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Ultimamente a administração pública brasileira tem, muitas vezes, promovido concursos públicos com o fim exclusivo de compor cadastro de reserva. Ou seja, abre-se um certame com o intuito de se selecionar os melhores candidatos a cargos e empregos públicos para compor um rol de aprovados, mesmo não existindo uma única vaga.

Esta prática é decorrência da mudança de interpretação do Poder Judiciário, que tem se posicionado, nas decisões mais recentes, no sentido de que o candidato aprovado dentro do número de vagas possui o direito subjetivo à nomeação. Em outras palavras, a Justiça está obrigando a administração pública a nomear todos os candidatos aprovados dentro do número de vagas, independentemente da comprovação de existência de vagas a serem preenchidas.

O fundamento utilizado pelo Judiciário para sustentar este posicionamento é o fato de que a abertura de um certame com a especificação da quantidade de vagas demonstra de modo indubitável a necessidade da administração de preencher todas aquelas vagas colocadas à disposição dos pretensos interessados.

A administração com o intuito de se esquivar da obrigação de nomear os aprovados no certame passou a adotar, então, a praxe de fazer concurso apenas e tão somente para cadastro de reserva, o que, até o presente momento, segundo o Judiciário, não enseja a obrigação de nomear os aprovados.

Mas esta abominável prática é, certamente, ilegal. E já sabendo desta artimanha administrativa o Poder Judiciário começa a declarar a ilegalidade de concurso público exclusivamente para formação de banco de aprovados.

Soma-se a esta nova interpretação do Judiciário, a vontade do Congresso Nacional de limitar este descaso da administração pública para com o "concurseiro". O interesse do Congresso Nacional de coibir esta famigerada prática da administração pode ser concretizado com a promulgação do projeto de lei 369/08, originado no Senado Federal, que estipula a obrigação de constar no edital o número de vagas a serem preenchidas no concurso público.

Segundo o exposto na fundamentação do projeto de lei, a abertura de concurso público para formação de cadastro de reserva fere, dentre outros, os princípios da moralidade, impessoalidade, eficiência e economicidade, uma vez que: i) ocasiona o dispêndio de verbas públicas; ii) cria falsa expectativa aos candidatos; e iii) pode ensejar o desvirtuamento do certame, caso existam desafetos aprovados (hipótese em que a administração poderá deixar de nomear candidatos aprovados em virtude de questões pessoais).

Neste mesmo sentido, encontram-se julgados do Supremo Tribunal Federal. A título de exemplo, menciona-se um julgado da Suprema Corte, da relatoria do ministro Marco Aurélio de Mello, no qual está dito que "a Administração Pública não pode brincar com o cidadão, convocando-o para um certame e depois, simplesmente, deixando esgotar o prazo de validade do concurso sem proceder às nomeações".

Em outro voto, agora da relatoria do ministro Gilmar Mendes, o Supremo Tribunal Federal assim se manifestou quanto ao comportamento que deve reger a administração pública em sua relação com os cidadãos: "Aqueles cidadãos que decidem se inscrever e participar do certame público depositam sua confiança no Estado-administrador, que deve atuar de forma responsável quanto às normas do edital e observar o princípio da segurança jurídica como guia de comportamento". Prosseguindo em sua manifestação, o ministro Gilmar Mendes pontuou que a necessidade da nomeação "de acordo com o edital, passa a constituir um direito do concursando aprovado e, dessa forma, um dever imposto ao poder público".

Por todos estes motivos e fundamentos o Congresso Nacional desenvolve este projeto de lei, que tem por intuito vedar a perpetuação de ilegalidades. O projeto de lei diz que os editais dos concursos públicos, no âmbito da administração direta e indireta da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios, deverão prever a especificação do número de cargos a serem providos. Segundo o mesmo projeto de lei é possível a formação de cadastro de reserva apenas para os candidatos aprovados em número excedente ao de cargos a serem providos.

O projeto de lei, em questão, sofreu uma infeliz emenda na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, a qual abre exceção para as empresas públicas e as sociedades de economia mista, ou seja, permite concurso para cadastro de reserva nestas entidades.

Entretanto, a despeito desta emenda apresentada, o projeto de lei é indispensável e muito bem-vindo, pois colocará fim à ilegal e inconstitucional prática da administração pública de promover concurso público apenas e tão somente para cadastro de reserva. É um alento para os concurseiros e um bálsamo para o princípio republicano.

Marco Cesar, professor de direito administrativo e advogado atuante na área de concursos públicos

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