Dilma não dá sinais de que fará mudanças
Apesar da reclamação intensa de governadores e prefeitos, a presidente Dilma Rousseff não dá sinais de que vai promover mudanças significativas nas políticas econômicas que afetam as receitas de estados e municípios.
Congresso
Novo FPE tende a favorecer estados populosos e pobres
Agência Estado
O líder do PT no Senado, Walter Pinheiro (BA), afirmou ontem que o projeto de lei por ele relatado que altera os critérios de distribuição de recursos do Fundo de Participação dos Estados (FPE) está "maduro" para ser votado pela Casa na volta do recesso parlamentar, no próximo mês. "Eu acho que está maduro para se chegar a um entendimento até fevereiro", afirmou.
Pela proposta de Pinheiro, a principal em discussão na Casa, a partir de 2013 o piso da arrecadação do fundo que será repassada aos estados permanecerá idêntico ao deste ano. O excedente do que for recolhido pelo FPE, segundo o parecer, será rateado até o final de 2014, ano eleitoral, tendo como base dois critérios: 50% da verba será proporcional à população de cada um dos estados e outros 50% serão inversamente proporcionais à renda domiciliar per capita do ano anterior (ou seja, estados mais populosos e mais pobres ganharão mais). A partir de 2015, novo critério terá de ser aprovado por outra lei, caso contrário, a regra proposta pelo líder do PT continuará em vigor.
A proposta de Pinheiro terá de passar por três comissões temáticas do Senado e pela Câmara dos Deputados para virar lei. Ele acredita que, pelo menos no Senado, a matéria tem condições de ser aprovada antes do meio do ano.
Origens
Fragilidade do federalismo brasileiro começou em 1889
A fragilidade do federalismo brasileiro remete ao próprio surgimento da República, em 1889. Ao contrário dos Estados Unidos, resultado da união das treze colônias autônomas, a federação brasileira foi instituída a partir de um Estado que já era único. Na proclamação da República, as províncias do Império foram transformadas em estados membros da federação e tiveram a autonomia ampliada. Ao longo do período republicano, houve a alternância entre momentos de mais e menos autonomia.
De acordo com o professor de Direito Mamede Said, da Universidade de Brasília, aí está a raiz da fragilidade de estados e municípios. "A grande concentração de poderes da União é característica do surgimento da nossa federação", diz ele.A consequência mais evidente da diferença de formação entre o Brasil e os EUA, por exemplo, está na liberdade legislativa de cada país. Junto com a reeleição de Barack Obama, em novembro passado, americanos de diversos estados votaram pela legalização ou proibição da maconha, da pena de morte, do aborto e até da eutanásia. No Brasil, a maioria das questões é disciplinada por leis federais. A centralização se repete na gestão dos recursos.
O atual engessamento financeiro dos estados e municípios tem origem na Constituição de 1988. O modelo centralizador da nova carta definiu regras mais claras para as atribuições da União e criou responsabilidades para estados e municípios, como a obrigatoriedade de aplicar determinado porcentual de suas receitas em saúde e educação, por exemplo. Mas concentrou a arrecadação na União.
Contrariando sentença do Supremo Tribunal Federal (STF), a União vai depositar hoje na conta dos governos estaduais a primeira parcela do Fundo de Participação dos Estados (FPE) deste ano. Encontrar uma argumentação jurídica para "driblar" o Supremo e fazer o depósito foi a solução encontrada pelo governo federal para que muitos estados não quebrassem. Será uma solução paliativa, já que quase todos os governos estaduais enfrentam problemas de caixa devido, em grande medida, às distorções do federalismo brasileiro, que concentra na União a arrecadação nacional.
Em 2010, o STF havia declarado inconstitucionais as regras de divisão do FPE e determinado que uma nova partilha fosse votada pelo Congresso até 31 de dezembro de 2012. Sem consenso, isso acabou não sendo feito pelos parlamentares o que, em tese, significaria que os repasses da União teriam de cessar a partir deste mês. Mas o governo federal decidiu fazer o depósito com base no argumento jurídico de que o repasse de hoje se refere à arrecadação de dezembro e que, nesse caso, as regras ainda seriam válidas.
Ainda há dúvida sobre o que a União fará em fevereiro. Mas ganhou tempo para não desagradar aos estados. A perda do dinheiro do FPE traria um imenso desgaste político para a presidente Dilma Rousseff diante de todos os governadores. Eles já reclamam fortemente de que os incentivos fiscais concedidos pelo governo federal para estimular a economia provocam perdas também para a arrecadação dos estados. Quando a União abre mão de um tributo, obriga os governos dos estados a também renunciar àquela receita, pois os uma parcela dos impostos federais necessariamente tem de ser partilhada com os estados e os municípios, que também enfrentam dificuldades financeiras.
As desonerações tributárias da União vêm sendo rotineiras desde que eclodiu a crise econômica internacional, em 2008. No ano passado, elas somaram R$ 45 bilhões, quase o mesmo valor do FPE de 2011, cujos repasses aos estados chegaram a R$ 48 bilhões.
No início dessa política de desonerações, o Planalto se mobilizou para dar compensações aos estados. Mas isso não ocorre mais. Além disso, a União consegue perder arrecadação de impostos porque compensa com as contribuições sociais tipo de tributo que, legalmente, não precisa partilhar com estados e municípios. É o caso da Cide, o imposto sobre os combustíveis.
O economista Gabriel Leal de Barros, do Ibre/FGV e autor de um recente estudo sobre pacto federativo no Brasil, explica que os tributos que fornecem as principais receitas que alimentam o FPE e o FPM (Fundo de Participação dos Municípios) são o Imposto de Renda e o Imposto sobre Produtos Industrializados. Mas, ao longo dos anos, o maior esforço de arrecadação da União tem sido justamente sobre as chamadas contribuições sociais. Segundo cálculos da FGV, de 1997 a 2011, a arrecadação com impostos federais subiu 1,9 ponto porcentual algo como R$ 203 bilhões. Já a arrecadação das contribuições subiu 2,1 pontos, chegando a R$ 175 bilhões.
O economista José Roberto Afonso considera que a União precisa ser mais generosa na divisão dos tributos. Ou seja, incluir no bolo do FPE e do FPM as contribuições e não apenas impostos. "É preciso discutir o tamanho do bolo e como se distribui esse bolo", diz o economista.
Outro problema dos estados e municípios é o perfil de seus gastos. Enquanto a União tem margem para usar a arrecadação com políticas públicas e investimento, governos estaduais e prefeituras têm usado grande parte da receita para fazer funcionar programas nacionais e cumprir as premissas da Constituição para depesas em saúde e educação.
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