As leis previdenciárias, assim com a legislação em geral, evoluem com a sociedade. Novas realidades fazem surgir outras normas, superando-se as antigas. No que se refere à Previdência Social, benefícios antigos dão lugar a novos, mais adequados às necessidades sociais atuais. O Direito deve evoluir junto com a sociedade.
Nesse sentido, a legislação previdenciária aplicada à área rural vem evoluindo muito ao longo das últimas duas décadas. O tempo em que somente o homem do campo tinha direitos foi dando lugar ao reconhecimento da atividade da mulher trabalhadora rural, que antes já trabalhava tanto quanto o homem, mas não era considerada segurada perante a Previdência Social. Ou seja, algo impensado há algum tempo, tendo em vista que o trabalho da mulher, especialmente no campo, era considerado secundário, hoje está plenamente incorporado ao ordenamento jurídico. A Constituição Federal e a lei conferem direitos iguais aos trabalhadores de ambos os sexos.
E outras mudanças foram ocorrendo, levando em conta especialmente as grandes transformações pelas quais passou a agricultura brasileira. Hoje, a pequena propriedade é considerada fundamental para o desenvolvimento do setor primário, contribuindo, inclusive, para a exportação.
No mesmo sentido dessas mudanças, a Lei 11.718/08 passou a deixar claro que deve ter tratamento diferenciado o agricultor familiar, mas não somente aquele que sobrevive na atividade agrícola, mas também o que produz excedente, pois este setor é responsável pela produção de 70% dos alimentos do país. Houve, portanto, uma grande modificação no conceito do segurado especial, o que possibilitou a inclusão de milhares de pessoas.
Junto com isso, a mesma lei, reconhecendo o grande êxodo rural que provocou a migração de milhões de pessoas do campo para as cidades, em busca de outras oportunidades, permitiu que o segurado somasse, para fins de aposentadoria por idade, tempo de atividade rural e urbana, que vem sendo chamada de aposentadoria híbrida.
O INSS vem reconhecendo, administrativamente, que é possível somar períodos urbanos e rurais, apenas quando a atividade agrícola é a última, o que significa dizer que somente quem está na atividade rural pode somar períodos urbanos, mas não admite que a última atividade seja urbana. Trata-se de uma interpretação restritiva e que não condiz com a realidade.
Tal entendimento afronta o princípio da isonomia: se aos trabalhadores rurais é permitido computar períodos urbanos, também deve ser permitido aos trabalhadores urbanos somar os de atividade agrícola. Além disso, a lei não exige que a última atividade seja urbana.
Ao analisar a matéria, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região vem se posicionando pela possibilidade de aposentadoria por idade, computando-se períodos rurais e urbanos, ainda que a urbana seja a última atividade. Destaca-se o voto proferido na Apelação Cível 0014935-23.2010.404.9999, de relatoria do Desembargador Rogerio Favreto, em que se reconhece a possibilidade de concessão da aposentadoria por idade "híbrida".
Entre os fundamentos usados, está justamente o fato do êxodo rural, que faz com que a lógica seja o trabalho urbano posterior ao trabalho rural. Além disso, a própria lei, em momento algum, condiciona que a última atividade tenha que ser rural, para que se possa somar os períodos.
Por certo, vez que esse entendimento não é uniforme na jurisprudência, a questão deve ser dirimida no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, a quem cabe dar a última interpretação de lei federal.
Devemos observar, ainda que, a idade para a aposentadoria híbrida é a de 60 anos para a mulher e 65 anos para o homem, ou seja, não há a redução de idade em cinco anos, prevista para os trabalhadores rurais, tendo em vista que a totalidade do período de atividade não foi na agricultura. É o que dispõe o §3° do artigo 48 da Lei 8.213/91.
Por fim, deve-se se atentar para o disposto no § 4° do mesmo artigo, que determina que o benefício será calculado com base na média das contribuições, da mesma forma que uma aposentadoria por idade urbana, considerando-se como salário-de-contribuição, nos períodos de atividade rural, o salário-mínimo.
A aposentadoria híbrida é sem dúvida uma alteração importante na nossa legislação previdenciária. Cabe ao aplicador da lei estar aberto para o que o legislador determinar, não buscando reduzir a sua efetividade, ao contrário, receber e dar cumprimento às novas normas. Essa é a função do INSS. Essa é também a função do Poder Judiciário.
STF decide sobre atuação da polícia de São Paulo e interfere na gestão de Tarcísio
Esquerda tenta mudar regra eleitoral para impedir maioria conservadora no Senado após 2026
Falas de ministros do STF revelam pouco caso com princípios democráticos
Sob pressão do mercado e enfraquecido no governo, Haddad atravessa seu pior momento
Deixe sua opinião