Recentemente foi publicada a Lei nº 12.846/2013, que dispõe sobre a responsabilização administrativa e civil de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira. Embora o direito brasileiro já possua diversas leis de combate à corrupção, essa regra, que tem sido saudada como a nova lei anticorrupção, contém inovações bastante interessantes e relevantes.
A primeira delas é a proteção do patrimônio público estrangeiro, em atenção a convenções internacionais das quais o Brasil é signatário. As leis até então existentes coibiam apenas os ilícitos lesivos à administração pública nacional.
Entre os atos considerados lesivos, destaca-se a oferta de propina a agente público, a fraude a licitações e a subvenção de atos ilícitos contra a administração pública. A prática desses atos será apurada mediante processo administrativo e judicial, observados o contraditório e a ampla defesa. Alguns tipos são excessivamente abertos, o que poderá ensejar dificuldades no momento de aplicação da norma ao caso concreto. Exemplo disso é aquele que estabelece como infração "dificultar atividade de investigação ou fiscalização de órgãos, entidades ou agentes públicos, ou intervir em sua atuação, inclusive no âmbito das agências reguladoras e dos órgãos de fiscalização do sistema financeiro nacional" (art. 5º, V).
Na esfera administrativa, a responsabilização consistirá na aplicação de multa de 0,1% a 20% do faturamento bruto da pessoa jurídica e na publicação extraordinária da decisão condenatória, além da reparação do dano. Caso não seja possível estimar o faturamento bruto, a multa será de até R$ 60 milhões. De acordo com o art. 4º, §2º, da lei, empresas consorciadas serão solidariamente responsáveis, no âmbito do respectivo contrato, pelo pagamento da multa e pela reparação do dano.
As sanções de suspensão do direito de licitar e contratar com a administração pública permanecem sendo regidas pelas leis nº 8.666/93, 10.520/02, 12.462/2011 e 8.429/92.
Na esfera judicial, por provocação do Ministério Público ou das Procuradorias da União, Estados e Municípios, poderão ser aplicadas as sanções de perdimento dos bens que sejam fruto da infração, a interdição parcial das atividades, a proibição de receber empréstimos de instituições públicas por até 5 anos e a dissolução compulsória da pessoa jurídica, o que configura verdadeira pena de morte. A ausência de um prazo para a sanção de interdição de atividades suscita fundadas dúvidas sobre a sua constitucionalidade, pois a Constituição Federal veda penas "de caráter perpétuo" (art. 5º, XLVII, b).
É importante salientar que, nos termos do art. 2º da Lei nº 12.846/2013, a responsabilização das pessoas jurídicas será objetiva. Isto é, dispensa-se a demonstração do dolo (vontade e consciência) ou da culpa (negligência, imprudência ou imperícia) da empresa ou seus representantes no cometimento do ilícito. Embora esta questão seja complexa demais para os limites espaciais do presente artigo, cumpre, desde logo, apontar a inconstitucionalidade desse dispositivo, por violação aos princípios do devido processo legal (em sua dimensão substancial), da individualização da pena, da proporcionalidade e da função social da propriedade.
Inovação interessante é o acordo de leniência, que poderá ser celebrado entre a entidade pública e a empresa, caso esta se disponha a colaborar com as investigações, contribuindo com a identificação dos demais envolvidos e com a obtenção de informações. Além de isentar a pessoa jurídica de algumas sanções, o acordo poderá reduzir em até 2/3 (dois terços) o valor da multa aplicável.
Outra inovação importante, tendente a conferir segurança jurídica na aplicação da lei, é a fixação do prazo prescricional de 5 (cinco) anos, contados da data da ciência da infração ou, no caso de infração permanente, do dia em que esta tiver cessado.
A Lei nº 12.846/2013 também instituiu o Cadastro Nacional de Empresas Punidas (CNEP), que dará publicidade às sanções aplicadas, mediante a indicação da razão social da pessoa jurídica, do tipo de pena e do seu prazo de vigência.
Essa lei entrará em vigor 180 (cento e oitenta) dias após a data da sua publicação, portanto, em 28 de janeiro de 2014, prazo suficiente para que as empresas instituam mecanismos de controle interno e códigos de ética. Além de evitar o cometimento de ilícitos, de acordo com o art. 7º, VIII, da lei em comento, a aplicação efetiva desses instrumentos poderá atenuar as sanções.
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