Deputado diz que Judiciário se excede
Autor da PEC em tramitação no Congresso, o deputado petista Nazareno Fonteles (PI) afirma que o Legislativo precisa ser o poder mais forte da República, por seu caráter representativo, e que decisões do Judiciário nos últimos anos têm ido além do que permite a Constituição. "O Poder Judiciário que não foi eleito, é nomeado não tem legitimidade para legislar. É isso que desejamos restabelecer para fortalecer o Legislativo", defende. "Aliás, fomos nós que fizemos a Constituição."
Já o coordenador da bancada evangélica, deputado João Campos (PSDB-GO), diz que o objetivo da PEC é enfrentar o "ativismo judiciário". "Precisamos pôr um fim nesse governo de juízes. Isso já aconteceu na questão da união estável de homossexuais, da fidelidade partidária, da definição do número de vereadores e, agora, no aborto de anencéfalos", critica.
Por outro lado, o relator da proposta na CCJ da Câmara, Nelson Marchezan Júnior (PSDB-RS), contemporiza e destaca que a possibilidade em discussão não abrange julgamentos específicos dos tribunais, mas casos em que o Judiciário ultrapasse sua função ao determinar novas regras. "A PEC versa exclusivamente sobre os atos normativos, ou seja, de natureza não-jurisdicional dos outros poderes", afirma.
Votação
O líder do PSol, Chico Alencar (RJ), avalia que a proposta pode prosperar devido ao desejo da Casa de reagir a algumas posições do Judiciário. "Essa proposta é tão irracional e ilógica quanto popular e desejada aqui dentro. Vai virar discurso de valorização do Legislativo", diz.
Para se tornar um marco legal, a PEC precisa ser aprovada duas vezes no plenário da Câmara, com 308 votos, antes de ir ao Senado.
Agência Estado
Interatividade
O Congresso deveria ter o poder de derrubar decisões do Judiciário? Por quê?
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A bancada evangélica do Congresso ainda não digeriu a recente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de permitir a interrupção da gravidez em casos de anencefalia quando não ocorre a formação do cérebro no feto. Graças a uma articulação dos parlamentares do grupo, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara aprovou nesta semana uma proposta de emenda à Constituição Federal (PEC) que permite ao Congresso sustar decisões do Judiciário. Juristas ouvidos pela Gazeta do Povo classificaram o projeto como esdrúxulo e inconstitucional.
Hoje, o Legislativo só pode mudar atos do Executivo. A PEC do deputado Nazareno Fonteles (PT-PI), porém, dá competência ao Congresso para sustar "atos normativos dos outros poderes que exorbitem do poder regulamentar ou dos limites de delegação legislativa". Além de resoluções de tribunais e atos de conselhos, há parlamentares que entendem ser possível sustar decisões do STF com repercussão geral e até súmulas vinculantes. Se a regra já estivesse em vigor, haveria chance, por exemplo, de o Congresso reverter a permissão de interromper a gravidez nos casos de fetos anencéfalos.
Inconstitucional
Para o jurista René Dotti, é "repugnante" apresentar uma proposta como essa motivada pela "perseguição religiosa". Ele defende que, no caso dos fetos anencéfalos, o Supremo não legislou, mas decidiu como se houvesse o caso concreto de mulheres que tenham gestação nessas condições e fizeram o aborto. "A PEC claramente vai contra a autonomia que tem de haver entre os poderes e está garantida na Constituição. Não pode haver poder superior ao outro", argumenta. "Trata-se de uma lei que nasce morta, porque é inconstitucional.."
A mesma análise é feita pelo também jurista Luís Roberto Barroso. Segundo ele, a medida viola o princípio de separação entre os poderes, ao subordinar a eficácia das decisões do Judiciário à previa aprovação do Legislativo. Além disso, Barroso afirma que, no Brasil, não vigora o modelo parlamentarista, adotado, por exemplo, na França e na Inglaterra, onde o Parlamento dá a última palavra em interpretação da Constituição.
"Aqui, vive-se a supremacia da Constituição e não do Parlamento. Portanto, quem diz qual o sentido da Constituição é o Supremo", explica. "A PEC estabelece uma subversão tão grande da estrutura constitucional que exigiria a convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte para ser feita. Certamente, o STF terá de declará-la inconstitucional, se for aprovada."
Queda de braço
Dotti vai além e critica essa tentativa de conflito entre o Legislativo e o Judiciário. "É esdrúxula essa aparente declaração de guerra entre os dois poderes. A última instância para decidir sobre a constitucionalidade de uma lei é o STF", analisa.
"Se for aprovada uma emenda dessa natureza, iriam criar uma tensão política muito grande e indesejável entre os poderes", completa Barroso.
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