Temer e Dilma: peemedebista na vice é marca do tempo em que PMDB e PT mantinham sólida aliança; protestos de junho abalaram a relação| Foto: Ueslei Marcelino/Reuters

Morde e assopra

Direção do PT age para selar trégua, mas petistas seguem na contramão

Na contramão dos ataques peemedebistas, a direção nacional do PT vem agindo nos últimos dias para afagar o PMDB. O presidente do partido, Rui Falcão, divulgou uma nota na quarta-feira na qual reiterou a "firme disposição" de manter em 2014 a chapa com Michel Temer como vice-presidente de Dilma Rousseff. "Para desfazer informações desencontradas nos últimos dias, o PT vem a público reafirmar sua parceria governamental e aliança eleitoral prioritária com o PMDB", diz o texto. Apesar da iniciativa, na segunda-feira os petistas finalizaram um documento de análise sobre a conjuntura política pós-manifestações com críticas aos partidos aliados durante as gestões Lula e Dilma. Segundo o material, o PT e o governo vêm executando desde 2003 "uma política de alianças com parceiros que não se dispunham – nem se dispõem – a romper com os limites da institucionalidade conservadora". Líderes de partidos governistas, incluindo peemedebistas, não esconderam o mal-estar com a visão que o PT tem de seus aliados.

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20 senadores

...garantem ao PMDB a maior bancada do Senado e o controle da presidência da Casa. O PT tem 12 cadeiras a menos.

80 deputados

...colocam os peemedebistas como a segunda maior bancada da Câmara. A maior é a do PT, com 88 cadeiras.

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5 ministérios

...estão sob controle do PMDB – Agricultura, Aviação Civil, Minas e Energia, Turismo e Previdência.

5 governadores

...são filiados ao PMDB. Eles governam Rio de Janeiro, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Maranhão e Rondônia.

À esquerda: o peemedebista Sarney com Lula e Dirceu; ministro queria o PMDB na base desde o início do governo. Lula disse não e logo depois veio o mensalão. À direita: Collor deixa o Palácio do Planalto após o impeachment, quando o PMDB já estava fora do governo

Risco de o partido sobreviver longe do poder freia a ameaça de os peemedebistas deixarem a base de Dilma. Mas, nas duas vezes em que a sigla não esteve no governo após a redemocratização, o Planalto teve problemas: ocorreram o impeachment de Collor e o mensalão de Lula.

Presente em todos os governos desde a redemocratização da década de 1980, o PMDB está às voltas com a possibilidade de deixar a gestão Dilma Rousseff. O desgaste da relação com o PT cresceu após as manifestações de junho e vai passar por uma série de provas de fogo durante o retorno das votações do Congresso Nacional, a partir dos próximos dias. A situação coloca em xeque o consenso de que os peemedebistas são fundamentais para a governabilidade – e, por outro lado, se conseguiriam sobreviver longe do poder.

O principal foco de descontentamento do partido está na Câmara dos Deputados. "Hoje, se fizéssemos uma consulta interna para decidir se o PMDB deveria continuar na base ou sair, a bancada decidiria com folga pela saída", diz o deputado paranaense João Arruda. Segundo ele, há uma "insatisfação generalizada" com o governo, incorporada pelo líder do partido na Casa, Eduardo Cunha (RJ).

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O parlamentar carioca promete apresentar ainda neste mês uma proposta de emenda à Constituição (PEC) para reduzir de 39 para 25 o número de ministérios. A ideia também tem sido defendida abertamente pelo companheiro de legenda e presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (RN). Outras estocadas contra os interesses do PT são o apoio ao fim da reeleição, em pauta no grupo de trabalho da reforma política, e à proposta que obriga o governo a pagar as emendas parlamentares ao orçamento da União.

Além do vice-presidente Michel Temer, o PMDB está representado na gestão Dilma com 5 ministros (Agricultura, Aviação, Minas e Energia, Turismo e Previdência). Arruda admite que, apesar da discussão acalorada sobre a saída do governo, ninguém apresentou até agora uma estratégia para viabilizar a debandada. Internamente, deixar a base é tratado como algo diferente de ir para a oposição.

Sem rupturas

Doutor em ciência política pelo Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) e estudioso do sistema partidário brasileiro, Antônio Octávio Cintra cita que os peemedebistas nunca realizaram uma ruptura total com qualquer dos presidentes aos quais se aliaram. "No governo Fernando Henrique [1995-2002] aconteceu a mesma história que agora. Tanto que na sucessão de 2002 uma parte do partido ficou com a vice de José Serra [com Rita Camata] e outra com Lula, como foi o caso de Roberto Requião no Paraná", lembra o professor.

Nos últimos 28 anos de democracia, o partido só não teve representação nos ministérios na reta final da gestão Fernando Collor, em 1992, e no primeiro ano de mandato de Lula, em 2003. "Vale citar que o José Dirceu [então ministro da Casa Civil] havia sugerido ao Lula uma coalizão com o PMDB logo de cara, mas o presidente não quis. Depois do mensalão [esquema de compra de votos no Congresso montado em 2003 e que só estourou em 2005], as coisas só se acalmaram quando os peemedebistas ganharam mais espaço no governo", diz Cintra. Na época, o acordo com um PT encurralado rendeu ao PMDB o controle de mais dois ministérios – Saúde e Minas e Energia. Entre 2004 e 2005, a legenda só havia comandado as pastas das Comunicações e da Previdência.

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Atualmente, o possível racha do PMDB na Câmara não seria tão difícil de ser manobrado pelo PT – não fosse pelo alastramento da crise com outros aliados como PP e PDT. Hoje, apenas 91 deputados (18% do total de 513) fazem oposição ao governo. Desses, 49 são do PSDB, 28 do DEM, 11 do PPS e 3 do PSol.

Se toda a bancada de 80 membros do PMDB (a segunda maior, com oito a menos que o PT) se tornasse oposicionista, ainda assim o governo contaria com o apoio de 342 parlamentares (67% do total). O número continuaria garantindo com certa folga a aprovação de reformas por meio de PECs, que exigem 308 votos (três quintos do total).

No Senado, as contas são mais difíceis. Os peemedebistas têm a maior bancada, com 20 das 81 cadeiras – oito a mais que os petistas. Apesar de os senadores peemedebistas serem considerados mais amistosos com Dilma que os deputados, o cenário também é de dificuldade. Na quinta-feira passada, três senadores usaram a tribuna para atacar o governo – Ricardo Ferraço (ES), Roberto Requião (PR) e o presidente do PMDB, Valdir Raupp (RO). "A nave está desgovernada", disse Raupp. Nenhum deles, no entanto, falou em ruptura total. Perguntado no mesmo dia sobre o futuro de um governo sem o PMDB e de um PMDB sem governo, o senador paranaense Sérgio Souza brincou: "O PMDB não está no governo; o PMDB é governo".