O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, afirmou nesta quarta-feira (2) que o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), foi o responsável por montar a estratégia e usou o mandato para “restabelecer o propinoduto” que se instalou em dois contratos de navios-sonda da Petrobras.
O argumento foi utilizado por Janot ao defender que o Supremo Tribunal Federal (STF) receba a denúncia e torne Cunha réu, respondendo pelos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro. Neste caso, o peemedebista é acusado de receber US$ 5 milhões em desvios de recursos da estatal.
Segundo Janot, o lobista Júlio Camargo acertou com o também lobista Fernando Soares, o Baiano, o pagamento de US$ 40 milhões em propina para vários políticos e funcionários da Petrobras, mas uma dúvida jurídica sobre o contrato suspendeu o pagamento. Os dois são delatores da Lava Jato.
‘Propinolândia’
“Tudo ocorria bem na propinolândia. Quando surge dúvida jurídica no contrato de comissionamento de Júlio Camargo, foi submetido a foro internacional e suspenso pagamento. Com a suspensão, Baiano se movimenta para exigir o restabelecimento do pagamento [de propina] chegando ao ponto de dizer: ‘tenho compromisso com o deputado Eduardo Cunha’. Deve pagar porque tenho compromisso com ele”, afirmou Janot aos ministros.
A Procuradoria afirmou ainda que Baiano fez um acerto para restabelecer a cobrança da propina e Cunha “engendrou a fórmula através da qual ele restabelecia o propinoduto”, usando requerimentos contra as empresas envolvidas, que foram apresentados pela ex-deputada Solange Almeida (PMDB-RJ), que também é denunciada com o presidente da Câmara.
Janot destacou que os contratos da Petrobras que teriam beneficiado o esquema somaram US$ 1 bilhão e “supera e muito orçamento do Ministério Público”.
“Houve o pagamento de propina, ambos utilizaram do cargo para pressionar pagamento de propina, Cunha recebeu no mínimo US$ 5 milhões e eles indicaram forma de lavagem de dinheiro”, afirmou o procurador-geral.
Janot defendeu que a denúncia não está embasada apenas nas delações de Julio Camargo e Baiano.
“Quero reafirmar que essa denúncia não se assenta nos depoimentos de colaborações que foram realizadas mas em farta provas que delas resultou”.
Janot ainda recomentou uma leitura atenta do julgamento de Sócrates no mito de Hermes, quando foram defendidos dois atributos especiais para que houvesse êxito na prática lícita da política. Para organizar a sociedade seriam necessários esses os predicados: respeito ao direito alheio e à justiça e a capacidade de se envergonhar.
A Procuradoria aponta que Cunha recebeu US$ 5 milhões em propina para garantir dois contratos assinados pela Petrobras em 2006 e 2007, para fornecimento de navios para exploração de petróleo.
Delações premiadas
As acusações da denúncia, que foram apresentadas em agosto de 2015, são baseadas principalmente nas delações premiadas dos lobistas Camargo e Fernando Baiano. Camargo representava a coreana Samsung Heavy Industries e a japonesa Mitsui nos contratos. Baiano é apontado como lobista do PMDB.
Camargo disse que acertou com Baiano uma propina de US$ 40 milhões para obter os contratos. Segundo Camargo, o dinheiro seria repassado a Cunha e ao ex-diretor da área internacional da Petrobras Nestor Cerveró. Baiano e Cerveró estão presos em Curitiba.
A Procuradoria obteve provas de vários pagamentos feitos por Camargo a Baiano no exterior, mas não identificou contas controladas diretamente por Cunha que tenham recebido repasses. Segundo a Procuradoria, os pagamentos ao deputado foram feitos em espécie, no Brasil mesmo.
Para Janot, ficou comprovado que o parlamentar foi o verdadeiro autor de dois requerimentos protocolados na Câmara em 2011 por Solange Almeida contra as empresas para pressionar Camargo para não interromper o pagamento de propina.
A defesa de Cunha nega o recebimento de propina, diz que delatores foram pressionados pela PGR a citar Cunha e sustenta que não há provas de que o dinheiro foi para o peemedebista. Os advogados pedem ainda que o STF paralise o inquérito, uma vez que, por ser o terceiro na linha sucessória da Presidência da República, o peemedebista não poderia ser processado por fatos estranhos ao exercício de seu cargo.
Cunha ainda acusa PGR de perseguição e agir em conluio com o governo para prejudicá-lo, uma vez que impôs significativas derrotas e rompeu com a presidente Dilma Rousseff.
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