Cerca de 70 procuradores, juízes estaduais, federais e promotores participaram na tarde desta quinta-feira (1.º), em Curitiba, de um manifesto contra a aprovação das emendas ao pacote de medidas contra a corrupção. O projeto de lei 4.850/16 foi aprovado pela Câmara dos Deputados na madrugada do dia 30 e alterou a ideia original do texto das Dez Medidas Contra a Corrupção, sugerido pelo Ministério Público Federal (MPF). No texto, há enquadramento no crime de responsabilidade para investigadores que instaurarem procedimento, civil ou administrativo, “em desfavor de alguém, sem que existam indícios mínimos de prática de algum delito”.
Veja fotos dos atos em Curitiba e em Brasília
O manifesto aconteceu em frente à Justiça Federal e contou com o pronunciamento de diversos membros do Judiciário. Procuradores e juízes pediram apoio da imprensa e da sociedade para tentar reverter a situação junto ao Senado.
A procuradora do MPF, Paula Conti, lembrou que juízes e procuradores não são imunes a responsabilizações, como tem sido divulgado, e que as medidas, como foram aprovadas, vão deixar a sociedade à mercê de quem interessa a corrupção. “Respondemos civilmente, administrativamente e criminalmente. Estamos sujeitos à perda de cargo como qualquer agente público. Quem está sofrendo as consequências disso [aprovação do pacote], mais do que nós, é a sociedade”, afirmou.
O juiz federal Nicolau Konkel Júnior observou que a forma como as Dez Medidas passaram é entendida pelos membros do Judiciário como uma retaliação às investigações da Lava Jato. Na opinião dele, existe todo um contexto para isso. Primeiro, a possibilidade da delação da Odebrecht vir à tona, de parte do congresso nacional em relação à possibilidade de envolvimento, e, associado a isso, a possibilidade e desenho da anistia ao caixa 2”, pontua.
Para o magistrado, o que era para ser um projeto anticorrupção se tornou tornado um projeto pró-corrupção. Ele salienta que o encaminhamento da proposta não significava aprovação na íntegra, mas pelo menos um debate amplo com a sociedade. “Obviamente que algumas propostas não sejam adequadas, mas que isso seja discutido amplamente e não numa madrugada. E pior é a reversão das medidas que estão ali. As medidas que estariam para combater a corrupção agora vêm para enfraquecer o Ministério Público e o Judiciário, enfraquecendo a punição de crimes”, lamenta.
Atos em São Paulo e Brasília
Enquanto o Supremo Tribunal Federal analisa se aceita denúncia contra o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), um protesto do lado de fora do prédio principal do STF reuniu, nesta quinta-feira, 1, pelo menos 200 membros da Frente Associativa da Magistratura e do Ministério Público (Frentas) e de outras entidades de promotores e juízes no Brasil. Magistrados e membros do Ministério Público também se reuniram por cerca de uma hora em frente ao fórum João Mendes, no centro de São Paulo.
Os atos são a favor da independência do sistema judiciário e contra as medidas tomadas na Câmara que enfraquecem o projeto das medidas anticorrupção propostas pelo MP e apoiada por 2 milhões de assinaturas. Eles entregaram carta pública marcando posição.
“Nós que temos a obrigação de investigar e punir se for o caso, nós estamos sendo perseguidos, a sociedade levando um tapa na cara, em um desvirtuamento total do projeto das dez medidas acolhido pela população brasileira”, afirmou Norma Cavalcanti, presidente da Frentas - entidade que convocou o ato - e da Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp).
O presidente da Associação Paulista de Magistrados (Apamagis), Jayme Martins de Oliveira Neto - que assumirá em 15 de dezembro a presidência da Associação de Magistrados Brasileiros (AMB) - fez coro às críticas.
“Os juízes vieram aqui demonstrar ao Supremo essa preocupação que atinge ao Brasil inteiro com as iniciativas que tentam atingir ao Estado Democrático de Direito, atingir ao Poder Judiciário enquanto instituição. O respeito à independência do Poder Judiciário está em jogo nesse momento”, afirmou Jayme Martins de Oliveira Neto, citando a lei de abuso de autoridade como exemplo, que está tramitando no Senado.
“O crime de interpretação, punir o juiz pelo ato de interpretar a lei, é simplesmente aniquilar o poder judiciário”, afirmou o próximo presidente da AMB.
Em São Paulo, o ato foi organizado pela Apamagis e pela Associação Paulista do Ministério Público.
“Não se trata de uma manifestação corporativista mas de defesa de prerrogativas da sociedade”, disse o presidente da Apamagis Oscild de Lima Júnior. Segundo ele, a possibilidade de um juiz ser criminalizado por uma decisão expõe o magistrado e compromete a Justiça. “Agora vamos trabalhar para modificar o texto nas comissões, com mais calma”, disse.
O procurador de justiça e 1º vice-presidente da Associação Paulista do Ministério Público, Mario Sérgio Christino, o ato desta quintavisa “conscientizar a sociedade da gravidade das propostas aprovadas que afetam diretamente o trabalho do MP e da magistratura”. Segundo ele, deputados “querem roubar o MP da sociedade”.
Christino disse ainda que as duas associações que organizaram os atos nesta quinta vão participar dos protestos organizados para o domingo (4) pelos movimentos Nas Ruas, Intervencionistas, Movimento Brasil Livre (MBL) e Vem pra Rua.
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