O Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu a inconstitucionalidade das contribuições previdenciárias pagas pelas empresas na porcentagem de 15% sobre o valor bruto da nota fiscal ou fatura de prestação de serviços de cooperativas de trabalho, prevista pelo artigo 22, inciso IV da Lei 8.212/91, com redação dada pela Lei 9.876/99.
Em sessão realizada em 23/04/2014, durante o julgamento do Recurso Extraordinário n.° 595838, o ministro relator, José Antônio Dias Toffoli, entendeu que a contribuição não encontra acolhimento no ordenamento jurídico, porque extrapola os limites previstos pelo artigo 195, inciso I, alínea "a", da Constituição Federal (CF). De acordo com o relator, o dispositivo prevê a obrigação da empresa de recolher contribuições sociais sobre rendimentos pagos às pessoas físicas que lhe prestem serviços, e não às pessoas jurídicas, como é o caso das cooperativas.
Ressalta-se que, embora o serviço seja prestado pelo cooperado, este o faz em nome da cooperativa, desta forma não há vínculo jurídico entre o tomador de serviço e o cooperado, assim como não há pessoalidade na prestação do serviço.
Sendo assim, quando uma determinada empresa contrata um serviço de uma cooperativa de trabalho, não é exigível que o serviço seja promovido por um cooperado específico, o que importa é que este seja feito, independentemente de quem o desenvolva, tanto é que o pagamento é feito à sociedade e não ao prestador do serviço.
Ademais, a Suprema Corte entendeu que a lei em comento possui uma falha quanto à sua base de cálculo, uma vez que a contribuição era calculada sobre o valor total da nota fiscal ou fatura e não sobre os rendimentos repassados aos cooperados, pois o montante percebido pelos cooperados é bem menor do que o valor da nota, em vista das taxas administrativas e outras despesas.
Além disso, a instituição de contribuições previdenciárias sobre os valores pagos às cooperativas não poderia ter sido instituído por lei ordinária, mas somente por lei complementar, conforme dispõem os artigos 154, I e 195, § 4º da CF, já que a situação não se amolda a nenhuma das hipóteses previstas constitucionalmente e se trataria de uma nova fonte de custeio.
A inconstitucionalidade da contribuição foi proferida em sede de Recurso Extraordinário, o que resulta na extensão dos efeitos somente entre as partes do processo. Entretanto, o plenário do STF reconheceu a existência de repercussão geral sobre o tema, ou seja, admitiu que a questão possui relevância jurídica, política, social ou econômica, de modo que deve gerar efeitos sobre todos os contribuintes.
A decisão proferida com repercussão geral deverá ser seguida pelas instâncias inferiores em casos idênticos e consolida o entendimento a respeito da inconstitucionalidade dessa lei. Em casos como esse, é desnecessário o ajuizamento de demanda judicial para a compensação dos créditos tributários, conforme prevê o artigo 66 da Lei 8.383/91.
Portanto a recuperação do valor pago a maior pode ser procedida pelas vias judiciais ou administrativas, com relação aos últimos cinco anos, conforme estabelece a Súmula Vinculante de nº 8 do Supremo Tribunal Federal.
Caso a opção seja a compensação administrativa, os montantes pagos poderão ser compensados com tributos vincendos de mesma espécie e destinação constitucional. Por outro lado, se o contribuinte optar pelo pleito judicial, o procedimento demandará mais tempo para ser concluído, porém também é uma hipótese a ser considerada.
Em termos práticos, pode-se dar o seguinte exemplo: um tomador de serviço que anualmente despende cerca de R$ 500 mil para o pagamento de serviços prestados por cooperativas de trabalho poderá recuperar um crédito, alusivo aos últimos cinco anos, de até R$ 375 mil mais a taxa Selic, além de uma economia anual futura de R$ 75 mil.
Vale destacar que, apesar de os contribuintes brasileiros sofrerem uma das maiores cargas tributárias do mundo, o que gera um "apetite" grande por crédito, os mesmos não devem tomar medidas descautelosas, ou seja, devem seguir o disposto no ordenamento jurídico.
Para que as contribuições pagas a maior possam ser recuperadas, é recomendável a prévia orientação de um advogado especialista, que auxilie a empresa na confecção de uma planilha do lastro do crédito, em respeito à legislação, bem como forneça um parecer jurídico que fundamente a origem do crédito acompanhado das notas fiscais, contratos e faturas, entre outros atos necessários, para que a empresa não fique exposta a eventuais autuações.
Gustavo Mitne e Lígia Paludo, advogados, são especialistas em Direito Previdenciário. E-mail: mitne@vilelaberbel.com.br
Deixe sua opinião