Os Juizados Especiais Cíveis, anteriormente denominados como Juizados de Pequenas Causas, originaram-se da necessidade de trazer maior celeridade na tramitação das causas de menor complexidade, devendo se orientar pela oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade. Na prática, entretanto, acabou por caracterizar os processos com ação de menor valor, independente da sua complexidade material, técnica ou jurídica, demonstrando que nosso ordenamento jurídico vigente é patrimonialista, uma vez que possui mais relevância o patrimônio (valor econômico) atingido em detrimento ao bem jurídico tutelado.

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Efetivamente, observamos processos judiciais iniciados e finalizados em torno de quatro meses quando é possível a conciliação ou a transação entre as partes já na primeira audiência, ou em seis meses do ajuizamento da ação ao trânsito em julgado com prolação de sentença com análise meritória, dependendo dos procedimentos adotados pelo juízo em que tramita o processo, o que traz a efetividade, enfim, à tão aclamada celeridade na prestação jurisdicional.

Celeridade esta como contribuição para o resgate da credibilidade e confiança dos cidadãos ao menos em um dos poderes – Judiciário – do nosso Estado Democrático de Direito, diante da realidade de que a justiça é morosa per se, e sem intenção, gera sentimento de falibilidade dos órgãos judiciários, pelo que se ouve que somente a "justiça divina" julgará.

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Nessa seara reina a impressão da maioria dos operadores jurídicos – doutrinadores, advogados, magistrados, servidores – de que as causas em tramitação no âmbito dos Juizados Especiais são, nos termos da Lei 9.099/95, de menor complexidade, com a possibilidade de desenvolvimento de forma simples, informal, célere e econômica. Entretanto diariamente não são somente processos com essas características que encontramos nos juizados.

Por vezes, deparamo-nos com causas complexas que, para a devida prestação jurisdicional, dependeriam da produção de provas (perícias técnicas) ou intervenção de terceiro (chamamento ao processo), mas que em razão da inadmissibilidade desses procedimentos, e da relutância na declaração de incompetência do rito sumaríssimo, resta prejudicada. Enfrentamos, ainda, a impossibilidade de utilização de algumas ferramentas processuais importantes (agravo de instrumento, recurso especial e rescisória), o que acaba por prejudicar a boa aplicação do direito, restando diminuída a aplicação dos princípios do contraditório e da ampla defesa e do devido processo legal.

Da mesma maneira, as deficiências processuais no âmbito dos Juizados Especiais que são preenchidas pelos Tribunais de Justiças Estaduais, os quais normatizam e organizam as Turmas e Colégios Recursais, ao final traz inúmeras peculiaridades de processamento das ações e recursos em cada estado. Temos como exemplos: exigência de juntada da guia original nos autos do pagamento das custas recursais; impossibilidade de pagamento de custas via internet banking; horários de funcionamento e protocolo diferenciados em cada estado ou comarca, e até em cada juizado na mesma comarca; recursos próprios da inadmissibilidade ou provimento de recursos inominados; indisponibilidade de consulta à jurisprudência das turmas e colégios recursais; indisponibilidade de consulta à movimentação dos processos e recursos; ausência de publicação dos julgamentos; disponibilização de súmulas dos julgamentos sem publicação dos votos.

Paralelamente à normatização local, trabalhamos em processos com trânsito em julgado certificado sem que as partes tenham conhecimento da inclusão em pauta ou do julgamento do recurso; com penhoras oriundas de liminares em valores exorbitantes sem citação; com execuções superiores a R$ 1 milhão; incineração de processos em 60 dias após o arquivamento sem a expedição de alvarás ou devolução de documentos; liberação de depósitos sem intimação da parte contrária; ausência de intimação pessoal da parte em caso de bloqueio de valores; e mesmo multa cominatória não limitada pelo teto dos juizados (decisão da 2ª Turma do STJ na Reclamação n. 7.861, julgamento de 11/09/2013).

Por esses e outros motivos é que ouvimos de alguns advogados a recusa em litigar ou atender demandas em curso ou que tramitarão nos Juizados Especiais, uma vez que a mitigação da aplicação do Código de Processo Civil e a incerteza jurídica são acentuadas na prática diária. Contudo, a estes, fiquem "tranquilos", o art. 475-J do CPC (multa de 10% na execução) será aplicado! O que mais uma vez confirma que, quando o momento processual se referir ao valor econômico ou à execução ou ao pagamento, não haverá relativização na aplicação da legislação.

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Afinal, nos perguntamos: o que deve prevalecer, o direito ou o valor econômico das causas?

Fabiana Cristina Dick é advogada.