12 militares e políticos brasileiros fazem parte da lista de 140 pessoas de toda a América Latina envolvidas nos crimes apontados pelo Ministério Público italiano. Justiça local, porém, reduziu rol de acusados para 35 nesta primeira etapa de julgamento.
Julgamento
Ex-coronel uruguaio acusado de mortes vive no Brasil
Um dos 35 militares e políticos sul-americanos que o Tribunal de Roma vai julgar pelo assassinato e desaparecimento de cidadãos italianos durante a Operação Condor vive em Santana do Livramento, no Rio Grande do Sul. É o ex-coronel uruguaio Pedro Antonio Mato Narbondo. O Movimento de Justiça e Direitos Humanos (MJDH), que informou o paradeiro do militar em janeiro, também já soube que a Justiça italiana pedirá a extradição dele ao Brasil.
"Como ele é filho de mãe brasileira e tem cidadania brasileira, o Brasil não vai extraditá-lo. Mas, ao receber a acusação, terá de julgá-lo aqui", prevê Jair Krischke, presidente do MJDH, referindo-se aos impedimentos e possibilidades legais para o caso. Além da Itália, Narbondo é réu em processos judiciais na Argentina e no Uruguai por participação em operações de assassinato de políticos e sequestros de militantes contrários ao regime uruguaio em 1976.
Depois de 15 anos de investigações, vai começar na Itália o maior julgamento internacional sobre crimes cometidos pelos regimes militares da América do Sul nos anos 70 e 80, dentro da ação repressiva que ficou conhecida como Operação Condor. Focado na morte de 23 pessoas de cidadania italiana, o processo foi aceito pelo Tribunal de Roma. Ele acusa 35 militares e políticos latino-americanos por crimes contra a humanidade e pode condená-los até mesmo à prisão perpétua.
Duas dessas 23 vítimas teriam sido sequestradas no Brasil e depois assassinadas. No entanto, nenhum militar brasileiro está na lista dos réus, embora os documentos mencionem uma dezena deles entre os quais os então presidentes Ernesto Geisel (1974-1979) e João Baptista Figueiredo (1980-1985), já mortos. A Operação Condor, criada em 1975 e que se estendeu até meados dos anos 80 , reuniu militares de Argentina, Brasil, Chile, Uruguai, Paraguai e Bolívia numa operação conjunta e sem fronteiras, com colaboração da CIA, agência de espionagem americana, para o combate às guerrilhas e outros movimentos de resistência à ditadura militar que dominava esses países.
Lista
Em 2005, o MP italiano chegou a uma primeira lista de indiciados um total de 140 militares e políticos de toda a América Latina. Doze brasileiros faziam parte da lista. Além de Geisel e Figueiredo, os generais Antonio Bandeira, Edmundo Murgel e Henrique Domingues, o delegado Marco Aurélio da Silva Reis e Euclydes de Oliveira Figueiredo Filho.
A Justiça italiana, porém, decidiu reduzir o âmbito do julgamento, nesta primeira etapa, e limitou a lista dos acusados aos países onde sabe que poderá contar com a colaboração dos governos e nos quais se configurou uma responsabilidade direta pelas mortes. Assim, a lista de julgados tem 17 uruguaios, 12 chilenos, 4 peruanos e 2 bolivianos. Pesam sobre eles acusações de crimes contra a humanidade sequestro, assassinato e desaparecimento forçado.
A lista que se confunde com a história do Cone Sul entre os anos 70 e 80 inclui generais que estiveram na cúpula do poder em quatro países: Uruguai, Chile, Peru e Bolívia. Do Uruguai, por exemplo, serão julgados o ex-presidente Juan María Bordaberry e o general Iván Paulós, chefe do Serviço de Informações e Defesa (SID). Do lado chileno, o general Sergio Arellano Stark, considerado como o comandante das "Caravanas da Morte" uma operação que percorria o país para assassinar presos políticos e Manuel Contreras, chefe do serviço secreto de Augusto Pinochet.
Trâmites
Até julho, o Tribunal de Roma realiza audiências fechadas e preliminares. A partir do segundo semestre, o julgamento abre suas portas e começam os depoimentos de várias partes.
O julgamento deve demorar cerca de dois anos, já que o caso terá de passar por três instâncias. Nenhum dos acusados estará presente ao julgamento. Mas, terminado o processo e em caso de condenação, o juiz poderia pedir a extradição do militar para que cumpra sua pena na Itália. Procurados, nenhum dos advogados dos acusados respondeu aos pedidos de entrevista.
Morte de dois argentinos envolveu o governo brasileiro
No dia 12 de março de 1980, Horário Campiglia foi sequestrado no Aeroporto do Galeão, no Rio de Janeiro. Ele chegava do Panamá. O argentino com nacionalidade italiana era do comando dos Montoneros organização político-militar argentina de guerrilha urbana.
Horário foi preso com sua companheira, Mónica Pinus de Binstock. A inteligência argentina havia recebido informações de que ambos, que viviam no México, estariam planejando uma volta a Buenos Aires a fim de poder liderar as ações a partir de território argentino. Ambos foram capturados, levados de volta à Argentina em um C-130 das Forças Aéreas do país vizinho e encaminhados para a prisão clandestina Campo de Mayo. Horário jamais reapareceria.
Uruguaiana
No dia 26 de maio de 1980, o argentino Lorenzo Viñas foi sequestrado em Uruguaiana, no Rio Grande do Sul, e jamais seria visto de novo. Ele também era militante dos Montoneros. Estudante de Ciências Sociais, Lorenzo se exilou no México em 1976, viajando com sua mulher, Claudia Olga Allegrini. Em 1979, o casal voltou para a Argentina. Mas a perseguição continuou e os dois optaram por buscar novo exílio. Desta vez, o destino seria a Itália, já que o militante também tinha nacionalidade italiana. Lorenzo embarcou de ônibus em Buenos Aires em direção ao Rio.
Sua mulher faria o mesmo percurso um mês depois e o plano era que se encontrassem no Rio. Mas ela jamais o encontraria.