A operação Fonte de Ouro, desencadeada pelo Grupo de Atuação Especial e Combate ao Crime Organizado (Gaeco) na quinta-feira (30), apura contratos do Instituto das Cidades Inteligentes (ICI, antes conhecido como Instituto Curitiba de Informática) com a prefeitura da capital paranaense desde 2009 até agora. Um dos principais alvos das investigações é a subcontratação de empresas para a realização de serviços que, contratualmente, eram de responsabilidade do ICI.
O instituto confirma que essas subcontratações – ou parcerias e integrações com a cadeia produtiva, como o instituto prefere chamá-las – ocorreram, mas nega que tenha havido qualquer ilegalidade neste processo. A apuração deve passar pelas gestões de Beto Richa (PSDB), Luciano Ducci (PSB) e Gustavo Fruet (PDT).
Os principais fatos que embasaram a apuração inicial são correspondentes aos dois antecessores de Fruet. Apesar disso, a prorrogação de contrato realizada em dezembro do ano passado deverá também ser passada a limpo. Essa etapa, no entanto, deverá depender do conteúdo apreendido no ICI.
As informações foram divulgadas pelo promotor do caso, Felipe Lamarão, que concedeu entrevista à reportagem da Gazeta do Povo no final da manhã desta sexta-feira (1º). Equipes do Gaeco continuam até agora no ICI fazendo uploads de documentos digitais, que somarão um total de 7 terabytes (TB) de arquivos digitais.
“Quarteirização”
Toda investigação partiu de um inquérito civil aberto na Promotoria de Proteção ao Patrimônio Público de Curitiba. Em 2011, quando Lamarão lá estava, uma auditoria do Ministério Público do Paraná (MP-PR) já apontava irregularidades nos contratos entre prefeitura e ICI.
“Os contratos diziam que o ICI tinha que executar ele mesmo o objeto, salvo autorização expressa da prefeitura de Curitiba. A prefeitura nunca autorizou isso. A gente está focado no contrato de gestão em 2010 até agora, mas estamos puxando desde 2009 até agora. É uma investigação documental bastante complexa. O ICI passou ‘quarteirizar’ isso para empresas privadas”, afirmou o promotor.
Em 2014, quando chegou ao Gaeco, Lamarão e a equipe do grupo verificaram reflexos criminais nos contratos. Entre as suspeitas estavam a presença de pessoas ligadas ao ICI que participavam também das empresas subcontratadas pelo instituto.
“A gente conseguiu constatar que várias destas empresas eram de pessoas que tiveram relação formal com o ICI. Eles até se afastaram delas, mas se afastaram só formalmente?”, questionou o promotor. Além do ICI, o Gaeco cumpriu mandados de busca e apreensão nas empresas Minauro, Horizons, Consult, Inteligence Business e Ciclo.
Segundo o ICI, as duas últimas não prestam serviços ao ICI referentes ao contrato com a prefeitura – elas seriam de propriedade de diretores do instituto. As três primeiras são de propriedade do empresário Haroldo Jacobovicz.
No final do ano passado, relatório do Tribunal de Contas do Paraná (TC) apontou mais de 400 irregularidades nos contratos. “Trouxe coisas novas e corroborou muitas que já tínhamos. Há fortíssimos indícios que houve dano ao erário”, disse. Agora o Gaeco pretende quantificar o quanto as empresas subcontratadas receberam e mostrar as relações entre elas e o ICI.
“Se isso pode ser autorizado por empresa privada, por que a prefeitura não licita e não contrata direto? Evidente que o ICI não vai repassar pelo mesmo valor. Vai haver um deságio. A gente quer saber onde está essa diferença”, afirmou o promotor.
Por meio de sua assessoria de imprensa, o ICI declarou que estabelece “parcerias com a cadeia produtiva nacional de Tecnologia da Informação e Comunicação”. “O ICI cumpre com todas as obrigações contratuais esperadas pelo ente público, exercendo suas atividades dentro das normativas aplicáveis às Organizações Sociais, regulamentadas sob a ótica do Direito Privado”, diz a nota.
O instituto diz, ainda, que segue subcontratando parte dos serviços prestados à prefeitura. “Os serviços derivados da integração com a indústria da tecnologia da informação e comunicação são de total ciência da Prefeitura de Curitiba, muitos dos quais são oriundos desde sua fundação”, diz.
Prefeitura fala em construir autonomia
Segundo Paulo Miranda, atual secretário de Tecnologia e Informação (STI), a prefeitura tinha conhecimento da existência de “quarteirizações”, mas não tinha acesso aos detalhes desses acordos. Por causa disso, a administração municipal solicitou cópias desses acertos e, diante da negativa por parte do ICI, recorreu à Justiça – a ação ainda está em tramitação.
Logo, segundo Miranda, a prefeitura não tem conhecimento das empresas que prestam esses serviços ao ICI e dos contratos do instituto com esses fornecedores – ainda que prestem serviço indiretamente à prefeitura.
Apesar desse e de outros problemas na relação entre o instituto e a prefeitura, os dois lados decidiram renovar o contrato por mais um ano, no final de 2015. Segundo Miranda, era a única opção possível. “Infelizmente, herdamos uma situação de absoluta dependência do ICI por parte da prefeitura. Estamos construindo essa autonomia, mas isso leva tempo”, afirma.
Entre as medidas tomadas pela prefeitura para modificar sua relação com o ICI, segundo Miranda, está a criação da STI, a capacitação de servidores do quadro municipal para atuar nesse setor e a licitação para a contratação de empresas de desenvolvimento de softwares para modernizar a área de TI da prefeitura. Essa licitação, porém, foi suspensa pelo próprio TC.
Já Ducci se manifestou através de sua assessoria de imprensa. De acordo com ele, todos os termos do contrato assinado com o ICI passaram por análise jurídica, financeira e técnica de funcionários de carreira da prefeitura.
Pedidos de prisão negados
Além da operação de busca e apreensão, o Gaeco pediu a prisão temporária de cinco dias de Jacobovicz e do presidente atual do instituto, Luís Mário Luchetta, durante as investigações. O juízo da 6.ª Vara Criminal de Curitiba, no entanto, negou as solicitações.
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