facilitar o atendimento nas unidades da saúde. Poucos parecem acreditar num grande programa conjunto de educação, por exemplo, melhorando os índices da Lapa a Tunas do Paraná.

"Não adianta integrar. Somos muito diferentes. Cada cidade tem de encontrar suas soluções", bate o martelo a jovem Cristina Pacheco, de Colombo. "O ideal seria uma política única. Mas tudo é feito para dificultar. Vivemos perto, mas as distâncias entre os municípios são cada vez maiores", filosofa o segurança Rômulo Zaleski, 33 anos, uma espécie rara no Terminal Guadalupe. Ele mora no Uberaba e trabalha em Campina Grande do Sul, fazendo parte dos menos de 30 mil curitibanos que deslocam para trabalhar ou estudar na RMC. A relação, sabe-se, é de lá para cá e não vice-versa.

Nem Cristina nem Rômulo são sumidades em gestão urbana. Mas a opinião deles não difere muito dos debates feitos nas altas esferas. Tanto a Associação dos Municípios da Região Metropolitana (Assomec), quanto a Secretaria Municipal de Assuntos Metropolitanos – para citar duas – se batem com a dificuldade crônica de integração dos municípios, principalmente entre os que fazem parte do Primeiro Anel ou pólo Metropolitano, como Almirante Tamandaré e Campo Largo. (veja info)

Identidade

A questão não é só jurídica. A legislação brasileira prevê poucas alternativas de gestão integrada entre municípios que são unha-e-carne. O problema é de identidade. Mesmo entre as áreas mais próximas, a diversidade é gritante. Há os "rurais" Lapa, Contenda e Mandirituba; a emergente Fazenda Rio Grande; as "problemáticas" Colombo e Almirante Tamandaré; e a "narcisista" Curitiba, concentradora de recursos e historicamente hábil em jogar para a vizinhança parte de seus problemas.

Mas acabou o prazo de validade desse modelo. O advogado Domingos Caporrino Neto, 48, secretário municipal de Assuntos Metropolitanos, tem para si que existe uma possibilidade de cidades tão desiguais alcançarem um diálogo mais produtivo: identificando o que têm em comum. É um belo exercício e passa até por assuntos ordinários, como a ação da Defesa Civil. "Quando tem enchente o rio não escolhe o município", exemplifica. "Qualquer problema tem efeito colateral. Não tem como crescer sozinho. As demandas são muito grandes", afirma, com o dedo na ferida.

Caporrino se refere às limitações da gestão intermunicipal, "um nó", já que as iniciativas vivem sob o fogo cruzado dos interesse políticos. O prefeito de Fazenda Rio Grande, Antônio Wandscheer, 58, atual presidente da Assomec, sabe bem do que se trata. "O assunto tem de ser tratado de forma suprapartidária", comenta.

Em pouco tempo, uma pista de nove quilômetros projetada pelo governo do estado vai ligar o Parque Industrial de Fazenda a seu "modelo" – que não é Curitiba, mais a rica São José dos Pinhais, formando um novo nicho econômico. "Vamos ter linha direta com as montadoras. Mas na hora em que preciso de uma nova linha de ônibus, tenho de pedir para o prefeito de Curitiba", diz. Essa situação traduz bem o estado das coisas. Como se diz a boca-pequena, há consórcios no que interessa – como transporte e saúde – e silêncio para o que não interessa.

"Temos de enfrentar o egoísmo de cada gestor. As diferenças são muito grandes e geram problemas imensos de gestão pública. Araucária tem sete vezes a arrecadação de Fazenda. Dá para imaginar?", provoca Wandscheer. O enfrentamento também é assunto nas academias. O geógrafo Francisco Mendonça, da UFPR, figura entre os entusiastas da tática, a qual considera de urgência-urgentíssima. O modelo de gestão municipalista, afirma, repousa em algum lugar do século 19. "Está fadado ao fracasso", declara, chamando atenção para o que está debaixo dos narizes: Curitiba, Colombo, Campo Largo, São José dos Pinhais e Piraquara formam uma única mancha urbana. Há pelo menos uma dezena de áreas em comum.

"Só os prefeitos e vereadores não querem ver", alfineta Mendonça, para quem é preciso um marco – ou seja, uma ação que refaça o mapa metropolitano. Resta saber por onde esse desenho vai começar. Há quem aposte na gestão da água. Outros, no combate à violência. Ou ainda na unificação do sistema de saúde. Certeza, apenas, é que já passa da hora de Curitiba tricotar com as vizinhas.

Leia mais amanhã sobre integração da região metropolitana de Curitiba.

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