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Imposto de renda

Operação tem incidência tributária

Apesar de não terem incidência de tributos federais, as doações em dinheiro precisam ser declaradas no Imposto de Renda (IR). A medida, segundo a Receita Federal, deve ser cumprida por quem doou e por quem recebeu os valores. Por isso, a necessidade de identificação dos doadores.

Em âmbito estadual, há incidência do Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD), que abrange ainda bens móveis, direitos, títulos e imóveis. A alíquota varia de estado para estado. No Distrito Federal, por exemplo, onde José Genoíno declara residência, a taxa é de 4% do valor arrecadado.

Segundo a família do ex-deputado, R$ 30 mil do montante obtido com a "vaquinha" online foram destinados ao pagamento do ITCMD. Genoíno também teria uma relação com nomes, CPFs e RGs de 2,6 mil doadores, entre militantes e simpatizantes do PT.

Há, conforme a Secretaria da Fazenda do Distrito Federal, multa para o caso do não pagamento do tributo a partir de 30 dias após a efetivação da doação. O percentual varia de acordo com o atraso da quitação da guia do imposto.

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Subjetivo

Debate também envolve moralidade

Apesar de ser embasa em aspectos legais, a discussão sobre a existência ou não de irregularidade nas "vaquinhas" promovidas para quitar multas de condenados do mensalão não deixa de passar pelo âmbito moral. É o que observa o penalista Rodrigo Faucz Pereira e Silva, da UniBrasil.

"Como a moral é muito subjetiva, cada um age de acordo com o que entende como certo. Alguns se sentiram injustiçados com a decisão do Supremo, são simpatizantes, e decidiram auxiliar os condenados. Outras pessoas acham que isso é uma forma de burlar a lei. Tudo depende até mesmo da concepção política de cada um", pondera Silva.

Professor de Justiça e Legitimidade Estatal, Fernando Knoerr considera que a legislação sempre vai estar um passo atrás do que é visto como certo do ponto de vista moral. Por enquanto, lembra ele, não existe lei que impeça as pessoas de doarem para uma causa como esta. "É errado reduzir a moral à lei porque a moral é ampla, pede que as pessoas tenham um consenso do certo ou errado. Já a lei é restrita", observa.

As campanhas feitas pela internet com o intuito de arrecadar dinheiro para pagar multas criminais impostas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) a condenados do processo do mensalão têm suscitado o debate sobre implicações legais dessa prática. A Constituição Federal brasileira prevê, no artigo 5º, a impossibilidade de se transferir o cumprimento de pena do réu para qualquer outra pessoa.

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Foi por meio de doações, contudo, que o ex-deputado petista José Genoíno arrecadou quase R$ 700 mil, valor superior aos da multa de R$ 667,5 mil que devia. O colega de partido, Delúbio Soares, teve a pena arbitrada em R$ 467 mil, mas recebeu R$ 1,013 milhão. Os excedentes foram repassados para o ex-ministro José Dirceu, multado em R$ 971 mil, e para o ex-deputado João Paulo Cunha. Ele devia R$ 373,5 mil ao Fundo Penitenciário Nacional (Funpen). Dede que foi preso, o delator do mensalão, ex-deputado Roberto Jefferson (PTB) anunciou que também abriria uma conta bancária para doações, mesmo ainda sem saber em quanto seria multado.

Ex-presidente do Tribunal de Ética e Disciplina da seccional Paraná da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), o advogado Carlos Fernando Correa de Castro acredita que irregularidades sobre a quitação das multas estão passando despercebidas pela mídia. Ele salienta que a individualidade da pena abrange não só a restrição de liberdade, mas multa, prestação de serviços à comunidade, perda de bens e suspensão ou interdição de direitos. Assim, a condenação pecuniária dos mensaleiros deveria ter efeito sobre eles. "A exasperação da pena tem que ser sofrida pelo condenado. Se a pena for multa, a perda de dinheiro tem de ser sofrida pelo bolso ou patrimônio dele", diz.

Legitimidade

No caso da necessidade de contrair um empréstimo, pondera, o valor ainda seria pago, ao final, pelo condenado. Para Castro, o argumento de que o dinheiro doado passa a ser parte do patrimônio dos réus após a arrecadação não encerra a discussão. "É como se impedissem que a justiça se cumpra. A doação é um instituto de direito civil que precisa ter uma finalidade legítima", assinala ele, ao enfatizar que doar dinheiro para pagar a multa de alguém que cometeu um ilícito não parece ser um motivo legítimo.

Especialista em Direito Constitucional, a professora Viviane Sélles, da UniCuritiba, analisa que, apesar de ser uma prática polêmica, contribuições para pagar a multa dos mensaleiros ainda são legais. Isso se deve ao direito do cidadão sobre o dinheiro que é de sua propriedade. "Neste caso, não está se fazendo transferência de pena. Quem doa, doa se quiser e ninguém pode condenar por isso", afirma a advogada. Ela observa que a medida seria ilegal a partir do momento de que se tratasse de dinheiro público. "Mas, de particular para particular, não tem implicação na lei".

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O mesmo sustenta o especialista em Direito Penal, Luiz Alberto Blanchet, da Pon­­tifícia Universidade Católica do Para­­ná (PUC-PR). "Se a origem do dinheiro for lícita, a operação é válida", diz. Ele considera que, mesmo que tenha pagado a multa com dinheiro alheio, o condenado ainda sofre constrangimento público por ter de recorrer às doações para quitar a dívida.

O promotor de Justiça Rodrigo Chemim, da área criminal, também avalia que não há impedimento legal para a doação a réu condenado. O ponto que deve receber mais atenção jurídica, opina, é de onde vieram as colaborações em um espaço de tempo tão curto. "É preciso saber se este dinheiro não é parte do que foi desviado e agora aparece como doação", alerta.

Proposta quer vetar outras campanhas

A polêmica envolvendo as campanhas de arrecadação de fundos para pagar multas de condenados do mensalão levou à criação de um projeto de lei que versa sobre o assunto. A proposta, de autoria do deputado João Campos (PSDB-GO), quer proibir doações em dinheiro para qualquer condenado pela Justiça. Isso incluiria dinheiro repassado por sindicatos, empresas, pessoas físicas e associações ou partidos.

Campos diz que os tribunais brasileiros que admitem as "vaquinhas" para quitar multas estão indo contra o princípio constitucional que defende que a pena é personalíssima. "Eles estão sendo infelizes", definiu, em entrevista à Gazeta do Povo. Para o deputado, quando se permite estas doações, também se coloca em risco a finalidade da pena. "Uma das finalidades da sanção é que a pessoa reflita e não volte a reincidir. Quando se impõe um castigo em decorrência de um crime, preparamos o cidadão para que ele não volte a cometê-lo, para que a sociedade veja que o crime não compensa. Esta burla do PT descaracteriza a finalidade da pena", argumenta.

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O parlamentar sustenta ainda que o que está em jogo não é o direito do cidadão em doar dinheiro a quem quiser, mas o que condiz com o sistema penal do país, sob pena de desconfigurá-lo. "Na pena de prisão, não é possível alguém cumpri-la para outro. O condenado não pode buscar outros meios para isso", compara.