O Ministério Público da Suíça fechou um acordo com a Procuradoria-Geral da República (PGR) para transferir ao Brasil “milhares” de documentos, extratos e informações sobre as contas envolvendo políticos e outros suspeitos na Operação Lava Jato.
Pelo entendimento informal, o Brasil será autorizado a usar os dados para processar suspeitos não apenas por corrupção, mas também por sonegação fiscal e evasão, ligados a com pelo menos US$ 800 milhões depositados no país europeu.
O acordo foi fechado na quinta-feira (17) numa reunião de quatro horas entre o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, e Michael Lauber, seu homólogo suíço. Para o país europeu, que não penaliza a sonegação no exterior por um estrangeiro, o entendimento é “revolucionário” e permitirá que “dezenas de suspeitos” sejam punidos.
Os suíços informaram que já bloquearam US$ 800 milhões em mais de mil contas suspeitas. Os correntistas são políticos, executivos e doleiros envolvidos na Lava Jato. Fontes em Berna, porém, temiam que, para chegar às provas sobre corrupção, os processos poderiam levar anos.
Uma forma de acelerar o trâmite desses casos é identificar o crime como sonegação, levando em conta as centenas de contas não declaradas. “Como é que o Al Capone foi pego?”, comentou uma fonte em Berna, em referência ao gângster americano que foi preso pelos crimes contra o Fisco dos Estados Unidos.
Para isso, porém, o Brasil fará uma consulta formal aos suíços sobre a possibilidade de usar os extratos bancários para abrir inquéritos não apenas por corrupção, mas também por evasão fiscal.
A aceitação por parte dos suíços, já confirmada na reunião de quinta-feira, vai ser enviada ao Brasil por meio de uma nota diplomática. “Será uma avalanche de processos”, na definição de um dos participantes do encontro.
Investigadores apontam que, das mil contas já identificadas, o trabalho para traçar a origem do dinheiro pode ainda levar “meses, senão anos”. O que surpreendeu os especialistas suíços é a rede de empresas offshore, doleiros e intermediários envolvido nos casos, o que dificulta a identificação da origem dos ativos. Com a acusação simples de sonegação, o mero fato de a conta existir já é suficiente para que haja um inquérito.
Nem brasileiros nem suíços aceitaram por enquanto revelar os nomes dos políticos envolvidos. “Mas a lista abarca todo o cenário partidário brasileiro”, indicou uma fonte em Berna que acompanha o caso.
‘Modelo Cunha’
O modelo usado para a autorização de usar os extratos por sonegação partiu do caso do presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha. Janot já havia feito uma consulta no mês passado sobre a possibilidade de usar os documentos do deputado para o acusar de sonegação, o que foi liberado pelos suíços. Com o sinal verde obtido, Janot partiu para um pedido amplo para que todos os casos possam seguir esse benefício.
Outro acordo que começa a ser costurado por brasileiros e suíços é a transferência completa de investigações de Berna para Brasília. Para os suíços, suspeitos brasileiros dificilmente serão presos, já que não mais farão viagens para o país europeu. Ao transferir os casos ao Brasil, Berna abre mão de sua jurisdição e envia toda a documentação bancária colhida.
Uma vez mais, o modelo é de Eduardo Cunha. Fontes do MP suíço confirmaram ao jornal O Estado de S. Paulo que, no acordo, ficou estabelecido que o Brasil teve acesso a todos os documentos de todas as movimentações bancárias das empresas offshore que são suspeitas de terem sido criadas para abrigar as supostas propinas recebidas pelo deputado – o que ele nega.
Para os suíços, porém, a transferência também faz sentido. Berna alega que, com Cunha e sua família no Brasil, as chances de o prenderem na Suíça ou interrogarem o político na Europa são reduzidas.
Pelo menos mais dois casos devem chegar à PRG em Brasília até meados dos ano. E todos poderão ser investigados por sonegação, além de corrupção.
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