O jornalista Amaury Ribeiro Júnior afirmou, em entrevista ao G1, que foi ele próprio quem convidou o delegado Onézimo Sousa para participar da reunião do caso do suposto dossiê - a suspeita de montagem, por uma ala da pré-campanha de Dilma Rousseff (PT) à Presidência, de um grupo para espionar adversários e rivais petistas. A afirmação diverge do que havia afirmado, em nota, outro envolvido no caso, o jornalista Luiz Lanzetta.
Delegado aposentado da Polícia Federal, Onézimo Sousa foi chamado, segundo Ribeiro Jr., para ajudar a apurar a origem do vazamento de informações do comitê da pré-campanha de Dilma. Ribeiro Jr. é um dos presentes à reunião ocorrida em 20 de abril em Brasília para discutir a eventual montagem de uma equipe de investigação sobre funcionários de uma das sedes da pré-campanha petista, em razão de suspeitas de vazamento.
"Foi convidado por mim", disse Ribeiro Jr. ao G1, em referência ao delegado da PF. "Conheço o pessoal da área [de inteligência]. O Lanzetta é empresário e pediu ajuda", declarou.
No último 5, o jornalista Luiz Lanzetta, cuja empresa prestava serviços para a pré-campanha, divulgou nota na qual dizia ter sido procurado pelo delegado na segunda metade do mês de abril.
Segundo a nota, Sousa apresentou um "projeto de trabalho", detalhado em um encontro dias depois, em um restaurante, em Brasília. A proposta, de acordo com Lanzetta, era de "monitoramento de adversários" que estariam produzindo dossiês contra a campanha de Dilma.
Furto
Ribeiro Jr. afirmou ainda na entrevista ao G1 que teve dados furtados de seu computador pessoal quando estava hospedado em um hotel em Brasília.
Os dados furtados, afirma Ribeiro Jr., fazem parte de livro de sua autoria, ainda não publicado, sobre o processo de privatizações dos governos de Fernando Henrique Cardoso (1995-2002).
Em entrevistas ao G1 na quarta (9) e quinta-feira (10), o jornalista sugeriu que a subtração dos dados de seu computador seja consequência da disputa de poder na pré-campanha de Dilma entre as alas paulista e mineira do PT, essa última encabeçada pelo ex-prefeito de Belo Horizonte Fernando Pimentel, também coordenador da pré-campanha.
Ribeiro Jr. enumera o que, segundo ele, seriam duas evidências do furto de dados.
Diz que o material apareceu na redação da revista "Veja", a primeira a publicar informações sobre a disputa de poder na pré-campanha do PT, sem que ele o tenha divulgado para ninguém. Afirma ainda que o vazamento ocorreu enquanto estava hospedado em um hotel de Brasília que, dias antes, havia abrigado representantes da ala paulista do partido.
Ribeiro Jr. diz não saber precisar as datas de sua hospedagem. Afirma que sua hipótese é que alguém tenha entrado em seu quarto, manipulado o computador e levado os dados. O hotel informou não ser possível acessar as datas de estadia de hóspedes que já deixaram o local.
Por meio de sua assessoria, o deputado estadual Rui Falcão (PT), um dos coordenadores da pré-campanha de Dilma e membro da ala paulista da equipe, negou envolvimento no episódio relatado por Ribeiro Jr.. Confirmou ter se hospedado no hotel em Brasília e questionou o relato do jornalista. Sem as datas, afirmou a assessoria, qualquer hóspede do hotel nos últimos 12 meses poderia ser considerado "suspeito".
Histórico
Jornalista investigativo vencedor de três prêmios Esso, um dos principais do jornalismo brasileiro, Ribeiro Jr. diz ter sido sondado para trabalhar na pré-campanha de Dilma pelo jornalista e consultor Luiz Lanzetta, dono da Lanza. Até o último sábado (5), a Lanza respondia pela comunicação da pré-campanha de Dilma, tendo sido conduzida à função por Pimentel, amigo de Lanzetta.
O objetivo único do trabalho, diz Ribeiro Jr., era identificar a fonte de vazamentos de informações dentro de um dos QGs da pré-campanha, uma casa no Lago Sul de Brasília. Afirma que o conteúdo de conversas em reuniões fechadas estava chegando à imprensa, municiando reportagens prejudiciais a Lanzetta, a Pimentel e ao chamado grupo mineiro.
Ribeiro Jr. diz então ter contatado Idalberto Matias, o "Dadá", ex-agente do serviço secreto da Aeronáutica e "amigo de muitos anos", para ajudar na tarefa. Dadá, afirma, o apresentou ao delegado aposentado da Polícia Federal Onézimo das Graças Sousa.
Em entrevista publicada na revista "Veja" no último final de semana, o delegado Onézimo disse que a proposta para montar um dossiê contra Serra e espionar possíveis traidores dentro da campanha petista teria partido de Lanzetta, que nega a afirmação. Ao G1, Lanzetta disse que a proposta, recusada, foi feita por Onézimo.
Já Ribeiro Jr. é impreciso ao falar sobre o tema. Diferentemente de Lanzetta, diz que Onézimo não ofereceu serviços de espionagem, mas citou, durante reunião, suposto serviço de inteligência no PSDB que seria operado pelo deputado Marcelo Itagiba (PSDB-RJ).
O deputado Itagiba nega operar grampos para o PSDB e entregou nesta quinta-feira (10) notícia-crime à Polícia Federal sobre o episódio. Pede que a PF investigue indícios de formação de quadrilha na reunião em que teria sido discutida a espionagem.
Confira trecho da entrevista do jornalista:
Quem trouxe esse assunto, quem ofereceu o serviço para eventualmente produzir informações sobre Serra foi o Onézimo?Amaury Ribeiro Júnior - Não. Onézimo chegou e falou na reunião que sabia que tinha um povo de inteligência [no PSDB]. Como ele já tinha trabalhado [na área de inteligência], ele tinha condição de fazer isso. Que foi pessoa do Marcelo Itagiba, ele contou [Onézimo, que não foi localizado pelo G1, nega ter trabalhado com o deputado].
Ele [Onézimo] não ofereceu nenhum tipo de serviço?
Não. Eu liguei para o Dadá [Idalberto Matias], que é meu amigo há muitos anos, [dizendo] que precisava de uma pessoa pra saber o que tinha acontecido na casa. Quem estava lá vazando. Pedimos pro Dadá, que é meu amigo há muitos anos, uma pessoa pra fazer esse trabalho.
Jornalista nega dossiê
O jornalista Ribeiro Jr. nega que houvesse intenção de usar na campanha o material de suas apurações anteriores, mas reconhece que uma prévia do livro não publicado vazou por iniciativa do grupo de Lanzetta.
Ribeiro Jr. diz que o trabalho sobre as privatizações foi feito quando estava no jornal "Estado de Minas", que deixou em novembro de 2009 em razão, afirma, da morte de seu pai.
Leia outros trechos da entrevista com o jornalista:
Como foi sua participação na pré-campanha?
Estava vazando muita informação dentro da casa. Roubo de relatório, roubaram o cartão do delegado [Onézimo]. Ele deu um cartão de visita naquela reunião, e esse cartão desapareceu e apareceu dentro da revista [Veja].
Era o principal indício que haveria espionagem na casa?
Tanto é que ele [Onézimo] acha, quando ele falou aquela mentirada lá [entrevista à "Veja" em que diz ter recebido proposta de Lanzetta para monitorar José Serra], que isso aconteceu porque nós estávamos armando pra ele. Se você pegar a história toda, estavam armando pra o [Fernando] Pimentel havia mais de três meses.
Havia então uma briga da ala paulista com ala mineira do PT?
Isso é claro que havia, eu vi. Havia sim. Vou contar no meu livro. Tinha lá o pessoal do [Rui] Falcão, do [Valdemir] Garreta [ex-secretário de Marta Suplicy na Prefeitura de São Paulo], do Marcelo Parada [assessor da pré-campanha].
E como se dava essa disputa?
Aconteceu o seguinte: na fase de pré-campanha, o Pimentel montou a estrutura de comunicação, o grupo de internet, montou através da Lanza, colocou o [Luiz] Lanzetta e tudo. E aí já estava estruturado o pessoal das casas, as três casas, quando o pessoal de São Paulo chegou, o povo do Rui Falcão, do Garreta.
Esse pessoal chegou e daí?
Chegaram a ter uma discussão com o Lanzetta, e começaram a minar, começou todo dia sair matéria contra o Pimentel na imprensa. Também não gostavam dessa coisa da comunicação não estar com eles, porque quem contratava tudo era a Lanza. Chegou a um ponto em que começou a ter sabotagem dentro da casa, vazava tudo para a imprensa. Aí começou essa história do fogo amigo. Pegaram o cartão desse delegado [Onézimo].
E quando você começou a trabalhar na pré-campanha?
Nem comecei. Fiquei um mês, dois meses. Depois da segunda reunião [com Onézimo], três semanas depois já estava nas páginas da "Veja".
E o motivo da reunião [entre ele, Onézimo, Idalberto Matias, Luiz Lanzetta e Benedito de Oliveira Neto, empresário participante da pré-campanha], qual foi?
Era justamente pra ver quem estava vazando. E ele [Onézimo] trouxe aquela história, do [deputado Marcelo] Itagiba. A primeira reunião foi no [restaurante em Brasília] Fritz. Fomos eu, Lanzetta, Dadá, o delegado [Onézimo] e o Benê [Benedito de Oliveira Neto]. Na segunda fomos só eu, o delegado e o Dadá.
Quem propôs a reunião de informações contra a candidatura do Serra? Como isso surgiu na conversa?
Isso é invenção, é mentira dele [Onézimo]. O que tinha na conversa era um sistema de proteção da casa. Para ver como vazou a informação. E como ele trabalhou com o Itagiba, que seria o homem da inteligência do [José] Serra, mostrar o que ele tinha de proteção pra gente.
O delegado foi convidado por quem?
Foi convidado por mim. Conheço o pessoal da área [de inteligência]. O Lanzetta é empresário e pediu ajuda. Não tem nada a ver com o Pimentel essa história.
Você estava trabalhando com o Lanzetta por ter essa apuração sobre o processo de privatização?
Isso não tem nada a ver. É outra coisa, nesse momento não tem nada a ver. Aí pegaram, sabiam que eu estava, invadiram onde eu estava, pegaram informação. Isso é outro negócio. E como eu soube que tinham pegado? Porque eu nunca tinha passado isso pro Lanzetta. Como não passei pra ele, percebi que tinham roubado.
Roubaram seu computador?
Matérias que eu tinha feito antes, documentos que estavam no meu computador. Cheguei a Brasília, fiquei em um hotel que era um QG da pré-campanha. E onde o pessoal do "fogo amigo" paulista também estava. E os documentos apareceram com um repórter da "Veja". E o deputado [Rui Falcão] esteve hospedado nesse hotel, no mesmo quarto, dias antes, soube depois.
Mas qual é a sua hipótese para o furto de material do seu computador?
Entraram no quarto e tiraram as matérias do computador.
Na sua avaliação o Pimentel sabia da sua apuração?
Não, isso pra mim foi coisa da Lanza, foi uma coisa que ele [Lanzetta] que fez. Ele me chamou, e o Benedito foi lá porque ele é chefe do Lanzetta e administrava a casa. Foi lá para ver isso. É uma coisa nossa. Que não fechou, porque é uma coisa perigosa. Mas de concreto é que houve espionagem mesmo, depois que contrataram a Lanza. Isso aconteceu. Me falaram que tinha grampo telefônico mesmo, que tinha tudo. Então essa matéria da "Veja" é fruto de sabotagem, de coisas que foram roubadas lá dentro.
A sua apuração do processo de privatizações poderia ser eventualmente usada na campanha? Isso era cogitado?
Não, porque o material não era meu, pertencia ao meio em que trabalhava [jornal "Estado de Minas"].
Mas uma prévia do seu livro vazou na internet.
Com essa rede de intrigas, o livro nasceu disso. Aí a gente resolveu pegar para se defender também.
E a ideia dessa divulgação era mostrar o quê?
Era mostrar o que era [o livro], estavam falando que era fajuto. E se eu já tinha tudo lá, para que ia fazer isso [espionagem]?
Não estava pronto para ser publicado?
Não, eu nem planejava escrever um livro. Pensei depois [da divulgação das reuniões], para contar a história verdadeira.
Você saiu quando do Estado de Minas?
Quando meu pai morreu, daí tive que cuidar de negócios da família, em novembro [de 2009]. Peguei para administrar a fazenda.
E agora você deixa a campanha também?
Eu nem entrei. Assim como os caras não assinaram contrato, eu não assinei. Ia fazer um free-lance lá, assinar contrato e não assinei. Foi muito rápido, foram três semanas.